São Paulo, quinta-feira, 25 de janeiro de 2001
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Casas viram armadilha para crianças e idosos

Para evitar queimaduras e quedas, é preciso adaptar ambientes, principalmente banheiro e cozinha, os campeões de acidentes

Patrícia Santos/Folha Imagem
Barras de apoio e rampas facilitam a locomoção de idosos residentes no condomínio da Sociedade beneficiente Alemã, em SP


ANA PAULA ORLANDI
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Trancar a casa com mil cadeados e equipá-la com alarmes modernos pode até afugentar ladrões, mas não garante a segurança de ninguém. O interior das residências está repleto de objetos "inocentes" que podem provocar quedas, cortes e queimaduras. Crianças e idosos são as principais vítimas das armadilhas domésticas. Escadas sem corrimão, quinas, pisos escorrega-dios, varandas sem proteção, camas muito baixas e bugigangas espalhadas por mesas não incomodam adultos jovens, mas são ameaças à integridade física de maiores de 60 anos e menores de 10 anos.
Enquete da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (Sbot) constatou que 80% da população acima de 60 anos cai e se machuca dentro de casa. "A causa principal da queda são os obstáculos colocados no meio do caminho", alerta o ortopedista Marcos Musafir, ex-presidente da Sbot.
Adaptar a casa conforme os donos vão envelhecendo ainda é um hábito raro no Brasil, mas geriatras e ortopedistas garantem que a medida é eficiente. "Idosos caem muito no trajeto noturno entre quarto e banheiro. Para prevenir, é preciso construir casas seguras", diz o ortopedista Lindomar Oliveira. Ele entrevistou 225 pacientes maiores de 60 anos internados em hospitais de Goiânia (GO) devido a fraturas e descobriu que 75% deles haviam caído dentro de casa.
"O idoso tem mais chance de cair porque o envelhecimento acarreta um somatório de deficiências sensoriais e, às vezes, físicas", explica João Toniolo Neto, presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria de São Paulo. Além de idosos caírem mais, quase sempre o resultado dos tombos é mais sério por conta de doenças associadas ao envelhecimento, que debilitam ossos e articulações. É o caso da osteoporose, doença que afeta principalmente a população feminina de terceira idade, enfraquece os ossos e aumenta o risco de fraturas.
Depois dos idosos, as crianças são as maiores vítimas da falta de segurança dentro de casa. Se, para os maiores de 60, o banheiro é o cômodo campeão de acidentes, para os menores de 5, o perigo "mora" na cozinha. Estudo da Unidade de Tratamento de Queimados do Hospital João 23, de Belo Horizonte, constatou que 65% das queimaduras domésticas ocorrem na cozinha e que a maioria das vítimas são crianças até 5 anos.
Para evitar acidentes e tornar a casa mais confortável para idosos, a saída é eliminar "vícios" arquitetônicos, como portas estreitas, escadas sem proteção e banheiros com piso desnivelado. Embora a casa segura ainda engatinhe no Brasil, o conceito já foi incorporado por arquitetos e engenheiros europeus e norte-americanos. "Na Espanha, as casas são projetadas para abrigar e receber todo tipo de pessoa, inclusive portadores de deficiência e idosos", conta Adriana de Almeida Prado, arquiteta especializada em gerontologia. "O ideal seria que projetássemos e construíssemos casas seguras, mas a maioria das residências ainda é feita para pessoas em pleno vigor físico", completa a arquiteta Cybele Monteiro de Barros, criadora do site Casa Segura (www.casasegura.arq.br). Em São Paulo, o flat Residencial Santa Catarina, inaugurado há seis meses, foi construído para atender às demandas de moradores mais velhos. Os apartamentos possuem barras de apoio nos banheiros e nas piscinas, além de pisos antiderrapantes e campainhas ligadas à central médica do hospital vizinho, que leva o mesmo nome. Mesmo em Copacabana, bairro carioca em que 24% dos moradores têm mais de 60 anos, só existe um hotel adaptado à terceira idade, o Cristal Palace. Em outubro, o bairro ganhará um condomínio construído especialmente para idosos. Como a maioria das construtoras no Brasil ainda não dá importância à segurança interna das casas, a alternativa para idosos e crianças é adaptar o espaço com pequenas reformas ou com a compra de equipamentos de proteção.

Alto custo
As mudanças possíveis vão da instalação de barras de apoio no banheiro até sistemas de iluminação com controle remoto. Por ser novidade, a prevenção ainda custa caro. O preço de uma barra de apoio pode variar entre R$ 30 e R$ 300. "Há três anos, não havia nem importação desse tipo de produto. Hoje, o mercado brasileiro já oferece opções, mas elas ainda são restritas a pessoas de classe média para cima", afirma a fisioterapeuta Mônica Perracini.
Para que as adaptações não pesem tanto no bolso do morador, a orientação é começar a implementar as mudanças aos poucos . "O ideal é fazer adaptações progressivas, começando pelo banheiro, que é o lugar mais perigoso da casa. Com R$ 350, dá para erguer o vaso sanitário, comprar barra de segurança e instalar fitas adesivas no chão do boxe", diz Cybele.
Apesar de as obras de adaptação custarem caro, geriatras e arquitetos recomendam que o idoso só mude de casa se não houver outra opção para garantir sua segurança e seu conforto. "Mudar é a última saída. Se for esse o caso, o idoso deve levar com ele suas peças preferidas, como porta-retratos, cadeira ou cama. É importante que o espaço no flat ou na nova casa seja personalizado", afirma Adriana.



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