Índice geral Especial
Especial
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Orgulho de consumir, cautela ao gastar

Agora predominante, classe média lota aeroportos, é fã de celulares pré-pagos e valoriza seu novo poder de compra, mas é cuidadosa ao lidar com dinheiro

LAURA CAPRIGLIONE
DE SÃO PAULO

Uma certa turma bem-nascida adora maldizer a superlotação dos aeroportos brasileiros, atribuindo-a em grande medida à ascensão social dos mais pobres.

Agora transformados em classe média, antigos usuários de rodoviárias estariam enchendo de novos coloridos e sotaques os saguões de embarque e desembarque.

A pesquisa Datafolha mostra que 29% dos integrantes da classe alta compraram passagens aéreas nacionais nos 12 meses anteriores à realização da pesquisa, contra 12% da classe média alta que fizeram o mesmo. O índice cai para 6% na classe média intermediária e para 5% na classe média baixa.

Acontece que, demograficamente muito mais relevante, a classe média já leva aos saguões de embarques nacionais um total de 6,76 milhões de passageiros -quase o dobro dos 3,48 milhões de indivíduos de classe alta.

Na primeira semana de dezembro, a empregada doméstica Maria das Dores Quintana, 48, embarcava em um voo da Gol para Fortaleza, saindo de Guarulhos. A passagem, só de ida, foi comprada em seis parcelas fixas de R$ 123. "Esta é a primeira vez que vou de avião. E se de repente eu passar mal?", angustiava-se.

Com salário mensal de R$ 1.500, registro em carteira, dois filhos (que ficaram com a irmã, doméstica como ela), Das Dores não acha que vá passar aperto para pagar as prestações do bilhete aéreo. "Graças a Deus, não está faltando nada", comemora. Em todo caso, a viagem de volta será em ônibus fretado, R$ 200 a passagem. "Quem sabe, no ano que vem, faço tudo de avião?"

É assim mesmo. A pesquisa flagrou uma nova classe média orgulhosa do fato de agora poder consumir, ao mesmo tempo que se mostra muito cuidadosa e conservadora ao lidar com o dinheiro.

Assim, se 93% da classe média alta tem celular (87% da classe média intermediária e 76% da classe média baixa), o certo é que não serve qualquer celular.

"Tem de ser pré-pago", explica o mestre de obras Antonio Ermelino, 55, que tira "de R$ 3.000 a R$ 5.000" por mês. "A gente controla melhor os gastos com o pré-pago. Não tem surpresa. Se acabam os créditos, miou. Paro de ligar. Simples assim."

Para 91% da classe média intermediária, o gasto mensal com recarga de celular não passa de R$ 50.

Também no supermercado repete-se a cautela ao gastar.

Enquanto a maior parte da classe alta vai ao supermercado um vez ou mais por semana, entre o pessoal da classe média a maioria prefere compras mais espaçadas. Nas classes média intermediária e média baixa, a maior parte opta pela compra mensal, 55% e 56%, respectivamente.

"Essa classe média valoriza o consumo inteligente, voltado para as promoções; é uma classe média com foco maior nos preços", afirma Geraldo Monteiro, diretor de Operações do Grupo Pão de Açúcar, que inclui a marca Extra, referência para essas compras mensais.

Como acontecia nos piores tempos de inflação, a família ainda pega o carro e vai junta -pai, mãe e filhos- ao supermercado, não raro portando o folheto de ofertas.

Agora, porém, segundo Monteiro, "a nova classe média começa a experimentar coisas que antes lhe eram inacessíveis, como os alimentos orgânicos, light, produtos prontos para o consumo, congelados e pré-cozidos. Mas sempre de olho no preço".

A nova classe média desenvolveu também um padrão peculiar na hora do consumo de moda. Se entre os mais ricos o padrão é comprar roupas uma vez por mês, na classe média, roupa se compra a cada seis meses -e olhe lá.

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.