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coluna social
Trabalho de mãe-de-santo ajuda 10 mil
A pernambucana Marlicene Figueiredo é mãe-de-santo, repentista, escritora e
"ongueira" das boas. Já publicou um livro com sua autobiografia, e um próximo de auto-ajuda está no forno. Suas ações são tão impressionantes quanto
sua história. Saiu do sertão de Pernambuco com a família em um caminhão de
pau-de-arara, aos oito anos de idade, direto para debaixo de uma marquise, sua
primeira moradia no Rio de Janeiro. Mãe
de três filhos, abandonada pelo marido,
ela foi morar numa garagem.
"Passei fome e sofri muito, mas não
guardo raiva de nada", diz. Mãe-de-santo
super-requisitada, passou a questionar o
sacrifício de animais e chegou à conclusão de que santo não come. Decidiu
montar uma ONG, a Instituição de Caridade e Integração São Cipriano, para alimentar as pessoas com comida e idéias.
Em dez anos, a ONG já ofereceu cursos
profissionalizantes para dez mil meninas
que sofreram violência. Uma das iniciativas que mais se destacou foi o curso de
bijuterias. Os "mimos" feitos de miçangas, sementes e pedras foram parar nas
lojas Bon Marché e Ventillo, em Paris, na
Agnès B, em Paris e Nova York, na Daslu
e no MAM (Museu de Arte Moderna),
em São Paulo, e na loja Parceria Carioca,
no Rio. Leia a entrevista abaixo.
Folha - Como a senhora começou a fazer
trabalhos sociais?
Marlicene Figueiredo - Como orientadora
espiritual, percebi que alguns problemas
eram sociais, e não espirituais. Decidi
que, em vez de sacrificar animais em oferendas para os santos, iria dar comida para meninas que estavam vendendo o corpo, cheirando, virando mulher de bandido. Então criei a ONG Instituição de Caridade e Integração São Cipriano, no terreno do centro espírita, e passei a atender
quem me procurava atrás de orientação
espiritual. Eu não queria dar o peixe, mas
ensinar a pescar. Comecei com cursos de
datilografia, computação, corte e costura
e cabeleireiro. Depois veio o de miçanga,
que existe há quatro anos e é um sucesso.
Já passaram por aqui mais de 10 mil meninas em situação de risco e de violência,
situações delicadérrimas. No início,
quando a ONG era financiada pelo BID
(Banco Internacional de Desenvolvimento), por determinação deles os cursos duravam três meses. Hoje os cursos duram
seis meses para dar mais tempo para trabalhar as meninas.
Folha - Quais problemas elas enfrentavam?
Marlicene - Elas foram lançadas de qualquer forma no mundo. A mãe já as xingou antes de elas nascerem, bateu na barriga para ver se abortava. Quanto sofrimento aquela criança viveu dentro do
berço uterino! Quantas meninas a gente
já tirou de formigueiros, porque a mãe
colocava elas lá para as formigas comerem. Já pegamos meninas que são violentadas, queimadas pela mãe, agredidas...
Teve uma que a mãe quebrou a cabeça
dela. Tem menina que, antes de vir para
cá, prostituía-se por R$ 3. Uma delas vinha da prostituição para o curso.
Folha - E como são esses cursos?
Marlicene - No de computação, os alunos
são avaliados toda semana para ver se
aprenderam. Nós não trabalhamos com
reprovação. Dos cursos de cabeleireiro,
manicure e pedicuro, as meninas saem
como auxiliares de cabeleireiro ou podem ficar aqui trabalhando como ajudantes. As meninas que saem percebem
que podem ganhar dinheiro sem virar
"avião" vendendo papelote de droga.
Elas se valorizam e se sentem cidadãs. Temos um quiosque no West Shopping
doado para a ONG vender as roupas e as
bijuterias confeccionadas aqui. Também
organizamos palestras de cidadania para
falar sobre direitos e deveres, drogas, sexualidade.
Folha - Como a senhora lida com o problema das drogas?
Marlicene - Eu não proíbo. Vou conversando até a menina largar por ela mesma.
Teve o caso de uma que vinha para cá
com maconha e cocaína. Com amor, fui
conversando até que ela jogou tudo no
vaso e deu a descarga. Pensa o que vai no
vaso, só coisa que não presta, né?
Contato: tel. 0/xx/21/3384-3055. As bijuterias são
vendidas nas lojas do MAM (0/xx/11/5549-9688), e
na loja Parceria Carioca (0/xx/21/2259-1437).
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