São Paulo, segunda-feira, 20 de setembro de 2004

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No Rio, acordo cria vagas para vigias de cavalete

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

O acordo entre o Tribunal Regional Eleitoral do Rio e os partidos para não poluir a capital do Estado com faixas e banners em locais públicos, além de deixar as ruas mais limpas, trouxe outra conseqüência para a campanha eleitoral carioca: incrementou o mercado de trabalho informal de pessoas cuja única função é ficar horas sentadas ao lado de um cavalete com propaganda política.
Apesar de ser permitido pela legislação eleitoral em vigor, o tribunal e os partidos no Rio fizeram um acordo para não afixar faixas e cartazes em postes, viadutos, passarelas e demais locais públicos. Sem a opção de fixar cartazes por toda a cidade, a solução encontrada pelos candidatos, principalmente ao cargo de vereador, foi contratar essa "militância" paga.
Na quarta-feira passada, às 13h, a Folha contou, apenas na orla de Copacabana (zona sul do Rio), 79 pessoas que ganhavam diárias que variam de R$ 10 a R$ 30 para tomar conta de cavaletes ou segurar faixas e bandeiras de candidatos. Na avenida Dom Helder Câmara (zona norte), eram 29.
À primeira vista, a contratação desse serviço pode parecer um caso típico de exploração eleitoral de uma população alienada. Uma conversa com esses "militantes" mostra, porém, que a maioria, assim como os marqueteiros que trabalham em campanhas, separa a parte profissional da ideologia.
"Estou fazendo um serviço como outro qualquer, mas não vendo o voto de jeito nenhum", diz Gisele Ferreira Santana, 16, que ganha R$ 60 por semana para tomar conta do cavalete de um candidato na zona sul. Ela conta que, antes de aceitar o trabalho, pesquisou para ver quem paga mais.
O segurança Anderson dos Santos, 20, teve mais sorte do que Gisele. Achou um candidato disposto a pagar R$ 30 por dia. Ele afirma, porém, que o trabalho não vai influenciar seu voto. "Não pretendo votar nele, até porque, lá em casa, a gente sempre faz um debate para escolher o candidato", diz.
A manicure Ivana Ramos, 32, tem a mesma posição. "Eles [os coordenadores da campanha] me pagam direitinho, providenciam meu transporte e me dão um tíquete-refeição, mas ninguém me pediu para votar nesse candidato", diz ela, que recebe R$ 50 por semana, para agitar bandeiras e, eventualmente, ir a passeatas.
O aumento da contratação dessas pessoas é explicada pela legislação eleitoral, que permite apenas que esses cavaletes sejam colocados em locais públicos desde que não atrapalhem a locomoção de pedestres e que sejam móveis. Para isso, é preciso que uma pessoa esteja sempre ao lado de um cavalete, para não caracterizar, aos olhos dos fiscais do TRE, que se trata de uma propaganda fixa.
A candidata a vereadora Andrea Gouvêa Vieira (PSDB), que diz usar 40 cavaletes e dividir a "militância" em dois turnos, cobra profissionalismo. "As pessoas vão lá para trabalhar. É um trabalho como outro qualquer. Às vezes, temos problemas com os que abandonam o cavalete na rua."
A candidata Dalva Lazaroni (PV), uma das que mais usa esse tipo de serviço no Rio, estima que contratou entre 250 e 300 pessoas para tomar conta dos cavaletes.
O uso desses serviços não é unânime. O vereador Eliomar Coelho (PT), que tenta a reeleição, critica a prática. "Condeno este negócio. Acho meio desumano pagar R$ 20 por dia e obrigar a se submeter a este trabalho humilhante", diz.


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