São Paulo, domingo, 15 de março de 2009

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Qualidade

2 em 10 vivem sozinhos

Longevidade e mais qualidade de vida permitem manter autonomia , mas o idoso não pode se isolar

MARIANA LAJOLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Aos domingos, a movimentação começa cedo na casa de Odete Russo França, 77. Filhos e netos vão chegando para o almoço. Se tiver jogo do Palmeiras, a festa fica completa. À tarde, aos poucos, as visitas vão embora, o ruído intenso dá lugar ao silêncio, a sala volta a ficar vazia. Exatamente como a matriarca gosta.
Odete ficou viúva há dez anos e viu o último filho sair de casa há sete. No começo, sentiu falta de alguém com quem ver TV, mas logo descobriu que se sentia muito bem.
O Datafolha revela que, como Odete, um quinto dos idosos brasileiros mora sozinho, índice semelhante ao de países como Itália (22%) e Portugal (18%), diz a Eurostat, agência de estatísticas da União Europeia, mas abaixo de EUA (27,5%) e França (29%).
O fenômeno é mundial e vem crescendo graças a uma combinação virtuosa: vive-se mais e em melhores condições de saúde. A prova é que 67% dos que moram sós dizem que realizam todas as tarefas domésticas. Os ajudados somam 30% (14%, por parentes e amigos; 16% , por empregadas).
Mesmo que a falta de ajuda extra resulte menos da preferência pessoal e mais do orçamento apertado, a verdade é que, para parte dos idosos, viver só é sinônimo de autonomia. Tanto que metade dos entrevistados considera sua vida ótima/boa, índice semelhante ao da população.
"Tenho duas ajudantes ótimas, mas preferia a liberdade de morar sozinha", conta Branca Degrazia, 82, viúva de Porto Alegre. "O problema é que os filhos não deixam."
Nem o corpo, que aos poucos vai impondo novos limites: um agravamento na artrose fez Branca passar da condição de fisicamente frágil para fisicamente dependente. "Agora, viver com filho só vou quando estiver mal. Seria um choque de gerações, velha é chata demais", brinca.

Onde viver
Gatilhos para dificultar a convivência em casa alheia realmente não faltam. Pode ser a impossibilidade de se cuidar sozinha, o medo de incomodar ou ser incomodado, o apego a velhos hábitos e realidades. Ou de tudo um pouco, caso de Marion Admoni, 65, que "desabou" ao enfrentar a morte do marido e depois do filho.
Há sete meses, no auge de uma depressão, Marion percebeu que precisava de ajuda especializada e foi morar em uma instituição para terceira idade de São Paulo. Ela diz que já se recuperou, mas, se deixar a instituição, prefere não morar com as filhas. "Elas trabalham muito, têm vida agitada, sem tempo para dedicar a mim. Não consigo acompanhar essa rapidez da vida moderna e já tenho minhas manias", afirma.
Por razões culturais e financeiras, essa é uma opção para poucos. Segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), o país tem cerca de 6.000 delas, onde vivem pouco mais de 100 mil pessoas. "A família deve avaliar bem, com ajuda do médico. É preciso atenção principalmente aos idosos lúcidos, que sofrem mais com a perda da referência do lar", explica Rodolfo Schneider, professor do Instituto de Geriatria da PUC-RS.
Ele lembra que é necessário também dar atenção a quem cuida deles. "Há o que chamamos estresse do cuidador, que pode ser da família ou profissional. Quanto maior a dependência do idoso, maior esse estresse, que pode gerar desgaste na relação."
Vivendo sozinho, em casa de parentes ou em instituições, o importante é evitar o isolamento. "É essencial conviver com a família, na igreja, com grupos de terceira idade etc.", ressalva Schneider. "Isso faz com que se sintam úteis, queridos e gera menor risco de depressão e degeneração cognitiva", completa.




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