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São Paulo, quinta-feira, 27 de novembro de 2003
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As operações de redução de estômago estão menos invasivas, mas os avanços deverão ocorrer em outra área

Obesidade mórbida leva jovens à cirurgia

Arquivo pessoal
 
Arquivo pessoal
Eder e a mãe, Maria Ricardo, antes da cirurgia (no alto) e depois (ao lado)


ANA PAULA DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

São cerca de 6,7 milhões de crianças e adolescentes obesos no Brasil, segundo a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. A obesidade infanto-juvenil no país cresceu 240% nos últimos 20 anos. E a incidência de obesidade mórbida está levando jovens à mesa de cirurgia em uma tentativa radical de emagrecer e regredir doenças consideradas de adulto e causadas por excesso de peso, como hipertensão, diabetes e entupimento das artérias. Professor de cirurgia da USP e um dos pioneiros da gastroplastia no país, o cirurgião Artur Garrido Jr. contabiliza uma média de um adolescente operado por mês (um total de 50 jovens nos últimos três anos). Hoje reduzem e grampeiam o estômago também pacientes idosos -estes engordaram tardiamente, pois as doenças decorrentes da obesidade costumam impedir que a pessoa ultrapasse ou até chegue à meia-idade. As técnicas cirúrgicas de redução de estômago estão menos invasivas do que há dois ou três anos, quando começaram a ser propagadas. "Uma cirurgia laparoscópica que demorava, há três anos, de três a quatro horas hoje leva de 50 minutos a uma hora", diz Ricardo Cohen, cirurgião do aparelho digestivo do São Camilo. Foi diminuído o tempo da operação devido à especialização das equipes médicas e à evolução dos equipamentos, diz Cohen. Nas clínicas particulares, a lista de pacientes só engorda porque um número cada vez maior de convênios médicos hoje cobre as despesas ou parte delas. Nos cerca de 14 centros que realizam gratuitamente a cirurgia no país, a procura é igualmente grande, como também o tempo de espera para atendimento. No Ambulatório de Cirurgia Mórbida da Unicamp, há 1.350 pacientes obesos aguardando operação. Se o atual ritmo de atendimento for mantido, o último da fila será operado em 2018. No Hospital das Clínicas de São Paulo, a espera chega a dez anos.

Troca de vício
A experiência mostrou que o acompanhamento psicológico é imprescindível não apenas durante a internação, como ocorria há alguns anos, mas também depois que o paciente vai para casa. Tanto os centros públicos quanto as principais clínicas particulares dispõem de equipe multidisciplinar, com endocrinologistas, psicólogos, psiquiatras e até personal trainer. Outra constatação dos especialistas é que viciados por comida migram para outro vício. "A predisposição ao alcoolismo é quatro vezes maior do que a tendência de uma pessoa que não passou pela cirurgia", diz o cirurgião de obesidade José Afonso Sallet. O psicólogo Francisco Carlos Gomes, autor de estudo sobre aspectos psicológicos do pós-operatório, diz que, em casos extremos porém não raros, o paciente que via na comida sua única fonte de prazer pode transferir esse vício para outros também maléficos, como álcool e drogas.

Contra-indicações
Segundo consenso médico internacional, a cirurgia só deve ser indicada para quem possui IMC (índice de massa corpórea) acima de 35 e, ao menos, uma doença recorrente da obesidade que possa ser regredida com a perda de peso. "Vejo muito moças que já tentaram de tudo e querem fazer a intervenção. Eu as encaminho para um psicólogo", diz José Carlos Pareja, chefe da cirurgia de obesidade da Unicamp, completando que é exatamente para coibir abusos que existe o consenso de indicação cirúrgica. Por fim, não existe nenhuma razão psiquiátrica e psicológica que contrarie a cirurgia. "Pode ser um esquizofrênico, um psicótico ou portador de síndrome de Down, por exemplo. Não existe contra-indicação", diz o psiquiatra Taki Cordas, chefe do Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares do HC.

Para o futuro
Os especialistas acreditam que os avanços não se darão nas técnicas cirúrgicas, mas no estudo de substâncias que regulam a fome e a saciedade. Até sábado, estarão reunidos, em Fortaleza, alguns dos maiores nomes da cirurgia bariátrica do Brasil e do mundo no 5º Congresso Brasileiro de Cirurgia da Obesidade. Uma das novidades apresentadas é a descoberta de uma dessas substâncias: a adiponectina, hormônio produzido pela célula gordurosa que é inversamente proporcional ao peso. Quanto mais magro, mais hormônio é produzido e vice-versa. "Ele é antiinflamatório, antiarteriosclerótico e antidiabético, o que explicaria um dos fatores de o obeso desenvolver tais doenças", conta Bruno Geloneze, endocrinologista da Associação Brasileira para Estudos da Obesidade (Abeso).


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