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Entrevista - Rodrigo Teles

Empreendedor é o cara que vê os problemas da sociedade e, em vez de reclamar, cria soluções

DE ORIGEM AMERICANA, A ENDEAVOR TINHA EM SEU RADAR PAÍSES EM FASE DE CRESCIMENTO, MAS HOJE JÁ PENSA EM FAZER O CAMINHO CONTRÁRIO EM BUSCA DO QUE DIZ SEREM PAÍSES "ACOMODADOS", COM DEFICIT DE EMPREENDEDORES

Lucas Lima/Folhapress
Rodrigo Teles na sede da Endeavor, na Vila Olímpia, em São Paulo
Rodrigo Teles na sede da Endeavor, na Vila Olímpia, em São Paulo

OLÍVIA FLORÊNCIA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Criada em 1997, por dois ex-estudantes de Harvard que buscavam empreendedores em países em crescimento, a Endeavor chegou ao Brasil (a empresa não atua nos EUA) no ano 2000 buscando fomentar o empreendedorismo antes mesmo de a palavra "empreendedor" ter sido incluída no dicionário.

Já passaram pela organização casos de sucesso como a rede Spoleto, que hoje tem 400 lojas no Brasil, e a Poit Energia [de aluguel de geradores], que acaba de ser vendida por R$ 450 milhões.

Rodrigo Teles, 32, preside a ONG desde 2009, depois de já ter passado pela organização uma vez e de empreender. Ele fala sobre a Endeavor e afirma que empreendedorismo é o que falta para o Brasil e boa parte do mundo neste momento.

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Folha - A Endeavor se define como uma incubadora?
Rodrigo Teles - A Endeavor é uma ONG cuja causa é transformar o Brasil por meio do empreendedorismo.
Incubadoras pegam plano de negócios. Nós não aceitamos plano de negócios porque apostamos na pessoa física do empreendedor. Oferecemos capital humano e intelectual para ajudar esse empreendedor. No papel, a ideia pode ser brilhante, mas, se o empreendedor não tem a capacidade de execução, não adianta, 1% é a ideia, 99% é o fazer acontecer.

Quem é esse empreendedor?
É aquele cara que vê os problemas da sociedade e, em vez de reclamar desses problemas, cria soluções. Quanto mais empreendedor, menos problemas, melhor a qualidade de vida, mais emprego, mais renda.
Nossa missão é aumentar a produção desses empreendedores que a gente chama de "empreendedor de alto impacto", que é o cara que tem brilho no olho, que sonha grande, que tem resiliência. É o cara que faz com ética e integridade, que forma equipe.

A pessoa "morna" nunca vai poder empreender?
O cara morno pode ser empreendedor, mas ele precisa vender o sonho pra alguém. Então, se ele não faz, ele precisa de alguém que faça. A essência do empreendedor é vender. Competência de venda é essencial, não basta uma ideia brilhante.

Além do "brilho no olho", o que a empresa deve ter para entrar na mira da Endeavor?
Pegamos empresas que estão crescendo, que tenham entre R$ 2 milhões e R$ 50 milhões e que precisam de um impulso para chegar nas centenas de milhões.

Como as empresas são selecionadas?
Existem três vias para acharmos empresas. Uma via passiva, onde o empreendedor se inscreve no site. Essa é uma via que tem alto volume e baixa qualidade.
E duas vias ativas: membros da nossa rede ligam, fazem uma indicação e a gente entra em contato com o empreendedor. E o chamado "cold call", que é a nossa equipe buscando em revistas, jornais, televisão. Vemos algo interessante, ligamos para a empresa, explicamos o que é a Endeavor e visitamos a empresa.

