|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
coluna social
Moradores viram carteiros na Rocinha
ELKA ANDRELLO E ADRIANA DA GLÓRIA - FREE-LANCE PARA A FOLHA
A Rocinha ficou famosa como a
maior favela do Rio de Janeiro.
Foi promovida a bairro, mas
seus moradores continuam a ter status
de favelados, vivendo em um labirinto de
ruas sem nome e barracos sem número.
Se nem o básico -esgoto e água encanada- chega até todos, receber cartas em
casa então é um luxo. Os 180 mil habitantes têm de se virar para receber documentos, cartas e talões de cheque.
Moradora orgulhosa do bairro, Elaine
da Silva criou o Carteiro Amigo que, desde novembro de 2000, garante a entrega
da correspondência aos 4.000 moradores cadastrados. Cada casa paga R$ 3 por
mês pelo serviço. O grupo possui cerca
de 15 entregadores, todos moradores do
lugar, que ganham R$ 200.
Folha - O carteiro não entrega correspondência em todos os lugares?
Elaine da Silva - Não. Olha só esse endereço: "beco 2/12 80000002, rua 2, marcação na parede". É impossível para o carteiro encontrar. A gente já está acostumada, as pessoas que trabalham no Carteiro
Amigo são moradores da Rocinha, conhecem a comunidade e podem andar
em todos os lugares.
Folha - Como surgiu a idéia de criar o Carteiro Amigo?
Elaine - Eu, meu marido, Carlos Pedro
da Silva, 32, e o meu primo Silas da Silva,
32, fizemos o censo 2000 para o IBGE
aqui na Rocinha e constatamos que várias casas tinham mesmo endereço e número e que muita gente não sabe dizer o
próprio endereço. A maioria nunca recebe a correspondência em casa: apanha
nas biroscas (bares) ou na casa de parentes. Além do risco de molhar ou extraviar, qualquer um pode pegar as cartas.
Folha - Como as pessoas reagem ao receber cartas em casa pela primeira vez?
Carlos Pedro da Silva - A primeira que
entregamos foi uma carta de aposentadoria do INSS que um homem estava esperando há anos. Ele chorou. Para uma
mulher, entregamos uma carta avisando
que ela tinha R$ 1.800 para receber. Ela
nem esperava, o valor acumulou porque
não tinham como avisá-la. Até a Telemar
e a Caixa Econômica procuram a gente
quando não conseguem achar alguém.
Folha - Qual é a sua meta?
Elaine - Atingir o máximo possível de
pessoas para elas serem respeitadas. O
endereço não é apenas um endereço, ele
identifica você como um cidadão. Se a
pessoa tem um endereço, ela existe e passa a cobrar do governo coisas como saneamento básico e transporte. Hoje, a visão do morador da Rocinha não é mais a
de um favelado pobre e burro, mas de
uma pessoa que quer estudar, trabalhar e
competir pela inteligência.
Informações pelo tel. 0/xx/21/3323-3023
Texto Anterior: Compras são feitas sem necessidade Próximo Texto: heroína Índice
|