São Paulo, terça-feira, 31 de agosto de 2010 |
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ROSELY SAYÃO roselysayao@uol.com.br Novas rivais
MESES ATRÁS recebi uma correspondência muito interessante de uma adolescente. O tom e o conteúdo da mensagem foram passados com tanta intensidade que tive necessidade de ler, de reler e a ela voltar várias vezes para refletir sobre o que aquelas palavras comunicavam. Tenho recebido diversos pedidos para comentar uma história que se desenrola em uma novela, e que coincide com o assunto da mensagem que recebi da garota. Um breve resumo da novela: uma mulher adulta e madura, mas com idade indefinida, tem dois filhos e uma filha crescidos e mantém um casamento de aparências. Sempre que ela pode, procura jovens desconhecidos para ter relações sexuais ocasionais. Logo essa mulher descobre que o namorado da filha é um jovem com quem ela já teve um desses relacionamentos. Então, a personagem usa de todas as artimanhas para que o namoro termine. Na mensagem que recebi, a garota, prestes a completar 15 anos, reclamava da mãe. Não pense apressadamente, caro leitor, que as reclamações diziam respeito às proibições, regras familiares, imposições e demais atitudes que os pais de adolescentes precisam e devem tomar. Não: ela reclamava de atitudes que a mãe tinha e que ela interpretava como manifestações de pura inveja. Vou citar três exemplos que ela deu, que considero bem significativos. A adolescente me contou que sempre que ela comprava uma roupa de que gostava, logo a mãe a usava, sem lhe pedir permissão; que a mãe trocou o horário da academia para ir com a filha, depois que essa disse estar interessada em um jovem de sua turma, e que as amigas da escola estavam ligando para conversar mais com a sua mãe do que com ela mesma. Essa garota estava com a impressão de que sua mãe disputava a vida com ela, que é o que tem acontecido na novela. Em vez de uma relação entre mãe e filha, o que acontece, nos dois casos, é uma relação entre duas mulheres que rivalizam entre si. Vale a pena pensar nessa questão, já que alguns ideais de vida do mundo contemporâneo têm estimulado situações não tão radicais, mas muito semelhantes. Quem se arrisca, hoje, sem relutar, a calcular a idade de uma mulher? Independentemente da faixa etária, muitas compartilham o mesmo ideal de aparência: corpo magro, sem formas claramente definidas e com índice de gordura o mais baixo possível; roupas que evidenciam esse corpo cuidadosamente trabalhado e acessórios juvenis. Mulheres de todas as idades compartilham hoje os mesmos desejos, mesmos interesses e mesmos espaços de lazer e diversão. Não tem sido incomum encontrar mães acompanhadas de suas filhas adolescentes à noite, divertindo-se por aí em bares ou baladas. Isso pode até soar bonito: uma relação entre mãe e filha que inclui amizade, cumplicidade, partilha e união, não é verdade? Mas será que não existe mesmo uma inveja por parte dessas mulheres? Inveja da juventude das filhas, juventude essa que, por mais que tentem sustentar, demonstrar, vivenciar e agarrar, já se foi. Alguns valores do mundo contemporâneo têm tornado a vida um pouco mais cruel para todas as pessoas, notadamente esse, o valor da juventude eterna. É um valor cruel para os adultos, porque o envelhecimento é inexorável. E é cruel também para os mais novos porque, com tanta gente querendo ser jovem, deve ser difícil, para eles, buscar um modelo de identidade de ser homem e de ser mulher. ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha)
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