São Paulo, domingo, 17 de junho de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ARTIGO

Ídolos e heróis

RONALDO HELAL
ESPECIAL PARA A FOLHA

O ESPORTE, como fenômeno massivo, não se sustenta sem ídolos. Eles atraem as pessoas, estimulam o gosto e chamam a atenção até para modalidades menos populares.
Uma diferença entre ídolos do esporte e de outros universos, como a música, os torna ainda mais fundamentais como catalisadores de atenções. Ídolos esportivos são heróis, devido ao aspecto de luta que permeia seu universo. Ambos, ídolos do esporte e da música, tornam-se celebridades, porém só os do esporte são inexoravelmente considerados heróis.
Edgar Morin, em "As Estrelas de Cinema", chama a atenção para a diferença entre celebridade e herói. Enquanto o primeiro pode viver só para si, o herói deve compartilhar seus feitos com a sociedade.
Assim, no esporte, a vitória de um atleta é sempre a vitória de seu time ou de sua nação.
Quando, por exemplo, Ayrton Senna vencia e subia ao pódio com a bandeira do Brasil, sua proeza era compartilhada com os brasileiros. O mesmo se aplica a feitos em eventos como o Pan. Existe um caráter altruístico nos feitos esportivos, independentemente das idiossincrasias de cada atleta.
Esta característica heróica os transforma em paradigmas de anseios sociais e desperta o interesse da mídia, que trava relação dialética entre o noticiário, as ações do "objeto mitificado" _o atleta capaz de exercer fascínio_ e o contexto social.
A mídia não produz ídolos esportivos como bem entende. Os "constrói" privilegiando certos feitos e relegando outros a um plano secundário. Porém, a eficácia da "construção" está relacionada aos feitos do atleta.
Após a morte de Senna, mídia e sociedade se sentiram órfãs do ídolo e saíram em busca de outro. Tentou-se "construir" uma narrativa heróica em torno de Barrichello. Ainda que este fosse simpático e atencioso com a imprensa, a "construção" foi em vão. O que importa são as conquistas e a partilha destas com a comunidade.
Nas biografias de heróis geralmente são enfatizadas dificuldades na infância. Elas são verdadeiras. Mas o fato de a mídia enfocá-las contribui para a identificação dos fãs. No Brasil, isto é mais evidente, já que a maioria dos atletas vem de camadas menos favorecidas. Umberto Eco, em "Apocalípticos e Integrados", analisa o fascínio que o Super-Homem exerce e conclui que este reside no fato de que ele sai das vestes de um homem comum, Clark Kent, um sujeito atrapalhado, que não consegue ter sua amada.
No Pan teremos a chance de observar narrativas midiáticas em torno de nomes consagrados, que terão que demonstrar que continuam por merecer seu posto, e de "homens comuns", alçados à condição de "herói", em relação dialética entre mídia e os feitos do atleta.
A sociedade se mobiliza nestes momentos. Esportes menos conhecidos podem chamar a atenção e, dependendo da performance dos atletas, ganharem novo alcance.

RONALDO HELAL é professor da Faculdade de Comunicação Social da UERJ


Texto Anterior: Estudo de caso: Ginástica acha possível evitar ‘efeito Guga’
Próximo Texto: Monopólio estatal
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.