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Entrevista - Richard Murnane

Saber aprender é principal requisito do novo profissional

PESQUISADOR DE EDUCAÇÃO E MERCADO DE TRABALHO DE HARVARD DIZ QUE AMPLIAR O VOCABULÁRIO SERÁ CADA VEZ MAIS CRUCIAL

ÉRICA FRAGA DE SÃO PAULO

Se quiserem ser bem-sucedidos, os trabalhadores terão de se tornar principalmente leitores eficientes.

Essa é a opinião do economista americano Richard Murnane, professor da universidade Harvard, que se dedica ao estudo de temas relacionados à educação e ao mercado de trabalho.

Segundo ele, os profissionais não podem se restringir mais a simplesmente seguir instruções que estão resumidas em um texto.

Em vez de receber e cumprir orientações prontas, o desafio, no mercado de trabalho atual, é encontrar soluções para os diferentes problemas no vasto campo das informações on-line.

Para isso, os candidatos a vagas precisam, antes de tudo, de um amplo vocabulário --e o ideal é que ele seja adquirido já na pré-escola.

Murnane estará no Brasil na próxima semana para participar de seminários organizados pelo IAB (Instituto Alfa e Beto), em São Paulo e Recife, cujo tema é a educação baseada em evidências.

Leia a seguir trechos de entrevista concedida pelo economista à Folha.

Folha - Que característica do perfil dos trabalhadores é mais demandada hoje pelo mercado de trabalho?
Richard Murnane - De forma crescente, computadores têm dado conta de todos os tipos de tarefas mais fáceis. Então, atualmente, trabalhadores precisam ser capazes de ler de forma a aprender as coisas.
Por exemplo, se você fizer uma pesquisa on-line, terá milhares de respostas. Você precisa conseguir distinguir quais dessas respostas são úteis para resolver seu problema. Por isso, é fundamental que o trabalhador seja um leitor eficiente hoje em dia.
Se alguém precisar simplesmente seguir direções, você pode escrever um texto que diga o que ela precisa fazer, usando um vocabulário relativamente simples.
Mas o que é importante atualmente é que os trabalhadores usem a leitura para adquiri novos conhecimentos. Isso significa que precisam ser capazes de entender o significado de textos que tenham palavras que não viram antes.
Essa é uma das razões por que ampliar o vocabulário é mais importante hoje do que há 30 anos. E nós sabemos que é importante começar a construir o vocabulário cedo, já na pré-escola.

As escolas têm sido bem-sucedidas em fornecer esse tipo de mão de obra?
O desafio das escolas é ensinar essas habilidades para crianças de famílias com renda baixa.
O fato de que as crianças de famílias com renda mais baixa conhecem muito menos palavras do que crianças de famílias com renda mais alta já foi bastante documentado.

Qual é o formato ideal do ensino médio técnico hoje?
Acho que é importante que indivíduos que serão cidadãos em uma democracia pluralista tenham um bom conhecimento básico de ciências, que entendam a história de seu país e um tenham um entendimento de assuntos correntes, seja aquecimento global, armas nucleares ou como lidar com a Amazônia.
Tudo isso é fundamental para ser capaz de contribuir para o diálogo e para os desafios que países como o Brasil enfrentam no mundo atual.
A segunda coisa é que os adolescentes precisam ser capazes de adquirir habilidades fundamentais que os permitam continuar a serem aprendizes ao longo de sua vida.
Eles precisarão continuar a aprender a fim de conseguir ter uma vida decente, sejam eles chefs de cozinha, mecânicos de computador ou profissionais do setor de saúde.
Então a questão é: qual é a melhor forma para se ensinar as crianças a adquirir os conhecimentos básicos de estudos sociais e ciências assim como fortes habilidades fundamentais?
Todos podem aprender essas habilidades. Algumas crianças as aprendem com facilidade em escolas de ensino médio tradicionais. Outras crianças não vão bem nas escolas tradicionais.
Acho que é por isso que a educação vocacional tem sido repensada em muitos países, incluindo os Estados Unidos. A chave não é preparar os estudantes para realizar uma ocupação limitada, como ser um encanador ou um eletricista.
Existe um reconhecimento de que o ideal é que haja um foco em um grupo de ocupações no qual o aluno tenha interesse. Podem ser ocupações ligadas ao setor de saúde ou ao setor de tecnologia.
Então, o currículo precisa ser desenhado de forma que os professores usem ideias dessas áreas para ensinar os conhecimentos básicos de leitura, ciências e estudos sociais. Dessa forma, o interesse do aluno aumenta.

Um bom profissional precisa ter feito ensino superior?
É importante que os alunos saiam do ensino médio sabendo como tirar vantagem de educação e de treinamentos subsequentes.
Para alguns, isso significará ir para a universidade, para outros, significará entrar em um programa de treinamento.
Por exemplo, a indústria de automóveis muda frequentemente. É importante que um mecânico do setor automotivo possa ser mandado para um programa de retreinamento, no qual vai aprender sobre os novos designs de motor.
E que o mecânico possa experimentar e aprender sobre as novas tecnologias para adquirir aquele conhecimento e consertar os novos modelos de carros quando voltar para a empresa.
Isso não implica ir para a universidade, mas participar de um programa de retreinamento.

O que acontecerá com países que não consigam fazer com que a educação atenda às novas demandas do mercado?
Mudanças significativas em educação levam muito tempo.
O problema é que muitas vezes políticos que querem resultados rápidos pressionam por políticas --como a compra de novos computadores ou qualquer coisa que possa ser feita rapidamente--, mas as coisas que realmente importam levam muito tempo para melhorar.
Requerem uma estratégia que faça sentido e que seja mantida ao longo do tempo.
Além disso, em países com alto nível de desigualdade de renda, o fato de que crianças vindas de famílias de baixa renda não recebem educação decente reduz enormemente as possibilidades de mobilidade social.
Acredito que isso seja verdade no Brasil e sei que é verdade nos Estados Unidos.
Uma boa educação é o passaporte para a mobilidade social. Essa é a forma de você ter acesso a um trabalho melhor e a um maior nível de renda.
Portanto, se os mais pobres não tiverem acesso a uma boa educação, os filhos deles serão pobres também. E isso é profundamente inquietante.
Quando as pessoas sentem que, se trabalharem duro, seus filhos terão uma situação financeira melhor do que a delas, isso fortalece a democracia.
Agora, uma situação em que exista a percepção de que os pobres sempre serão pobres é uma ameaça real à democracia.


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