São Paulo, quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

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futuro - DANIEL CYWINSKI

Arte no canteiro

Administrador introduz ateliês para operários nas obras e ajuda a edificar novos pilares em suas vidas

EDSON VALENTE
EDITOR-ASSISTENTE DE IMÓVEIS

Desde o princípio, o grande desafio de Daniel Manchado Cywinski, 35, foi o de ligar dois universos: o da projeção, da arte, ao da realidade dura; o abstrato ao concreto.
Quando estava se formando em administração, virou educador ambiental em favelas de Santo André (SP), no tempo em que o conceito de sustentabilidade beirava o abstracionismo.
O trampolim para andaimes mais altos, contudo, surgiu em 2001, ao visitar em uma obra o amigo e arquiteto Arthur Zobaran Pugliese, 35. Foi quando tiveram a ideia: implantar ateliês de arte dentro dos canteiros, aproveitando restos de materiais para fazer as peças.
Para o acabamento do projeto, houve ainda um toque do artista catalão Gaudí (1852-1926), após uma viagem realizada pela dupla a Barcelona. "Voltamos de lá com a certeza de ser possível fazer arte com resíduos de obra", diz Daniel.

Força maior
O pilar central da empreitada: orientar o trabalhador a incorporar a subjetividade ao manuseio daqueles materiais. Tem, assim, a chance de inverter o padrão e ser dono da ideia, do começo ao fim, sem mudar as ferramentas de trabalho.
Mas, se o desenvolvimento do conceito -o abstrato- não enfrentou grandes barreiras, sua operacionalização -o concreto- precisou e ainda precisa implodir paradigmas.
"Foi dificílima", recorda Daniel. "Até hoje a construção civil é uma das mais atrasadas em desenvolvimento humano."
Foram várias "portadas na cara", risadas, chacotas. "Mas havia uma força maior. Algo para acontecer que, de tão verdadeiro, mexia com as pessoas."
O espaço para concretizar a proposta foi encontrado, diz, nas frestas da construção civil. Outro desafio foi derrubar a rigidez do próprio trabalhador. "É preciso respeitar muito a sabedoria do operário, que mexe no material como ninguém."
Essa relação tem sido edificada desde a primeira oficina, em Mauá, proporcionada por uma construtora de Santo André.
"Meia hora por semana com três operários, perto de uma favela. Pensavam que desistiríamos na segunda semana. Fizemos por seis meses."
A repercussão foi parar em uma página inteira do "Diário do Grande ABC" e pavimentou o caminho para um ano e meio em um canteiro com 500 trabalhadores em Santo André.
As dificuldades, hoje, ainda são muitas, e Daniel as analisa com os pés firmes no chão. "Se não fica claro para o marketing que dá para capitalizar em cima, o projeto não acontece."
O Mestres da Obra, atualmente, consome quase todo o seu tempo, mas financeiramente Daniel ainda não consegue viver só dele. Isso, porém, não abala sua determinação.
"Estamos com três projetos colocados que, se saírem, vão significar algo que a gente nunca teve em volume de canteiros. Estou muito animado."
O entusiasmo é uma boa medida do que está por vir. Afinal, após tantos percalços, o visionário sabe bem onde pisa.


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