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ANÁLISE
Queira ou não, Brasil entrará na guerra
ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O Brasil vai entrar na guerra, querendo ou não. Não
necessariamente com tropas, pois
não é um país bélico, mas pagando duplamente o preço: perdendo
investimentos externos e sofrendo os efeitos da recessão, mas ao
mesmo tempo sendo obrigado a
investir em segurança.
A avaliação é de diplomatas brasileiros ouvidos pela Folha, ratificando a advertência do chanceler
Celso Lafer de que "o mundo mudou" após os atentados nos EUA.
O funcionamento do sistema internacional e o eixo diplomático
não são mais os mesmos.
Como disse ele em reunião de
FHC com o comando do Congresso para discutir os efeitos dos
atentados, a agenda do Itamaraty
dá uma guinada radical: em vez
de negociações comerciais e implantação da Alca, a prioridade
passa a ser segurança. Os EUA estão criando um mundo dividido
entre "amigos e inimigos".
De um lado, o Brasil já convivia
com fortes ajustes orçamentários.
Aprofunda-se agora uma tendência sincronizada de recessão econômica. O crédito tende a sumir, e
a insegurança econômica, a aumentar dramaticamente.
De outro, os EUA conclamam
os "amigos" a participar do seu
esforço para combater o terrorismo. A expressão "amigos" foi
usada por Bush num dos primeiros discursos depois dos atentados e repetida depois em nota oficial da embaixada americana em
Brasília. Não por acaso.
Na leitura do Itamaraty, esse esforço significa uma concentração
de recursos extraordinários no
combate ao crime organizado, à
lavagem de dinheiro, ao contrabando e ao tráfico de drogas, que
os norte-americanos identificam
diretamente com o terrorismo.
A globalização tem até agora parâmetros macroeconômicos, como inflação, déficit público, crescimento. Tem ainda regras de segurança internacionais prática e
ironicamente restritas ao controle
de vôos e espaço aéreo e à fiscalização de passageiros.
A tendência é o estabelecimento
de novos padrões e regras de fronteiras, de vigilância. Algo que um
diplomata traduziu como os EUA
"exportando" suas regras de
combate ao terrorismo.
Isso envolve pesados recursos
financeiros, materiais e humanos,
mas pode ser uma contrapartida
de países como o Brasil para escapar de mandar tropas, mesmo
que simbolicamente, em caso de
deflagração de guerra.
Por enquanto, os EUA cobram
um engajamento político, mas
depois vão querer mais, que o
Brasil "mostre serviço", disse um
diplomata.
Além disso, há questões pontuais que devem afetar o país: o
petróleo, por exemplo. Apesar da
cautela americana em apontar
países ou grupos como responsáveis pela tragédia, os holofotes se
voltam ao Oriente Médio.
Nos últimos anos, o Brasil valorizou o fornecimento da Argentina e da Venezuela, mas não escapará de uma alta do preço, caso a
retaliação recaia sobre os árabes.
Há, ainda, a questão do câmbio,
a freada no turismo, o novo impacto sobre as companhias aéreas
e a incerteza das Bolsas, que reabrem amanhã com papéis americanos, numa espécie de teste.
Ainda na avaliação da diplomacia brasileira, os atentados deixaram os EUA frágeis e expostos
nos primeiros dias, mas vão servir
como instrumentos para ratificar
sua hegemonia. Mais do que nunca, eles dão as cartas.
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