São Paulo, quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

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FRANCISCO ALEMBERG

Meninada do sertão

Músico cria "quartinho de brincar" em que se constrói o futuro com o desvendar do passado

CÁSSIO AOQUI
ENVIADO ESPECIAL A NOVA OLINDA (CE)

Quando pequeno, o menino Francisco Alemberg de Souza Lima dizia que, no dia em que virasse homem grande, teria um quartinho só para brincar.
Hoje, aos 44 anos e ainda menino, o grande homem enche os olhos de brilho ao falar da Fundação Casa Grande, um privilegiado quartinho de brincadeiras que divide com outras 70 crianças e mais de 25 mil curiosos que ali passam anualmente.
Está tudo lá. A paixão antiga por quadrinhos foi traduzida no rico acervo da gibiteca, onde não poderia faltar toda a coleção da revistinha "Tex", seu gibi favorito. No recinto ao lado, prateleiras recheadas de nomes como Vittorio de Sica e Giuseppe Tornatore revelam a preferência pelo cinema italiano.
E se, na primeira infância, Alemberg escreveu um livro e vários gibis, na atual, montou uma biblioteca e desenhou a Casa Grande Editora, onde a meninada inventa personagens e produz materiais educativos.
Até a banda de lata que tinha com o irmão não ficou de fora -deu origem aos grupos musicais Os Cabinha e Abanda.
"A Casa Grande é o resumo da epopeia da minha infância", define o moleque cearense. "Tenho a alegria de ter estendido minha meninice até hoje."

Homem de cariri
Exímio contador de histórias e mitos -tanto que foi a inspiração de Selton Mello para o personagem Chicó, do filme "O Auto da Compadecida"-, Alemberg também tem em sua fábula uma heroína: a arqueóloga Rosiane Limaverde.
Juntos, formaram a dupla Alemberg e Rosiane e viajaram por todo o Brasil apresentando em festivais canções compostas a partir de pesquisas sobre a mitologia dos cariris, primeiros habitantes do sul do Ceará.
"A primeira pesquisa foi sobre a lenda da pedra da batateira, de que a região seria inundada um dia, e os cariris voltariam ao sertão", lembra Rosiane.
Ela também foi a pedra fundamental para a criação, em 1992, do Memorial do Homem Kariri, na mais antiga casa de Nova Olinda, pertencente à família de Alemberg. Como se a lenda tivesse de se cumprir, o casal inundou o sertão com as histórias de seus ancestrais.
Feita de menino para menino, a Casa Grande tem o ideal de "criar um lugar com a língua da qualidade, tendo a mitologia como pontencializador social".
É com um olhar pueril, eternamente infantil, que seu mentor escava um lema, parafraseado de um verso do poeta Patativa do Assaré: "Pra onde eu olho, vejo um verso se bulir".
"Quando olho para a natureza, vejo uma cachoeira de rimas caindo por cima de mim. Quero desenvolver uma condição de a gente poder ver sempre os versos se bulirem. Por mais que a vida seja dura, por onde passa, a gente pode ver esses versos", sonha o visionário Alemberg, ou, como descreve Rosiane, o verdadeiro homem de cariri.


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