São Paulo, 10 de novembro de 1999


Cada casa tem seu desempregado na
vila criada para trabalhadores


da Sucursal do Rio

Segundo um levantamento feito por moradores de Vila Kennedy, no ano passado, 60% da população local com mais de 16 anos está sem trabalho.
O desemprego pode ser constatado nas ruas, pelo número de pessoas ociosas que perambulam ou conversam nas esquinas.
Em junho, 10 mil pessoas disputaram 20 vagas na escola de samba Unidos de Vila Kennedy. ‘‘As filas dobravam quarteirões. Parecia inscrição para o Banco do Brasil’’, diz Francisco de Assis, o Chiquinho do Belmonte, presidente da escola.
Nos últimos meses, rapazes desocupados aparecem diariamente no Ciep (Centro Integrado de Educação Pública) Tarso de Castro, de Vila Kennedy, à procura de refeição. Segundo a diretora, Márcia Cristina Roque, chegam em grupos, intimidando alunos e funcionários.
‘‘Não acredito que sejam traficantes. São jovens desempregados, que não têm perspectiva. O mundo deles começa e acaba aqui nesta vila, pois não têm nem sequer dinheiro para pegar ônibus’’, diz a diretora.
Em Vila Aliança, onde as ruas foram batizadas com nomes de profissões para reforçar a conotação de vila operária, todas as famílias têm exemplos de desemprego. O presidente da União dos Moradores de Vila Aliança, João Gomes, que vive na região há 38 anos, ironiza as promessas de melhoria de vida feita no início do projeto.
Diz que só as placas das ruas subiram na escala social, nestas três décadas. A rua do Calafate foi promovida a rua do Orador, a do Ferreiro subiu para Oculista e a dos Contínuos virou rua dos Cientistas.
Para medir a extensão do desemprego no local, a Folha percorreu todas as casas da rua Granjeiro. A primeira evidência está na transformação das moradias em comércio. Há placas anunciando picolés, couve picada, ovos, material de limpeza, manicure, aulas particulares de reforço, conserto de eletrodomésticos, entre outros.
Salas são transformadas em biroscas para venda de bebidas e até máquinas de videopôquer funcionam para aumentar a renda das famílias. Na casa de número 12, onde vivem três famílias, funciona uma escola improvisada para aulas particulares na sala e uma minilocadora de vídeo em um dos quartos.
O ajudante de caminhão Robson Pedro Silva, 28, morador do número 19, conta que perdeu o emprego há três anos e que desde então vive ‘‘na aba’’ dos pais. ‘‘Faço biscates consertando rádios. Também carrego caixas de verdura nas feiras, mas não chego a tirar R¹ 100 por mês.’’.
Aposentado aos 49 anos por invalidez, José Marques Ferreira, morador do número 13, é o único com renda na família: recebe R¹ 130 de aposentadoria e um salário mínimo como roupeiro do Ceres, time da segunda divisão do Campeonato Carioca. O filho mais velho perdeu o emprego no mês passado. (EL)

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.