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São Paulo exclui o Tietê, mas aceita o Pinheiros
Rio Pinheiros têm áreas nobres ao seu redor; já o Tietê, parece um estorvo
EVANDRO SPINELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Diz uma piada que o rio Tietê
tem tanto medo de água que ele
foge do mar.
São Sebastião, no litoral norte paulista, fica a menos de 25
km da nascente do Tietê, em
Salesópolis, mas ele "preferiu"
correr para dentro do Estado
até desaguar, 1.136 km depois,
no rio Paraná, na divisa de SP
com MS. Por isso, foi apelidado
de "rio teimoso".
A teimosia do Tietê poderia
ser vista como um privilégio
para a cidade de São Paulo, cortada de leste a oeste por um dos
mais importantes rios do país.
Mas a cidade despreza o Tietê.
Até o Pinheiros, afluente do
Tietê e tão fétido quanto, é mais
integrado à cidade.
Às margens do Pinheiros
passa uma linha de trem, está
sendo feita uma ciclovia e estão
alguns dos hotéis mais elegantes da cidade.
No rio Pinheiros fica o mais
novo cartão-postal da cidade, a
ponte Octavio Frias de Oliveira.
A paisagem já foi servida até ao
então presidente dos EUA,
George W. Bush, que via de seu
quarto de hotel a ponte e o rio.
Algumas das regiões mais nobres de São Paulo estão ali, bem
próximas do Pinheiros. Algumas das mais importantes
agências de propaganda do país
também. Sem falar dos shoppings de luxo -Daslu e Cidade
Jardim, por exemplo-, templos de consumo da elite.
E o Tietê? Ao contrário de integrar-se à cidade, mais parece
um estorvo. Entre a Lapa e a
Penha é quase considerado um
obstáculo indesejado à expansão das vias expressas que passam por ali. Chegou-se a sugerir cobrir o rio com uma laje para os carros passarem.
No extremo leste da cidade,
onde não há avenidas em suas
margens, o rio disputa espaço
com moradores que vivem praticamente todo o verão em
áreas alagadas. O rio, como é
óbvio, sempre ganha a briga e
se torna indesejável.
"A relação que o paulistano
tem com a água é a água da torneira. Mas onde tem mais água
é no rio. O paulistano não olha
os seus rios. E se olha, não vê,
não os enxerga", diz a arquiteta
urbanista Jenny Zoila Baldiviezo Perez, professora da FMU.
Em sua tese de doutorado, de
2004, Perez mostra que a região do Pinheiros se desenvolveu mais que a do Tietê por razões que remontam à década de
1920, quando começou o projeto de correção dos cursos dos
rios. A arquiteta explica que o
projeto de retificação do Tietê
ficou a cargo da prefeitura, que
optou por desapropriar apenas
as áreas do próprio leito do rio.
Já no Pinheiros, o projeto foi
feito pela Light, em uma das
primeiras concessões públicas
da cidade. A empresa, então,
preferiu desapropriar praticamente toda a área da várzea e,
ao longo das décadas, os terrenos foram sendo revendidos.
O resultado, diz a arquiteta, é
que a área do Pinheiros adquiriu um parcelamento urbano
do século 20 e a do Tietê permaneceu com o território ocupado como no século 19, mas
com uma avenida no meio.
O processo de retificação do
traçado do rio Pinheiros durou
cerca de 20 anos -entre as décadas de 1920 e 1940. A Light
mudou o curso do rio para jogar
água para a serra do Mar e, lá,
instalou uma usina de energia.
Reurbanização
A empresa aproveitou o projeto para adquirir um estoque
de terras que seriam valorizadas ao longo do tempo. Os vazios urbanos criados na região
propiciaram uma reurbanização da área que tiveram seu auge no boom imobiliário dos
anos 1980 e 1990.
Já a retificação do Tietê foi
mais longa. As negociações para desapropriação de áreas começaram nos anos 20, mas as
obras só foram concluídas na
década de 1980, com a obra do
Cebolão -complexo viário que
liga as rodovias Anhanguera e
Bandeirantes com a marginal.
Como a prefeitura limitou as
desapropriações à área projetada do rio, não houve uma reurbanização. Na região mais central, os terrenos ficaram com os
antigos proprietários e, na
maioria, já estavam ocupados.
No extremo leste, as áreas foram ocupadas ao longo do tempo, devido à expansão urbana e
ao crescimento populacional.
Agora, a batalha é retomar a
importância urbana do rio Tietê. Dificilmente ele terá a mesma que o seu afluente Pinheiros, mas ainda pode ser uma
área de lazer.
"Se tivermos uma travessia
sobre o rio que permita às pessoas visualizar o skyline do Tietê, já vai ser um grande ganho",
diz Perez. "A gente vê nesses
dois rios potencialidades muito
grandes e eles ainda podem
oferecer muito à cidade. Basta
lembrar que eles já foram muito importantes em termos de
lazer e de esportes."
Um embrião da integração
do rio com a cidade é projetado
no futuro parque Várzeas do
Tietê, que irá da Penha a Salesópolis. As obras começaram
na zona leste, onde terá equipamentos para esportes e lazer.
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