São Paulo, 17 de outubro de 1999


Tráfico faz Ribeirão ser 253%
mais violenta que Uberlândia


Drogas são responsáveis por 90% dos crimes registrados no município paulista, segundo a polícia; só nos últimos três anos, 500 quilos de drogas foram apreendidos

LUÍS EBLAK
Editor-assistente da Folha Ribeirão

A chamada "rota caipira" do tráfico de drogas contrapõe duas cidades igualmente ricas e com praticamente a mesma população. Apesar das semelhanças, a violência em Ribeirão Preto é 252,9% maior do que na mineira Uberlândia. Ribeirão teve 180 assassinatos em 97. Uberlândia, 51.
Os dados são das unidades da Polícia Civil das duas cidades. Se forem considerados os números deste ano até quinta-feira passada, o parâmetro não muda muito: 169 homicídios no município paulista, contra 52 no mineiro (diferença de 225%).
Já com os números do Datasus, a diferença entre Ribeirão e Uberlândia seria ainda maior.
Seriam 175 homicídios na cidade paulista contra apenas 3 no município mineiro.
Só que a própria Polícia Civil mineira e o Ministério da Saúde dizem que o número é muito baixo. "O mais provável é que tenha havido alguma falha na transmissão de informações para a secretaria municipal", diz Hélio de Oliveira, um dos responsáveis pelo Centro Nacional de Epidemiologia em Brasília.

Motivos
Uma das causas para a diferença entre os números é o tráfico de drogas, mais intenso e organizado em Ribeirão Preto.
Além de ter gangues rivais que controlam os entorpecentes na cidade -o que não ocorre em Uberlândia-, Ribeirão também possui uma posição estratégica na distribuição de drogas.
Segundo a Polícia Federal, o nordeste paulista tem cerca de mil pistas clandestinas de pouso, que recebem a droga de avião diretamente da Bolívia. Só nos últimos três anos, foram apreendidos 500 quilos de entorpecentes em aeronaves que caíram na região.
A partir de Ribeirão Preto, a droga é distribuída via terrestre para o interior de São Paulo, sul de Minas Gerais e Goiás.
"As brigas de gangues do tráfico em Ribeirão também intensificam a violência. As drogas são responsáveis por 90% dos crimes na cidade", afirma o delegado-seccional paulista Alexandre Jorge Daur, que destaca que o crescimento desordenado também ajudou a aumentar as mortes.
É o caso de Luciano Biscaro Rodrigues, morto, segundo a polícia, pela guerra de traficantes em fevereiro de 1997, aos 20 anos.
Segundo sua mãe, Valquíria, ele saiu de casa na noite de uma quinta-feira, não voltou por dois dias e apareceu morto no terceiro.
Mais equipados do que a polícia, com armas potentes e automáticas, os traficantes acabam impondo uma realidade triste e aumentando a criminalidade.
"A polícia está perdendo a guerra contra a violência. A política de segurança pública precisa ser repensada", diz o delegado da Polícia Federal de Ribeirão Wilson Alfredo Perpétuo.
Ex-secretário da Segurança Pública de Alagoas (91-94), Perpétuo também atribui a alta da violência em Ribeirão ao mito da "Califórnia Brasileira", criado nos anos 80, no auge do Proálcool.
Para tentar resolver o problema, o delegado participa do movimento Ribeirão Pela Paz, lançado no início deste mês.

Futilidades
Uberlândia, por outro lado, está longe de ser considerada uma cidade tranquila, mas com certeza é muito mais sossegada do que Ribeirão. No município mineiro, os homicídios estão ligados a motivos fúteis, como brigas de bar ou crimes passionais.
Segundo o delegado Ramon Tadeu Carvalho Bucci, o tipo de crime que predomina em Uberlândia são furtos e roubos contra o patrimônio (cerca de 40% do total das ocorrências).
"A droga chega, sim, a Uberlândia, mas aqui não ocorrem crimes de gangues como no Estado de São Paulo. Isso deve ocorrer em Ribeirão pela proximidade dessa cidade com a capital paulista", afirma o delegado da Polícia Federal de Uberaba Eriosvaldo Renovato Dias, responsável pelo Triângulo Mineiro.
"Aqui se mata por besteira", diz Bucci. Num dos casos, Geremias Martins da Silva Neto, 25, foi morto por ter olhado no rosto de seu assaltante. "O ladrão disse que o matou porque meu filho o reconheceria depois", afirma a mãe da vítima, Marina Gonçalves de Oliveira.

Colaborou Luciana Cavalini, da Folha Ribeirão


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.