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TECNOLOGIA
Para quem não ouve
Softwares ajudam deficientes auditivos a ter percepção de ritmo, característica importante para diversas habilidades, como falar, andar e se socializar
JULIANA CALDERARI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O mundo se move em
ritmo: é o que acontece com a lua, as marés, a rotação da Terra e também com as pessoas.
Pensar, andar, falar e até se
abaixar para pegar um lápis são
movimentos ritmados. "Todas
as nossas ações são rítmicas",
diz Teumaris Buono Luiz, professora de educação física da
Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Foi apostando nisso que ela
criou, em parceria com a UFPR
(Universidade Federal do Paraná), dois softwares inéditos que
ajudam deficientes auditivos a
entender o que é o ritmo.
Segundo Buono, o aprendizado do ritmo acontece desde
os primeiros anos de vida,
quando o bebê ouve a voz da
mãe e escuta cantigas de ninar.
"É muito importante que haja
essa estimulação. Com o surdo,
isso não acontece", explica.
Por isso, os surdos têm dificuldades para aprender a falar.
"Nossa fala é rítmica e pausada,
e o surdo tem dificuldade em
compreender como fazer isso
por causa da falta de ritmo", diz
Buono. A realização de tarefas
cotidianas também pode ser
prejudicada. "Alguns fazem tudo muito rápido."
Os dois programas criados
convertem os ritmos em fenômenos visuais ou sensitivos, o
que faz com que o surdo possa
percebê-los, alcançando melhoras na fala, nos movimentos
e na socialização.
O programa que converte os
ritmos em recursos visuais é o
BPM Counter. Coloca-se o número de BPM (batidas por minuto) de uma música, por
exemplo, e o software traduz o
ritmo em quadrados coloridos
que se acendem conforme a velocidade das batidas. Perceber
esse ritmo, segundo os especialistas, ajuda no aprimoramento
da fala e dos movimentos.
O programa ainda não traz
autonomia total ao usuário,
pois exige que um ouvinte conte as BPM que o deficiente irá
visualizar. Sites de download
de músicas costumam especificar essa informação.
Liliane Desgualdo, fonoaudióloga da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo),
acredita que o BPM Counter
possa ser uma boa ferramenta
de reabilitação. "Acho que pode
ser usado em outras áreas, como para trabalhar falhas no
processamento auditivo."
Nesses casos, a audição funciona normalmente, mas o entendimento é comprometido
por causa de uma falha no processamento neurológico, que
traduz de forma errada a informação recebida pelos ouvidos.
O processo fica distorcido e pode gerar dificuldades na fala e
na leitura. "Durante meus trabalhos com crianças do ensino
fundamental, observei que 10%
tinham processamentos auditivos alterados", diz Desgualdo.
O segundo software desenvolvido pela Unicamp com a
UFPR funciona com a tecnologia VPM (vibrações por minuto) e pode ser colocado em celulares. Ao chegar em um ambiente onde há som, o programa capta as vibrações e as repassa para o celular do usuário
usando o modo vibratório. "O
surdo poderá sentir, pela vibração do celular, o ritmo ambiente", explica. O programa pode
ajudar o deficiente a participar
de festas e outros eventos.
Além de ajudar a desenvolver movimentos, a fala e a leitura, o ritmo traz um sentimento de que se pertence a um
grupo, explica Buono. "Em passeatas e shows, quando as pessoas cantam em grupo, isso fica
claro. O mesmo acontece com o
surdo, que passa a se sentir
parte do grupo."
Por enquanto, o software só
existe em protótipos. Já o BPM
Counter pode ser acessado gratuitamente pelo endereço
www.inf.ufpr.br/imago/bpmcounter.html.
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