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s.o.s família
Mãe só tem uma? Que nada! São duas
Rosely Sayão
"Culpa da mãe!" Quem já não ouviu essa
clássica frase, teve a coragem de dizê-la ou, pelo menos, de pensar nela? Não sei se
alguém escapa. Tem mãe para todo gosto, ou
melhor, para toda culpa: mãe superprotetora,
ausente, onipresente; mãe exigente, displicente, irresponsável; mãe autoritária, liberal em
demasia, que não sabe mostrar o amor que
tem pelo filho, que não quer se separar do filho; mãe invejosa, supercarinhosa ou, simplesmente, mãe. Pobre mãe!
Quando os filhos são pequenos, sempre há
quem julgue a mãe, a maneira como ela se relaciona com os filhos, como os educa, como
brinca ou briga com eles, como os repreende,
enfim, como dá conta -ou não- do seu papel. Oportunidade é o que não falta para que a
expressão "culpa da mãe" possa ser colocada,
e a mãe, acusada.
E quando chega a adolescência, então? Aí
nem precisa de um terceiro que diga que a culpa é da mãe: o próprio filho ou a própria filha
dão conta do recado.
O garoto é tímido? A garota é carente? Mais
cedo ou mais tarde eles vão dizer que são assim por culpa da mãe. Ainda bem que mãe só
tem uma.
Só uma? Não: no mínimo, duas. Uma é a que
tem nome e sobrenome, um jeito de viver e de
ser, qualidades e defeitos, um estilo de amar e
de se relacionar com o filho. Essa é aquela figura verdadeira e real que o filho chama de mãe.
É a que tem grandes responsabilidades na
educação dos filhos e que pode, sim, influenciar muito no modo como eles vão viver, como vão enfrentar os problemas que surgem na
vida. Mas nem tudo o que acusam é culpa dela. Pode ser da outra.
Qual outra? A imaginada. Todo mundo imagina a mãe que tem, e essa imagem não corresponde à real. Essa imagem, que todo filho
constrói durante o período em que está ou deveria estar sob a tutela dela, pode, sim, ser responsável por algumas dificuldades experimentadas durante a vida, principalmente na
adolescência. Mas essa imagem da mãe foi
criada por conta própria e não tem a ver com a
mãe real. É problema do filho.
Ouvi um relato muito interessante outro dia.
Uma jovem mãe contava que o filho, prestes a
completar 3 anos, estava curioso em saber onde ela escondia o que ele chamava de o "pipi"
dela. Essa pequena criança imaginava a mãe
com um corpo que não correspondia ao que
ela tinha.
Mesmo assim, sem nenhum indício, sem nenhum sinal, o filho a imaginava desse outro
jeito. O que isso tinha a ver com a realidade do
corpo da mãe? Nada.
E, como se não bastasse o filho ter uma imagem da mãe, ela própria também tem uma
imagem de si como mãe, que nem sempre corresponde ao que ela pode ser. Talvez por isso a
mãe sinta culpa: mesmo quando não é acusada, ela se acusa por não conseguir dar ao filho
tudo o que ela imagina que seja necessário a
ele, ser do jeito que o filho gostaria que ela fosse, poupar o filho dos sofrimentos e vicissitudes da vida.
Para exercer seu papel com responsabilidade e autonomia, para poder cuidar bem do filho e educá-lo, é preciso que a mulher supere a
culpa e a imagem de mãe que criou para, então, descobrir o jeito possível de ser mãe para
aquele filho.
Jogar a culpa na mãe é, de um certo modo,
uma fuga, pois, mesmo quando a mãe é responsável por determinado comportamento
ou sofrimento do filho, a acusação não é uma
saída. A solução para o problema, ou pelo menos parte da solução, pode estar em quem faz
a acusação: no marido, na cunhada, na sogra,
na professora do filho ou, dependendo da idade, no próprio filho.
ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e
autora de "Sexo É Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-mail: roselys@uol.com.br
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