São Paulo, domingo, 16 de maio de 2010

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2006

A Copa imita a vida

Classificação final na Alemanha reflete momento político das forças europeias

ESPECIAL PARA A FOLHA

Poucas vezes os estreitos vínculos entre futebol, política e economia, que sempre acompanharam as Copas do Mundo, foram tão evidentes como em 2006. O torneio na Alemanha serviu para comprovar internacionalmente a capacidade gerencial e financeira do país.
A competição permitiu aos alemães expiar a chamada "grande culpa nazista" e mostrar ao mundo sua face moderna. As manifestações patrióticas, banidas no pós-Guerra, reapareceram de forma espontânea e sem ranços do passado.
O jogo ofensivo da seleção anfitriã resultou no melhor ataque e no artilheiro da Copa -Klose, com cinco gols.
No caso da campeã Itália, os vínculos, embora de outra natureza, não eram menos claros.
À imagem de seu governo corrupto, vários dirigentes e jogadores da Azzurra passavam por investigação judicial devido ao escândalo de jogos manipulados no campeonato nacional.
À imagem do racismo de parte significativa da sociedade, Materazzi provocou a célebre cabeçada de Zidane ao ofender suas raízes não europeias. Em 2010, o zagueiro declararia que no país os criminosos "quase nunca são italianos", mas sim imigrantes contra os quais deveria existir a pena de morte.
À imagem de uma nação ainda cheia de traços fascistas, o vice-presidente do Senado italiano louvou, após a vitória na final contra a França, a conquista do título mundial em cima de uma equipe de "negros, muçulmanos e comunistas".
O Brasil não ficou imune ao clima político. No futebol e na política, interesses pessoais e de pequenos grupos se sobrepunham aos interesses do país.
O presidente da CBF, Ricardo Teixeira, pensava mais nas finanças de sua instituição do que na preparação do time. Argumentou depois que desconhecia os desmandos que levaram ao fracasso da seleção.
O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, pensava mais nos ganhos de seu partido do que nos ganhos do país. Argumentou depois que não sabia do mensalão.
Nunca na história recente deste país houve corrupção tão ampla e orquestrada e despreparo tão grande para uma Copa do Mundo. Nos dois planos, o Brasil se africanizou.
De fato, a qualidade dos atletas da África negra é reconhecida, mas não se impõe em suas seleções devido ao enquadramento institucional deficiente.
No mundo crescentemente mercantilizado do esporte, a habilidade dos futebolistas é apenas uma das variáveis em jogo. Assim, a Comunidade Europeia ocupou todo o pódio.
A terceira colocada foi a Alemanha, país mais populoso e de maior PIB do bloco. A França, vice-campeã, é o segundo maior território e população e o terceiro PIB. Já a campeã Itália é o terceiro país em população e o quarto lugar em PIB.
A África apresenta economia 20 vezes menor. Dos 16 jogos disputados, venceu três. E apenas um sobre um país da União Europeia -Gana ganhou da República Tcheca por 2 a 0.
(HILÁRIO FRANCO JÚNIOR)


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