São Paulo, quinta-feira, 25 de abril de 2002
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

coluna social

Fotógrafo registra e recria a realidade

ELKA ANDRELLO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Sebastião Salgado, 58, um dos fotógrafos mais premiados do mundo, destaca-se também em trabalhos voluntários. É o fundador do Instituto Terra, que possui um ambicioso projeto de recuperação ambiental no vale do rio Doce (MG). Representante internacional do Unicef, ele mora e trabalha em Paris e atualmente fotografa a campanha pela erradicação mundial da poliomielite.
Doutor em economia, só virou fotógrafo profissional aos 29 anos. Clicou para importantes agências internacionais de fotografia e foi membro da Magnum Photos, cooperativa internacional de fotógrafos que incluía, entre outros, o "papa" Cartier-Bresson. Fotógrafo engajado, Salgado dedica-se a projetos pessoais que fazem o maior barulho. Para fazer "Êxodos", por exemplo, ele viajou por sete anos para documentar a migração de milhares de pessoas em situação de pobreza em 41 países.

Folha - Como funciona o Instituto Terra?
Salgado - É o maior projeto de recuperação ambiental do Brasil. Eu e a Lélia, minha companheira, compramos essas terras e trabalhamos nesse projeto há 11 anos. São 168 hectares em Minas Gerais, no vale do rio Doce, com mais de 310 mil árvores plantadas. A projeção é chegar a 1,2 milhão de árvores. O Instituto Terra faz ecologia social. Não é focado só na recuperação da natureza, o homem é o centro. Criamos escolas, que chamamos de Centro de Formação, para educar proprietários e trabalhadores rurais, professores, o prefeito. Ensinamos aos moradores a construir latrina, plantar pomar, fazer cooperativas. Não dá para recuperar a natureza sem conscientizar o ser humano. E o problema não é só plantar, mas monitorar, transformar em tecnologia. Estamos reflorestando áreas completamente devastadas. Essa terra é da natureza, não minha e da Lélia.

Folha - Como é a campanha mundial pela erradicação da poliomielite, do Unicef, para a qual o senhor está fotografando?
Salgado - É uma campanha brilhante. O Unicef compra as vacinas com doações, fazendo um trabalho de formiguinha e arrecadando dinheiro até em cidades pequenas do interior do Brasil, e a Organização Mundial da Saúde vacina as pessoas. Estamos num momento importante da campanha. Vai ter vacinação até o final deste ano, e vamos observar por mais três anos. Se não houver mais nenhum caso da doença, a OMS vai anunciar a erradicação mundial em 2005. Quando isso acontecer, os governos não vão precisar mais vacinar ninguém, pois a única maneira de transmissão é pelo ser humano. Por isso ainda se vacina em lugares onde a doença está erradicada, como no Brasil, pois, enquanto houver uma pessoa afetada, existe o risco de contrair a doença. As fotos da campanha vão ser publicadas num livro que sai no ano que vem na França e em outros países. Por enquanto, não fechamos com nenhuma editora do Brasil. No dia 14/5, será lançada uma campanha para que qualquer pessoa possa fazer doações pela internet (www.endofpolio.org).

Folha - Como foram as exposições sociais de "Êxodos"?
Sebastião Salgado - As exposições sociais foram feitas em lugares como assentamentos de sem-terra e favelas, em vários países. Organizamos uma mostra resumida com 60 fotografias e fizemos pôsteres de excelente qualidade dessas fotos. Uma cartilha didática baseada nesse trabalho foi distribuída para igrejas, educadores. Só no Brasil, mais de 3 milhões de pessoas que não têm acesso à cultura viram a exposição.

Folha - O senhor está preparando novas exposições?
Salgado - Estou preparando uma série, como foi "Êxodos", agora com as fotos da campanha pela erradicação da poliomielite. Estou preparando também uma retrospectiva dos meus 30 anos como fotógrafo, com as minhas fotos do ponto de vista político. Fui muito criticado no início da minha carreira, e do jeito que o mundo está hoje, as pessoas agora reconhecem o valor do meu trabalho. Mesmo minhas fotos mais antigas são atuais. Essa exposição vai acontecer em Washington, em dezembro de 2003.



Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Me dê motivo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.