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Opinião - Fabio Feldmann

É hora de reconhecer a crise e dar respostas

As duas últimas décadas trouxeram grandes transformações. Nas comunicações houve praticamente uma revolução com a explosão da internet e da telefonia celular, bem como no desenho geopolítico do mundo.

O Muro de Berlim havia sido demolido há pouquíssimo tempo, os EUA saíam vitoriosos da primeira Guerra do Iraque, em 1991, e o mundo estava superando a Guerra Fria e a bipolaridade que a caracterizava. O movimento ambientalista, por sua vez, ganhava impulso e as suas bandeiras representavam, do seu modo, as novas utopias.

A mobilização da opinião pública em decorrência da divulgação da imagem de satélite sobre a Antártida havia comprovado que o impacto da humanidade sobre o planeta era incontestável, a ponto de a revista "Time" escolher como capa de janeiro de 1989 o "Planeta Ameaçado".

O relatório da Comissão Brundtland, cujo mandato era avaliar os resultados da primeira grande Conferência de Estocolmo, lançava a ideia do desenvolvimento sustentável e fazia o diagnóstico de problemas socioambientais.

Seu título foi tomado de empréstimo pela Eco-92, de modo que essa veio a se chamar "Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento".

O Brasil vivia o início da crise que levou ao impeachment do primeiro presidente eleito após a ditadura militar, Fernando Collor, e o combate à inflação galopante continuava o item prioritário na agenda econômica do país.

O desmatamento da Amazônia causava alto impacto na opinião pública internacional, ainda influenciada pela morte do primeiro grande mártir global da luta ambientalista, Chico Mendes.

Esse foi o contexto que levou o Brasil a sediar a Eco-92. Além do protagonismo brasileiro na Conferência de Estocolmo, defendendo que a pobreza seria a grande causa da poluição e que internalizar a dimensão ambiental somente seria possível após alcançarmos um outro patamar de crescimento econômico.

Assegurar, portanto, que o Brasil sediasse a conferência era uma maneira de persuadi-lo a compreender a importância da dimensão planetária inerente à questão ambiental. E, por parte do Brasil, no governo de José Sarney, demonstrar ao mundo que o país não era o vilão devorador da Amazônia e insensível em relação à consciência ambiental.

Vale lembrar que a própria expressão "biodiversidade" tinha surgido há poucos anos por iniciativa do ambientalista norte-americano Thomas Lovejoy e que aquecimento global era assunto exclusivo da comunidade científica.

O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) havia sido criado em 1988 e o seu primeiro relatório, divulgado em 1990.

Às vésperas da Rio+20, a esperança de 1992 cedeu lugar ao mau humor desses tempos bicudos que marcam a crise econômica na Europa e nos Estados Unidos.

A Agenda 21, um dos principais resultados da Eco-92, reflete o otimismo de então, uma vez que a expectativa era que adentraríamos no século 21 na direção do desenvolvimento sustentável. Seria um movimento irreversível.

Em que pesem controvérsias marginais, a ciência tem demonstrado que os limites do planeta estão cada vez mais próximos.

Paradigmático é o estudo publicado na revista "Nature" por uma equipe de cientistas liderados por Johan Rockström, que indica nove limites planetários: mudança climática; taxa de perda da biodiversidade; ciclo do nitrogênio e ciclo do fósforo; destruição da camada estratosférica de ozônio; acidificação dos oceanos; uso global de água doce; mudança no uso da terra; concentração de aerossol atmosférico e poluição química.

Dentre os limites mencionados, o mais urgente é o relacionado à mudança do clima, que exige da humanidade uma redução dramática na emissão de gases efeito estufa, com objetivo de manter o aumento da temperatura média do planeta em até 2°C até o fim do século, como foi definido na COP-15, em Copenhague, em 2009.

A Rio+20, entretanto, traz uma agenda difusa que não enfrenta como deveria os desafios do planeta.

Seus temas principais são "A economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza e a estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável".

Equivocadamente separa o ambiental do social como se o primeiro não se refletisse dramaticamente no segundo. E continua com uma mentalidade do século 20 que não leva em consideração as mudanças dos últimos 20 anos.

Em última instância, isso decreta o fracasso dessa conferência diante da história.

O Brasil, por sua vez, não tem sido capaz de exercer uma liderança inovadora e progressista que supere essa mentalidade atrasada.

Na Eco-92, a liderança foi exercida pelo secretário-geral Maurice Strong, tirando a exclusividade das decisões do mundo da diplomacia.

Nesses poucos dias que antecedem a Rio+20, espera-se que ela alcance alguns resultados fundamentais. O primeiro é o reconhecimento da urgência que a crise planetária traz e a sinalização de que assumiremos as nossas responsabilidades diante dela.

E, como desdobramento, seremos capazes de dar respostas à altura, a exemplo da criação de um "IPCC do planeta" e metas mensuráveis e verificáveis a serem monitoradas nas próximas décadas.

Os novos tempos são de implementação. E o destino de cada um de nós está atrelado aos resultados da Rio+20.

FABIO FELDMANN é ambientalista. Foi deputado federal pelo PMDB e pelo PSDB e candidato a governador de SP pelo PV.

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