do enviado especial a Lisboa

Um grupo de jovens passeia numa tarde ensolarada pela região de Lisboa em que foi realizada a Expo-98, conjunto arquitetônico que se transformou numa espécie de monumento do orgulho moderno de Portugal. O jornalista apresenta-se e pergunta: "Vocês sabem quem descobriu o Brasil?".
Silêncio.
"Sabem ou não sabem?"
"Teria sido o Américo Vespúcio?", arrisca Yardena Silva, 17, estudante da 11ª série.
Não teria, embora o Novo Mundo tenha recebido seu nome, e ele mesmo percorrido a costa brasileira depois de Cabral.
Ainda há tempo para uma nova tentativa. Desta vez ela vem na mosca: "Já sei, foi Pedro Álvares Cabral", lembra-se o sorridente Pedro Teixeira, 17, ajudado, ele admite, por carregar o mesmo nome do descobridor.
Não muito longe, um outro grupo, de três meninos, todos com 14 anos, diverte-se ouvindo rap e quizomba (ritmo africano) num daqueles ruidosos aparelhos portáteis. O jornalista faz a mesma pergunta e ouve o mesmo silêncio.
Mas Moisés Sá, o simpático negro do grupo, resolve dar seu palpite: "Foi Vasco da Gama". Instantaneamente, ele mesmo percebe o equívoco: "Não, não, esse foi o do caminho marítimo para as Índias...".
Moisés e seus amigos Dálio Sá e João Paulo Ricardo estudam na escola pública Damião de Góes, no bairro de Chelas. A tese do professor Arlindo Caldeira (veja texto na página ao lado) parece estar comprovada. Todos disseram que aprenderam na escola o nome do descobridor do Brasil, mas num total de dez adolescentes, apenas um lembrou-se de Cabral.
Por aqui, também, há lacunas importantes: 24% dos brasileiros entrevistados no Rio pelo Datafolha erraram ou disseram que não sabiam o ano da descoberta de seu próprio país. Mais da metade não soube dizer quem foi Pero Vaz de Caminha, o escrivão, autor do mais conhecido relato sobre a terra encontrada. Além disso, 42% desconhecem porque, afinal, o Brasil recebeu esse nome. Mais portugueses (18% contra 14%) souberam responder que dom Manuel 1º era o rei de Portugal à época do descobrimento.
Mais brasileiros, porém, responderam certo à pergunta sobre o personagem que proclamou a Independência. Só 23% dos portugueses cravaram dom Pedro 1º (ou dom Pedro 4º, em Portugal). No Rio, 52% acertaram -o que está longe de dignificar o conhecimento histórico básico da população.
Quem é o presidente de Portugal? Apenas 1% dos brasileiros souberam dizer Jorge Sampaio. E o do Brasil? 31% dos lisboetas responderam Fernando Henrique Cardoso (a pesquisa foi realizada antes da viagem de FHC a Portugal, no fim-de-semana passado).
"Há, de fato, hoje em dia, um problema sério de memorização. Não se memoriza mais nem tabuada na escola", diz Laura de Mello e Souza, professora do departamento de História da Universidade de São Paulo. "As dificuldades para responder acertadamente refletem a crise educacional, que não ocorre apenas no Brasil", diz.


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