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Eleições 2006
Serra
CATIA SEABRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Ele abomina o gerúndio como resposta. E, na Prefeitura
de São Paulo, baniu expressões
como "viabilizar", "logradouro" e "munícipe". Líder nas
pesquisas de intenção de votos,
o candidato do PSDB ao governo paulista, José Serra, é adepto do antitucanês reloaded.
Só não dispensa um eufemismo ao se descrever. O ex-prefeito de São Paulo se apresenta
como "obstinado, curioso e diligente". Seus mais fiéis colaboradores traduzem: obcecado,
perturbador e perfeccionista.
Serra também reconhece: é
"um pouco impaciente". Que o
digam seus subordinados.
Generoso na delegação de
poder e objetivo na fixação de
prioridades, é implacável na cobrança de resultados, a ponto
de constranger publicamente
um assessor se insatisfeito.
Pobre Walter Feldman, secretário de Subprefeitura na
gestão Serra. Lado ao lado, num
palanque em Itaquera, ouviu o
chefe acusá-lo de falta de dedicação no combate à poluição.
"Ele me destruiu várias vezes",
lembra Feldman, numa referência às exigências do chefe.
"Agüente, Feldman. Você vai
ser outro depois dessa experiência", repetia, imodestamente, Serra.
Outro exemplo? Em março
do ano passado, Serra determinou que um helicóptero buscasse a então secretária de Serviços, Maria Helena Orth, para
uma reunião com subsecretários na Zona Leste. Convocada,
Orth alegara dificuldade para
chegar a São Miguel Paulista.
Em outra, também com subprefeitos, Serra divulgou o próprio número do telefone após
Orth argumentar que não tinha
tempo para atendê-los. Ela foi
demitida em maio de 2005.
Sem "trololó"
Avesso a evasivas - a que
chama de "trololó" - Serra é
capaz de interromper um assessor ao perceber que não tem
as respostas que procura. Foi o
que fez com o secretário de Assistência Social, Floriano Pesaro, após uma sabatina sobre
renda mínima. "Secretário, estude o assunto e volte", recomendou a Floriano, que, ainda
assim, e a exemplo de Feldman,
descreve como estimulante o
trabalho com o ex-prefeito:
"Éramos felizes", diz.
Numa reunião, ele já telefonou para a central de atendimento da Prefeitura, diante de
toda a equipe, para testar a qualidade de serviço. Em outra,
suspendeu a audiência para, de
helicóptero, confirmar se uma
obra cumpria o ritmo descrito
há pouco por um secretário.
"É muito difícil enrolar Serra. Ele tem aquele famoso "por
quê?", afirma o secretário de
Governo, Aloysio Nunes Ferreira, ele mesmo flagrado pelo
ex-prefeito. "Serra brigou comigo porque terceirizei a redação de uma nota. Reconheceu
diferenças no estilo", conta.
Serra pode ser cortante
quando um subordinado é pouco objetivo. "Meu problema é o
tédio", confessa o candidato.
Se decepcionado, submete o
auxiliar a dolorosa fritura, começando pelo esvaziamento de
suas atribuições. Foi assim com
o ex-secretário de Esporte
Marcos Tortorello: perdeu a
administração do autódromo
para a SPTuris e os centros municipais para a Educação. Depois, se demitiu.
Contrariado com um desempenho de um secretário, pode
recorrer diretamente a um de
seus subordinados em busca de
respostas. Econômico nos elogios, premia os bem-sucedidos
com mais trabalho.
Filho único de um imigrante
italiano com uma filha de imigrantes, Serra exige dedicação
integral de sua equipe. À frente
do Ministério da Saúde (1998 a
2002), chegou a propor que o
secretário de Assistência à Saúde, Renilson Rehem, usasse um
celular exclusivamente para
atendê-lo. Fosse no Planejamento (de 1995 a 1996) ou na
Saúde, preferia que os assessores não deixassem Brasília nos
fins de semana.
Num bilhete, recomendou
até que Rehem desistisse, na
véspera do embarque, de um
congresso em Paris. Como o
ministério enfrentou crise durante sua ausência, Rehem foi
recepcionado com um "não falei que essa viagem seria um desastre?". "Mas nem foi no meu
departamento", reagiu Rehem.
Política
Além de cebola e alho, Serra
não digere as desilusões políticas. "Ele não perdoa deslealdade", afirma o líder do PSDB na
Câmara e amigo, Jutahy Magalhães Jr. (BA). Ex-presidente
da UNE, exilado no Chile - onde concluiu o mestrado em economia -, e duas vezes deputado, Serra concorreu a seis cargos majoritários nos últimos 20
anos. Colecionou desafetos no
caminho, sendo Ciro Gomes
(PSB) um deles.
Mas, além de demonstrações
de solidariedade aos aliados,
Serra - o beligerante - reserva
surpresas. Já abordou o ator
José Mayer num aeroporto só
para apresentá-lo a assessoras.
Também perseguiu um grafiteiro pelas ruas de São Paulo às
2h da madrugada. Ele, o secretário Andrea Matarazzo e suas
mulheres voltavam do cinema.
Estavam na Heitor Penteado.
"Pare o carro", gritou Serra,
que, ao alcançar o pichador, fez
um interrogatório para saber
suas motivações.
Mesmo com um prodigioso
poder de concentração, consegue ser distraído o bastante para perceber, apenas 15 minutos
depois, que entrou na embaixada errada para um almoço em
Washington.
Família
O ar retraído se esvai na companhia dos filhos Verônica (37)
e Luciano (33). Ele se derrete
pelo neto, Antônio (3). Na semana passada -quem diria?-
foi "o Lu" quem escolheu sua
gravata para o debate na Globo.
Idolatrado por três tias -até do
ponto de vista estético- visita a
mãe, Serafina, 90, pelo menos
uma vez por semana.
Serra é dono de hábitos extravagantes. Para aliviar a tensão, costuma fazer esteira de
madrugada, mas não come para
evitar mal-estar pela manhã. E
é verdade: colocou uma cama
no banheiro da Prefeitura de
São Paulo, para passar mais
tempo no trabalho.
Hoje, aos 64 anos -39 deles
ao lado da mulher, Mônica-
Serra sua nas mãos de Geraldo,
seu personal trainer. Também
se submete a sessões de acupuntura e massagem. Adora
quando elogiam seu perfil. Mas
sua preocupação com as marcas do tempo vai além da vaidade. Vai até 2010. "Estou abatido
na TV?", pergunta. É preciso
estar em forma para a corrida
presidencial.
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