E depois que a empresa é selecionada?
Uma vez que selecionamos a empresa, identificamos os desafios que ela tem para crescer. E um dos desafios é captar dinheiro. Empresas precisam de máquina, contratar gente, precisam de dinheiro para crescer. Não damos, mas tentamos entender qual o momento da empresa, para o que ela precisa de dinheiro especificamente.
Temos contato com os principais bancos, agências de fomento e indústrias de "venture capital" e "private equity". Então, praticamente todos os investidores brasileiros estão na nossa rede.
Uma vez que entendemos o quanto a empresa precisa, para que é esse dinheiro e preparamos o cara, conectamos ele com os investidores e saímos do meio do caminho. Esse momento é do empreendedor com o investidor.

O empreendedor recebe uma consultoria?
Não, a consultoria é prescritiva. Ela vai falar "esse é o caminho", entregar um plano. A Endeavor vai mostrar diferentes caminhos que deram certo para diferentes pessoas. E muitas vezes esses caminhos são opostos.
Cabe ao empreendedor analisar esses caminhos e tomar a decisão dentro do momento de vida dele. Abrimos a cabeça do empreendedor com pessoas muito boas. Questionar, fazer perguntas que ele não se fez, fazer o cara pensar no negócio dele.
O segredo do Vale do Silício é uma rede muito conectada no mesmo lugar. Você tem advogado, investidor, tudo muito rápido. O problema no Brasil é que é difícil você chegar às pessoas.

Quais outros problemas os empreendedores enfrentam?
Existe uma assimetria de informação muito grande entre bons recursos e bons empreendedores. O que a gente vê é que tem muitos recursos bons, mas os empreendedores não sabem onde estão ou como acessá-los.
Batemos nessa assimetria e conectamos o empreendedor com os melhores recursos do mercado. Se ele precisar de um bom advogado, temos uma rede com os melhores do Brasil. Societário, trabalhista, de contratos, tudo.
Uma crença muito simples do nosso modelo é a humildade. O empreendedor precisa entender que sempre tem alguém que entende de algo mais do que ele. Por que não encontrar essa pessoa e aprender com ela? Aprender onde ela errou, onde ela bateu a cara, pra não cometer os mesmos erros.

A Endeavor tem foco em tecnologia?
Não temos foco em um setor específico. O foco da Endeavor é gerar exemplos pro país, e o exemplo é muito relativo.
Se você analisar o portfólio da Endeavor, vai ver que a diversidade de indústrias e de tamanhos de empresas é enorme. Obviamente a gente tem uma concentração ainda grande de tecnologia. A Endeavor chegou ao Brasil em 2000, na época da bolha da internet. Naquela época, a gente selecionava muita gente de tecnologia. Em 2002, 2003, baixamos um pouquinho a seleção de tecnologia e começamos a atuar em outras indústrias: construção civil, moda, alimentação, varejo.
E recentemente, de dois anos pra cá, a gente voltou a atuar na parte de tecnologia, web, mundo digital e mobile, por razões óbvias. O mundo tá caminhando pra esse setor, é a grande tendência.

Quais os projetos futuros?
Quando a Endeavor nasceu, o objetivo era fomentar empreendedorismo em países em desenvolvimento. Hoje, o conceito de país em desenvolvimento é superdiscutível, porque a linha ficou tênue. Hoje a discussão da Endeavor em Nova York é em quais países atuar. Países que estão no radar: Espanha, Grécia, Itália e Estados Unidos -que, fora dos polos (São Francisco, Boston, Nova York), também têm áreas sem inovação. O que leva os países a crises é a falta de empreendedores.
Estudamos abrir escritório até no Japão, que também sofre com falta de inovação neste momento. É bem provável a entrada da Endeavor num desses países já em 2013.

Quem banca a organização?
As empresas que hoje são pequenas e a gente ajuda a crescer, quando crescem, dão o retorno. Em momentos de liquidez [em que saiu dinheiro da empresa pro bolso do acionista], pegamos 2% desse dinheiro, que não é usado e vai para um fundo patrimonial. Usamos os rendimentos desse fundo para manter as operações da Endeavor.

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