São Paulo, sábado, 13 de março de 2010

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ANÁLISE

Um humor moderno

GONÇALO JUNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Era como se "O Pasquim" ditasse as tábuas da lei, a princípio: pregava um humor combativo, militante, raivoso, irado e implacável contra a ditadura.
Simplesmente porque tinha de ser assim. Henfil, como um Antonio Conselheiro, era seguido por cartunistas como se estes fossem uma legião estrangeira -da qual faziam parte Angeli, Laerte, Paulo, Chico Caruso e outros artistas.
Aí veio Glauco para avacalhar tudo. Riponga, alucinado depois de ler "A Erva do Diabo", de Carlos Castaneda, criou Geraldão, em 1981, e trouxe uma alternativa ao humor: a de rir de todo o rescaldo que havia de comportamento depois da verdadeira revolução sexual e da falsa revolução militar.
A importância de Glauco ia além de sua produção individual. Ele foi fundamental para a modernização do humor gráfico no Brasil e deu o tom para a renovação que viria a seguir na televisão e no cinema.
Com um dos traços mais personalíssimos e originais de todo o mundo, inimitável e antiplagiário, ele estabeleceu que se deveria fazer um humor neurótico, indecente, imoral, escrachado, mas não preconceituoso. Embora passasse a criar cartuns políticos na Folha, tornou-se uma fonte de graça em comportamento para o jornal "Planeta Diário" e a revista "Casseta Popular".
O nome de Glauco será para sempre indissociável aos dos cartunistas Angeli e Laerte.
Não apenas porque trabalharam no mesmo jornal por tanto tempo e, juntos, tornaram-se a santíssima trindade dos quadrinhos brasileiros nestes 25 anos. Havia uma sincera amizade entre eles. Eram os "Los Três Amigos", cuja série se tornou um marco dos quadrinhos nos anos 80. Tinham por trás um escudeiro: Toninho Mendes, que transpôs para os gibis e livros os quadrinhos que publicavam na Folha. Juntos, criaram a revista "Circo", em 1986, e, depois, o gibi "Geraldão".
Como Toninho observou, esses quatro amigos eram unidos por uma afinidade resumida em três pontos de vista: eram videntes e visionários no sentido espiritual; nunca levaram nada a sério, nem a si mesmos; e sempre se relacionaram com irmandade. Assim, não seria exagero dizer que Angeli, Laerte e Glauco estariam mais para os Três Patetas, no melhor sentido do termo. Essa parece ser a explicação para se compreender o quanto eles jamais serão separados na sonoridade da junção de seus nomes. Nem mesmo pela morte.


GONÇALO JUNIOR é autor de "A Guerra dos Gibis" (Companhia das Letras, 2004)


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