São Paulo, quinta-feira, 31 de agosto de 2000
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s.o.s. família
Não se trata dessa repressão truculenta e policial a que estamos, infelizmente, acostumados a associar a palavra
Sem repressão, não há educação

Rosely Sayão

Em quase toda reunião com pais a que vou, sempre aparece o tema da agressividade dos filhos. Esta é uma boa hora para essa discussão, já que recentemente soubemos pela mídia, mais uma vez, de uma dessas brigas entre jovens que termina com a morte de um deles. Claro que vamos, de novo, deixar de lado fatores como os sociais e políticos, que, certamente, influenciam o comportamento agressivo descontrolado de alguns jovens e algumas crianças. Vamos conversar apenas sobre a parte que cabe aos pais nesse assunto. Outro dia uma jovem mãe lamentava o que ela chamava de "alto grau de agressividade do filho" e dizia não saber como enfrentar o comportamento dele. Perguntei-lhe o que o filho, de 5 anos, fazia de tão agressivo. Ela respondeu que ele mordia os colegas, batia a cabeça na parede quando queria algo e não tinha, avançava em quem fosse quando tentavam impedir que ele fizesse ou pegasse algo, empurrava e derrubava crianças menores para ter o que queria... enfim, comportava-se como um verdadeiro "monstrinho". E como reagia a mãe até então? Conversava com ele, explicava pacientemente que ele precisava respeitar os amigos, que não podia bater nem morder, que podia se machucar quando tinha os acessos de birra, e tudo o mais. E o filho reagia? Claro que não! Criança dessa idade não tem como entender conversa de gente grande. Quer dizer, ela até pode entender o sentido do que a mãe fala, mas não tem, ainda, condição de controlar os seus impulsos. Para tanto ela precisaria aprender, e a mãe e o pai, ensinar. E criança aprende a se controlar ouvindo o adulto dizer que ela deve fazer isso? Nem pensar. Ela aprende, pouco a pouco, a segurar os seus impulsos agressivos sendo contida, sendo reprimida. E está posta a palavra tão assustadora: reprimir. Reprimir virou palavrão nestes tempos pós-ditadura. Acontece que, sem repressão, não há educação, não há possibilidade de convívio social. Educar os filhos já é muito difícil, e educar democraticamente é mais difícil ainda. Mas não há democracia sem proibição, sem repressão. Claro que não se trata dessa repressão truculenta e policial a que estamos, infelizmente, acostumados a associar a palavra. Mas da repressão que susta, que dosa, que modera, que retém, que refreia, que inibe. A criança de 5 anos que age como a mãe reclamava age como o esperado para essa idade: a criança usa os recursos que tem para tentar conseguir o que quer. Se os pais não reprimem essas reações do filho, ele vai continuar respondendo assim. Agora, imaginem essas reações quando o filho tem 12, 13 anos. E aos 18, 19? Dá no que deu essa briga que terminou em morte. Como conter esse tipo de impulso agressivo da criança? Segurando, impedindo, proibindo. Dialogar é preciso, mas só o diálogo não resulta em nada. É preciso que o diálogo seja acompanhado de uma ação orientadora e restritiva por parte dos pais. Não é assim que funciona com o afeto? Não basta os pais dizerem ao filho que ele é amado: esse afeto precisa ser expresso por meio de beijos, abraços, carinhos, cuidados. O mesmo vale para a repressão. Os pais precisam lembrar que não é proibido proibir quando se educa! Além disso, educar é agir no presente, pensando no futuro.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Sexo é Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-mail: roselys@uol.com.br


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