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Jordânis busca ser uma ponte para paz
do enviado especial ao Orinete Médio
O rei Hussein, 42º herdeiro direto do profeta Maomé, já se ajoelhou diante de sete famílias israelenses, com pedidos de perdão. O
seu irmão e príncipe-herdeiro,
Hassan, se debruçou no estudo do
idioma do país vizinho e hoje fala
hebraico.
As atitudes da família real jordaniana espelham uma decisão estratégica e um esforço político. O
país, em 1994, transformou-se no
segundo do mundo árabe a assinar um acordo de paz com Israel,
15 anos depois do pioneiro Egito,
quando o rei Hussein decidiu que
a pacificação constituía um dos ingredientes indispensáveis para a
manutenção da dinastia Hashemita no trono.
O monarca busca estabilidade
para um país que, com os êxodos
causados pelas sucessivas guerras,
se tornou o maior recipiente de refugiados palestinos. São 1,28 milhão de pessoas. Atualmente, quase 50% da população jordaniana é
de origem palestina.
O medo de ser tragado pela onda
palestina levou Hussein a promover o tristemente célebre Setembro Negro, quando, em 1970, as
forças jordanianas massacraram
cerca de 3.000 palestinos. O monarca optou por cortar pela raiz a
então crescente ameaça a seu reinado.
Na lista de erros históricos, o rei
jordaniano registra ainda o apoio
ao Iraque de Saddam Hussein na
Guerra do Golfo, em 1991. A monarquia tinha medo da máquina
militar iraquiana e avaliou também que os seus interesses econômicos apontavam na direção de
Bagdá.
Alianças refeitas, o rei Hussein
calculou que a maneira mais eficaz
de lidar com a questão palestina e
enfrentar o fantasma do fundamentalismo islâmico, uma tendência em expansão nos campos
de refugiados, era arrancar a paz
com Israel e avançar rumo a um
Estado palestino.
Para enfrentar a pobreza, outro
terreno fértil para os religiosos extremistas, a Jordânia, um dos poucos países árabes desprovidos de
recursos naturais como petróleo,
embarcou na chamada "modernização". O termo pode ser traduzido por liberalização na economia, privatizações e abertura ao
investimento estrangeiro.
Populismo
O rei personifica a imagem de
um regime autoritário facilmente
palatável para o Ocidente, o que
facilita sua aproximação com os
EUA. Ele se casou com a rainha
Noor, uma fotogênica loira norte-americana, fala inglês com um
sotaque menos carregado do que
seus colegas da região e, segundo a
maioria esmagadora dos relatórios feitos por embaixadas ocidentais em Amã, trata-se de um governante "popular".
Em Baka"a, o maior campo de
refugiados palestinos de Amã, o
retrato do rei aparece pendurado
em postes e muros. Sua imagem
também decora uma das salas da
clínica pediátrica da UNRWA, a
agência da Organização das Nações Unidas para refugiados.
"A Jordânia nos acolheu bem",
afirma Suhiel Jarah, 38, que nasceu em Baka"a. Sua família deixou Hebron, na Cisjordânia, em
1948, quando da primeira guerra
árabe-israelense, vagou durante
alguns anos pela região e se estabeleceu no campo em 1959, pouco
antes de Suhiel nascer.
Hoje, o palestino Suhiel carrega
o passaporte jordaniano e diz que
seu primeiro contato com israelenses foi no emprego. Ele trabalha como porteiro no Hotel Jerusalém-Amã, um dos cinco estrelas
da capital jordaniana.
"Eles são simpáticos e não guardo raiva", fala Suhiel, enquanto
beberica Coca-Cola em casa para
enfrentar o calor. Recebe as visitas
no seu quarto, decorado apenas
com os colchões de dormir, um
ventilador e um coelho de pelúcia
que ele segura durante a conversa.
A inesperada entrada dos visitantes surpreendeu a mulher de
Suhiel no quintal e, seguindo a
tradição, ela recolheu-se ao segundo quarto da modesta casa de alvenaria. Os cinco filhos, entre eles
duas meninas, vieram cumprimentar os estrangeiros.
A hospitalidade árabe também
marcou uma recepção ao rei Hussein num dos momentos de mais
aguda crise entre Israel e a Jordânia. No ano passado, um soldado
jordaniano com problemas mentais descarregou seu fuzil M-16
contra um grupo de escolares israelenses e matou sete meninas.
O monarca viajou a Israel, visitou as famílias e se ajoelhou diante
delas, em pedidos de desculpas
pela tragédia. Num apartamento,
o rei Hussein foi recebido à porta
pelo avô de uma das meninas assassinadas, que segurava uma
bandeja com pão e sal, um símbolo de boas-vindas.
Nurit Fatihi, um judeu do Iêmen, ofereceu ainda ao rei uma
oração especial para monarcas,
extraída das tradições da Cabala
(uma espécie de misticismo judaico). O visitante respondeu na língua materna do anfitrião, o árabe:
"Sua filha é como uma filha minha, a sua perda é uma perda minha. Possa Deus ajudá-lo a suportar a dor".
O rei Hussein também cultiva
popularidade junto a assessores de
Netanyahu. Dore Gold, um conselheiro do premiê, já descreveu o
monarca como "uma ponte entre Israel e a liderança palestina
em momentos críticos".
Segundo Gold, o rei Hussein
chegou a, num dos vários cenários
de crise israelo-palestina, telefonar para Iasser Arafat e entregar o
aparelho a Netanyahu, forçando
uma conversa.
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