|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
S.O.S Família
Rosely Sayão
Antes da vida adulta
Ao ler uma reportagem
sobre o alto índice de
estresse entre jovens
de 14 a 18 anos, deparei-me com o depoimento surpreendente de um garoto de 15
anos que se trata por causa desse problema. O adolescente já
tem planos sólidos para sua vida: daqui a três anos, quer prestar vestibular para o curso de
economia e, como não pretende perder um ano com o cursinho, transferiu-se para uma escola mais "forte". E ele sonha
muito mais longe: antes de se
casar e de ter filhos, ainda pretende fazer pós-graduação.
O problema é que a cobrança
excessiva das responsabilidades que assumiu o afastou da
namorada e das atividades que
pratica por prazer. E ele ainda
sofre de insônia e de dores de
cabeça freqüentes e tem dificuldade para se concentrar.
Crianças e jovens têm sido
bastante pressionados por seus
pais. Não é novidade a agenda
cheia que eles cumprem, desde
bem pequenos. Além da escola,
freqüentam atividades extracurriculares dos mais variados
tipos: esportes, línguas e artes
são as mais concorridas, mas há
também tratamentos, acompanhamentos pedagógicos, aulas
particulares. Dá-lhes formação
para múltiplas habilidades e
competências! Tudo isso porque os pais querem garantir um
bom futuro para eles.
Mas os pais não poupam nos
sonhos para os filhos. Em todas
as atividades, eles precisam disputar as melhores posições.
Competir, por sinal, é o que
as crianças e os adolescentes
sempre fizeram. As brincadeiras em grupo nas ruas tinham
essa marca. Mas as regras podiam ser negociadas, e a tensão
e a frustração pelas derrotas
podiam ser minimizadas pela
convivência com os colegas.
Hoje, os mais novos disputam para valer. Seus oponentes
-em geral, colegas ou amigos-
perdem logo esse valor: passam
a ser rivais. E há também o oponente que nem humano é. O videogame e os jogos de computador fazem sucesso, mas é preciso lembrar que eles são programados muito mais para ganhar do que para perder.
Com colegas ou com máquinas, os garotos estão mais interessados no ranking e nas medalhas do que na interação e na
diversão que poderiam ter.
E, antes que se pense que
considero a competição sempre nociva, um esclarecimento:
a competição é saudável porque incentiva a superação dos
próprios limites e encoraja a
busca do aprimoramento, além
de permitir que os mais novos
aprendam a respeitar as normas de convivência, a negociar
e a manejar recursos para lidar
com as situações difíceis.
O mal da competição está no
modo como ela se dá hoje: só há
lugar para os vencedores, e, para ganhar, vale tudo, inclusive
burlar normas e regras. Esse é o
princípio do uso de drogas nos
esportes, por sinal.
Crianças e jovens são exigidos em demasia pelos pais em
nome do futuro. Mas e o presente deles? Um estresse!
Hoje, a expectativa de vida é
bem alta. Consideremos, então,
um ciclo de vida. A vida adulta
ocorre após os 18 anos, certo?
Até lá, a vida se divide em três
etapas: a primeira e a segunda
infâncias e a adolescência.
Cada uma dessas etapas pode
ser vivida, portanto, apenas por
cerca de seis anos. A criança pequena só pode ser assim por
seis anos, menos da décima
parte do que, provavelmente,
viverá. Depois, tem mais seis
para continuar a ser criança um
pouco mais crescida e, finalmente, mais seis para desfrutar
da adolescência. Depois disso, é
entrar na vida com toda a responsabilidade que ser adulto
exige. Em geral, as pessoas terão em torno de 50 anos para
viver nessa condição. Então,
por que roubar dos mais novos
esses 18 primeiros anos de vida,
tão curtos e preciosos?
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como
Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
roselysayao@folhasp.com.br
blogdaroselysayao.blog.uol.com.br
Texto Anterior: Importante Próximo Texto: DVD Índice
|