São Paulo, domingo, 03 de abril de 2005

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JOÃO PAULO 2º

REVISÃO HISTÓRICA

Pedidos de perdão curaram feridas

João Paulo 2º adotou o arrependimento como um dos temas-chave, lamentou erros da Igreja Católica e foi o primeiro líder católico a entrar numa mesquita

ESPECIAL PARA A FOLHA

Em iniciativas sem precedentes, João Paulo 2º pediu perdão a Deus por erros da Igreja Católica, em especial pelo tratamento dispensado aos judeus e pelas violações de direitos de grupos étnicos e religiosos, incluindo ciganos e imigrantes. Adotou o arrependimento como um dos temas-chave do ano do Jubileu -e de seu papado também.
A missa do Dia do Perdão, celebrada na basílica de São Pedro em março de 2000, fez parte de uma campanha por um exame de consciência no início do terceiro milênio da Igreja Católica. Na cerimônia, cinco cardeais e dois bispos faziam uma confissão dos erros da igreja e o papa respondia. Depois de cada pedido de perdão, acendia uma lâmpada diante de um crucifixo. No total, foram sete.
"Pai de todos os homens, por meio de Teu Filho nos pediste para amar os inimigos, fazer bem aos que nos odeiam e orar pelos que nos perseguem. Muitas vezes, no entanto, os cristãos desmentiram o Evangelho e, cedendo à lógica da força, violaram os direitos de etnias e povos, depreciando suas culturas e tradições religiosas", disse o papa no "mea culpa".

Abusos da Inquisição
No documento "Memória e Reconciliação: A Igreja e os Erros do Passado", o papa também descreveu como erros divisões internas no cristianismo, conversões forçadas e o uso da violência. O texto faz alusão à tortura e à queima dos hereges nas fogueiras, apesar de dizer que "em diversas ocasiões no último milênio métodos duvidosos foram utilizados para obter resultados justos". Referências a abusos cometidos nas Cruzadas e na Inquisição, aliadas a visitas a países islâmicos, reforçaram uma aproximação com o islã.
João Paulo 2º foi o primeiro líder católico a entrar em uma sinagoga, em 1986, em Roma, e publicou um documento sobre o Holocausto em 1998. Na ocasião, o papa expressou arrependimento pelo fato de católicos terem deixado de ajudar judeus a escapar da tragédia. O documento foi além de qualquer outro comunicado prévio do Vaticano, mas desapontou líderes judeus que queriam que ele reconhecesse a suposta responsabilidade de autoridades da igreja -em particular de Pio 12, papa que é tema de divergência entre o Vaticano e organizações judaicas no que concerne sua atuação durante o nazismo.
Em maio de 2001, João Paulo 2º também se tornou o primeiro líder católico a entrar em uma mesquita, na Síria, onde exortou cristãos e muçulmanos a pedir perdão mutuamente por erros cometidos no passado.
O papa também pediu perdão "pelas divisões entre os cristãos", em referência principalmente às desavenças com os protestantes e com os cristãos ortodoxos, que se separaram da Igreja Católica no Grande Cisma do Oriente, em 1054, quando os bispos de Roma e de Constantinopla se excomungaram mutuamente.
Nas campanhas de reaproximação ecumênica, buscou a reconciliação com protestantes, especialmente luteranos. Desencadeada pelo teólogo alemão Martinho Lutero (1483-1546), a Reforma Protestante marcou o rompimento de um grupo de cristãos com a Igreja Católica. Lutero publicou 95 teses em que condenava a venda de indulgências. Os protestantes não reconhecem a autoridade papal e rejeitam o culto a Maria e aos santos.
Em outubro de 1999, católicos e luteranos puseram fim a diversas desavenças doutrinárias em um documento descrito pelo papa como "um marco no complexo caminho para reconstruir a plena unidade entre os cristãos".
Alguns católicos expressaram reservas em relação aos pedidos de perdão por vê-los como uma concessão "àqueles que são hostis" à igreja. Para o papa, o ato não foi um julgamento sobre a "responsabilidade subjetiva dos cristãos que nos precederam, mas um sincero reconhecimento das culpas cometidas pelos filhos da igreja no passado". O documento de perdão diz que muitos atos passados não podem ser julgados tendo em mente apenas os padrões morais contemporâneos.
(PAULO DANIEL FARAH)


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