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Anistia teme xenofobia generalizada após ataques
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
As possíveis reações de intolerância após o ataque terrorista
nos Estados Unidos podem atingir não apenas pessoas de origem
árabe e muçulmanos.
"É uma crise internacional que
pode criar sentimentos de xenofobia e intolerância contra todos
que não sejam europeus ou americanos", afirma o italiano Claudio Cordone, diretor de pesquisas
da Anistia Internacional, entidade
com sede em Londres que monitora o desrespeito aos direitos humanos desde 1961.
Na quinta-feira passada, a entidade divulgou nota em que se diz
preocupada com a possibilidade
de que retaliações ao ataque terrorista desrespeitem os direitos de
vítimas inocentes.
Cordone falou à Folha, por telefone, do escritório da Anistia em
Londres. Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.
Folha - Qual a principal preocupação da Anistia?
Claudio Cordone - Primeiro, é
preciso dizer que o que aconteceu
nos EUA foi um imenso e catastrófico desrespeito aos direitos
humanos. Feita essa ressalva, estamos preocupados com retaliações contra muçulmanos e pessoas de origem árabe. Estamos
apelando a todos, incluindo governos, para ter certeza de que
pessoas inocentes estarão protegidas contra a violência. Novas
formas de discriminação podem
surgir como resultado das emoções causadas pelo ataque.
Já começamos a receber relatos
de violência contra esses grupos,
que são associados pela opinião
pública aos que, provavelmente,
atacaram os Estados Unidos.
Folha - Quais relatos?
Cordone - Eles ainda são muito
recentes, mas nosso escritório na
Austrália nos relatou insinuações
de que refugiados do Afeganistão
que estavam num barco a caminho da Nova Zelândia teriam ligações com Osama bin Laden. É um
absurdo fazer essas afirmações
sem dar chance às pessoas de falar
sobre sua própria situação. Soubemos de um caso de um indiano
preso em um aeroporto nos EUA
porque usava um turbante e foi
confundido com um árabe. É triste ver pessoas agindo de forma
preconceituosa e ignorante.
Folha - Há uma grande pressão da
opinião pública dos EUA exigindo
reações fortes do governo. Os srs.
apoiariam ações militares?
Cordone - A Anistia não comenta se ações militares são justificáveis ou não, mas insistimos que,
se alguém cogita agir dessa maneira, deve garantir o respeito às
leis militares, para termos certeza
de que civis não serão atacados.
Queremos que os norte-americanos sintam o luto por suas vítimas sem vitimar outros inocentes. Ainda não sabemos quem fez
esses ataques. É muito perigoso
atribuir culpas coletivas a comunidades, países, religiões. Quando
isso acontece, todos podem ser vítimas. Nosso apelo é para que não
revidem contra os que não têm
nada ver com esse ataque.
Folha - A intolerância será restrita a árabes e muçulmanos?
Cordone - Qualquer um pode ser
alvo. Essa é uma crise internacional, e as reações podem afetar todo mundo de várias formas. Pode
crescer o sentimento de xenofobia ou intolerância contra todos
que não sejam norte-americanos
ou europeus, não importando se
vêm de Belize ou do Brasil.
Folha - De que forma os srs. pretendem conscientizar o governo e a
opinião pública norte-americana?
Cordone - Desejamos que os Estados Unidos estejam sempre à
frente da defesa dos direitos humanos. Os EUA têm uma influencia muito grande no mundo e podem ter impacto sobre a política
de direitos humanos de outros
países. Queremos que o país cumpra seu papel, apesar dos ataques.
Também é importante ver a dimensão humana desse desastre e
refletir sobre outras crises em todo o mundo, onde inúmeras pessoas estão morrendo, mas não recebem atenção porque não vemos
o aspecto humano disso. Esperamos que o sofrimento da destruição nos EUA encoraje as pessoas a
pensar sobre outras crises, que
não são vistas na TV nem as afetam diretamente.
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