São Paulo, quinta-feira, 23 de outubro de 2008
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ROSELI SAYÃO

Agressividade sem controle

Quando tragédias acontecem, em geral ficamos comovidos e emocionados, solidários aos parentes das vítimas. Lamentamos o fato, procuramos entender suas causas etc.
Não deixa de ser uma maneira de a sociedade exorcizar os demônios da angústia e do medo que surgem com a constatação de que "eu ou os meus poderíamos estar envolvidos em situação semelhante".
Na semana passada, testemunhamos duas tragédias: o seqüestro, fruto de um rompimento amoroso entre um jovem e uma garota, que acabou na morte desta, e o confronto das polícias civil e militar.
Por associação, esses fatos tão nefastos podem dar origem a reflexões bem diversas. Por exemplo: o que a educação dos mais novos pode absorver de tudo o que aconteceu?
Em primeiro lugar, já deu para perceber que os adultos se encontram, de modo geral, com a agressividade descontrolada.
Vemos isso nas brigas no trânsito, entre vizinhos, nas filas etc. Passou a ser "normal" receber ou dar cotoveladas, no sentido literal ou figurado, quando freqüentamos o espaço público. Ora, tal atitude inviabiliza a convivência social!
É claro que o estado da convivência pública contamina e afeta os mais novos, que o reproduzem: onde há grupos de crianças e adolescentes, a agressividade se transforma em violência entre os pares e contra o patrimônio. Tal e qual os adultos, eles não se envergonham dos atos que praticam contra os outros, o que significa que pouco se importam com sua imagem perante o outro. O problema é que a vergonha moral é um sentimento importante na formação e na ação moral em sociedade.
Relembrando as tragédias citadas, percebemos que nem os policiais nem o seqüestrador demostraram sentir vergonha de seus atos. Isso é preocupante e deve nos fazer pensar se damos valor aos ensinamentos do agir moral e da convivência em sociedade. Parece que preferimos eleger a competição como o mais importante, não é?
Em segundo lugar: os sentimentos têm merecido nossa atenção na educação? Quando uma criança explode por raiva ou se descontrola por ciúme, ela precisa conhecer o sentimento que a assaltou e saber que ele é legítimo, mas que sua expressão precisa ser controlada porque incide sobre o outro.
Finalmente, que valor e sentidos temos dado às leis? Para que cumpram o papel de nos proteger, é necessário ensinar a obediência a elas. Não a obediência cega e passiva, é claro. É preciso, também, aprender a se rebelar contra algumas leis e a analisá-las criticamente, mas a transgressão pura ou o confronto truculento e irresponsável não costumam ser os melhores caminhos para isso. Temos tratado sobre isso, nas escolas, principalmente?
A educação não pode ser considerada a única condição para mudar a sociedade, mas é de grande importância no processo de manutenção da vida democrática. Precisamos honrar tal compromisso quando educamos filhos e alunos.


ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)

roselysayao@folhasp.com.br

blogdaroselysayao.blog.uol.com.br


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