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Bruno Torturra

Dito pelo não dito

Independentemente das escolhas, há uma continuidade que não parece estar em jogo

E aí, assistiu aos debates, avaliou as plataformas? Prestou atenção no que foi dito? Que bom. Pois é a única forma de considerar algo fundamental: o que não foi dito. Pois em tempos de campanha, os não assuntos costumam revelar mais sobre o estado da nossa política do que os temas quentes da eleição. E, a julgar pelo que não foi discutido, o prognóstico pode ser grave.

Nem acho que seja o caso de evocar o histórico psicodrama público de junho de 2013 como baliza eleitoral. Até porque os números das pesquisas mostram que o incontinente desejo de mudança era menos profundo do que o atual nível hídrico da Cantareira --certo, Geraldo Alckmin?

Mas ainda guardava a esperança de que o eco, o denominador comum a todas aquelas cartolinas, pudesse ser o centro dessa eleição. A demanda que, voando abaixo do radar, conquistou mais de 7 milhões de assinaturas on-line em setembro passado: ampla reforma política em uma nova constituinte.

É fato que Dilma, em um episódio quase esquecido, chegou a sugerir tal plebiscito no auge das manifestações de 2013. Para, em 24 horas, ser lembrada de que o brado das ruas não é mais retumbante do que o "presta atenção" do PMDB. É verdade também que Dilma acenou, nesta campanha, a favor da proposta. Luciana Genro idem. Aécio acha que não é o caso de meter o povo no meio disso. E Marina Silva, que já foi defensora inequívoca, hoje prefere palavras mais oníricas do que pragmáticas, ao falar de uma "Nova Política".

De todo modo, mesmo que declarados, candidatos trataram da constituinte apenas incidentalmente. Tive mais facilidade em encontrar chapas parlamentares propondo baixar a R$ 2 a recarga mínima de celular, do que com uma visão propositiva do que há de ser feito para transformar as regras do jogo político.

O debate da Globo na quinta feira (2) é prova do que digo. Formato bom, embates quentes, momentos antológicos no que diz respeito à direitos e liberdades civis. Mas nem um pio, nem uma palavra sobre o fim do financiamento privado de campanha. Ou sobre as regras caducas e viciadas do jogo eleitoral. Nada sobre a agenda eleitoral, a possibilidade de recall, os conselhos de participação popular, candidaturas independentes ou democratização da mídia.

E assim, vamos às urnas sob uma névoa cada vez mais densa de variáveis, informação, desinformação, campanhas, denúncias, delações, calúnias, colunistas, memes, comentários de portal, imagens e imaginários. Milhões vão decidir, em algum lugar entre o cérebro e o fígado, nos mais diversos níveis alucinatórios, quem são seus eleitos. Mas, independente mente das escolhas, todas cruciais e, sim, muito diferentes entre si, há uma continuidade que não parece estar em jogo amanhã. E isso é o não dito mais gritante nesse pleito.

Pois se não formos capazes de criar o amplo consenso de que uma profunda reforma constitucional é a agenda mínima do país, o Brasil não vai conseguir romper sua disfuncionalidade política. E as utopias ou feridas políticas que se abrem, como naquele junho, por exemplo, se fecham rápido demais.

As eleições de 2014 começam a acabar em algumas horas. Que bom. Assim, quem sabe, seja possível aprofundar o debate político.


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