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SP 450
Posições extremadas sobre aborto e maconha surpreendem estudiosos
DA REPORTAGEM LOCAL
Um dos aspectos que mais
atraíram a atenção das pessoas
ouvidas pela Folha a respeito dos
resultados das chamadas "questões morais" da pesquisa Datafolha foi a queda abissal no índice de
moradores de São Paulo que
apóiam a legalização do aborto.
Saiu de 43% em 1994, quando a
maioria da população se declarava a favor da descriminalização,
para 21% em 1997, já em segundo
nas opções, para apenas 11% na
pesquisa atual -ou diferença de
32 pontos percentuais em relação
ao primeiro levantamento.
"Só posso pensar que se trata de
um ataque coletivo de hipocrisia",
diz o sociólogo Antônio Flávio
Pierucci, da USP. "As pessoas estão consumindo drogas loucamente, tendo relações de curto
prazo e não estão casando mais
segundo o último Censo, e vão ser
contra o aborto?", pergunta.
Para Pierucci, ser contra o aborto a essa altura é ser "contra a liberdade e a autonomia sobre o
corpo feminino".
A opinião do cientista político
Eduardo Kugelmas, da USP, vai
mais ou menos no mesmo sentido. "Em termos gerais, o resultado da pesquisa confirma uma
opinião empírica da vida cotidiano de que há mais conservadorismo, principalmente na questão
da segurança", disse ele.
Mas Kugelmas achou os resultados relacionados à legalização do
aborto e da maconha surpreendentes. "Confesso que tinha impressão que as coisas tinham evoluído nessa área", disse.
Outra característica a se ressaltar foram os extremos de algumas
das perguntas mais polêmicas.
Perdizes/Pinheiros, por exemplo,
tem o maior índice de aprovação
da descriminalização da maconha
(27%, ante média geral de 15%).
"No momento, sou contra a legalização, mas sou exceção e vejo
que o clima entre os estudantes é
favorável", disse à Folha a terceiranista de Direito Joyce Oliveira,
20, da PUC-SP, o centro nervoso e
intelectual do bairro de Perdizes.
Já Vila Maria/Tucuruvi dispara
na aprovação da adoção da pena
de morte no Brasil (67%, ou oito
pontos percentuais acima da média geral). É essa a opinião de Anthony, o Mágico, que mantém seu
escritório na Vila Maria Alta.
"Não defendo para todos os casos, não, mas acho que inibiria o
pessoal na hora de cometer um
crime mais grave como estupro."
Mas o caso mais curioso talvez
seja o de Itaquera/Guaianazes. Está aqui a posição mais liberal em
relação à pena capital: 44% dos
ouvidos são contra, ante média
geral de 37%. A região abrange
entre outras a Cidade Tiradentes.
O que levaria este bairro que alterna conjuntos habitacionais de
poucos recursos com os piores indicadores sociais da cidade e alta
incidência de tráfico a rejeitar em
peso a pena capital?
É do centro dele que vem uma
das possíveis explicações, pela boca de Paulo Rogério dos Santos,
coordenador da ONG Pueras, que
ensina preservação ambiental para 60 adolescentes da região.
"É autopreservação pura", afirma. "Quem respondeu que é contra a pena de morte são os pais
dos adolescentes que vivem nas
ruas daqui e acabam cooptados
pelo tráfico. Eles temem que,
aprovada a lei, seus filhos sejam
os primeiros condenados."
(SÉRGIO DÁVILA)
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