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ANÁLISE
Um humor moderno
GONÇALO JUNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA
Era como se "O Pasquim" ditasse as tábuas da lei, a princípio: pregava um humor combativo, militante, raivoso, irado e
implacável contra a ditadura.
Simplesmente porque tinha de
ser assim. Henfil, como um Antonio Conselheiro, era seguido
por cartunistas como se estes
fossem uma legião estrangeira
-da qual faziam parte Angeli,
Laerte, Paulo, Chico Caruso e
outros artistas.
Aí veio Glauco para avacalhar
tudo. Riponga, alucinado depois de ler "A Erva do Diabo",
de Carlos Castaneda, criou Geraldão, em 1981, e trouxe uma
alternativa ao humor: a de rir
de todo o rescaldo que havia de
comportamento depois da verdadeira revolução sexual e da
falsa revolução militar.
A importância de Glauco ia
além de sua produção individual. Ele foi fundamental para
a modernização do humor gráfico no Brasil e deu o tom para a
renovação que viria a seguir na
televisão e no cinema.
Com um dos traços mais personalíssimos e originais de todo o mundo, inimitável e antiplagiário, ele estabeleceu que
se deveria fazer um humor
neurótico, indecente, imoral,
escrachado, mas não preconceituoso. Embora passasse a
criar cartuns políticos na Folha, tornou-se uma fonte de
graça em comportamento para
o jornal "Planeta Diário" e a revista "Casseta Popular".
O nome de Glauco será para
sempre indissociável aos dos
cartunistas Angeli e Laerte.
Não apenas porque trabalharam no mesmo jornal por tanto
tempo e, juntos, tornaram-se a
santíssima trindade dos quadrinhos brasileiros nestes 25
anos. Havia uma sincera amizade entre eles. Eram os "Los
Três Amigos", cuja série se tornou um marco dos quadrinhos
nos anos 80. Tinham por trás
um escudeiro: Toninho Mendes, que transpôs para os gibis e
livros os quadrinhos que publicavam na Folha. Juntos, criaram a revista "Circo", em 1986,
e, depois, o gibi "Geraldão".
Como Toninho observou, esses quatro amigos eram unidos
por uma afinidade resumida
em três pontos de vista: eram
videntes e visionários no sentido espiritual; nunca levaram
nada a sério, nem a si mesmos;
e sempre se relacionaram com
irmandade. Assim, não seria
exagero dizer que Angeli, Laerte e Glauco estariam mais para
os Três Patetas, no melhor sentido do termo. Essa parece ser a
explicação para se compreender o quanto eles jamais serão
separados na sonoridade da
junção de seus nomes. Nem
mesmo pela morte.
GONÇALO JUNIOR é autor de "A Guerra dos Gibis" (Companhia das Letras, 2004)
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