|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
Dilma planeja desenvolvimento à custa de financiamento público
Binômio de Brasil potência política incerta , com demanda sem precedentes por cargos no governo , será característica inicial de uma eventual administração da petista
OBJETIVA NO COMANDO, DILMA É UMA COBRADORA IMPLACÁVEL. DISTRIBUI TAREFAS E DEMANDA RESULTADOS
FERNANDO RODRIGUES
DE BRASÍLIA
Se vencer, o Brasil de Dilma Rousseff (PT) terá uma
marca desenvolvimentista à
custa de financiamento público. Ao mesmo tempo, conviverá com um cenário inusitado na política: ampla base
de apoio e demanda sem precedentes por cargos e participação no governo.
Esse binômio de Brasil potência e política incerta será
a característica inicial de
uma eventual administração
Dilma. Há uma miragem propagada por petistas e aliados
do presidente Lula a respeito
do ambiente favorável a ser
encontrado no Congresso no
ano que vem. Para os dilmistas, esse cenário garantiria
tranquilidade nas relações
com os congressistas.
De fato, a bancada de deputados e senadores filiados
a partidos aliados ao PT e ao
projeto Dilma será sem precedentes para um presidente
no dia da posse. Todos os
ocupantes do Planalto eleitos pelo voto direto tiveram
de construir maiorias a partir
da eleição. Já a petista tem
uma coalizão prévia.
PARTILHA DE CARGOS
Na prática, entretanto, a
situação não é tão cartesiana. Além de os partidos não
controlarem seus deputados
e senadores, há logo no início de qualquer governo
duas batalhas a serem vencidas pelo presidente da República. Primeiro, acomodar a
todos os aliados na Esplanada. Segundo, arbitrar as disputas pelas presidências da
Câmara e do Senado, um momento de fricção já clássico.
Na partilha dos 37 ministérios, vários partidos hoje
aliados ao Planalto desejarão uma recompensa pelo
apoio antecipado concedido
a Dilma. O PMDB pleiteará
mais espaço -afinal, embarcou no projeto petista na primeira hora. O PSB sempre ficou com pastas de menor importância, mas também é dilmista desde o princípio, tendo removido Ciro Gomes da
eleição a mando de Lula.
Dilma terá de conciliar esses interesses com um outro
(revelado a poucos) de reduzir o número de ministérios
ao tomar posse. Seria uma
forma de mitigar sua imagem
de uma administradora a favor de um Estado inchado.
A equação tem solução difícil: acomodar o apetite por
cargos com a eventual redução do número de ministérios. A conta poderia não fechar. Só na coalizão dilmista
há dez partidos, o principal
deles sendo o PT. Na campanha, o ex-deputado e ex-ministro José Dirceu vocalizou o que representa a eleição de Dilma. É a
chegada verdadeira do PT ao
poder. Lula era maior do que
a legenda. Com Dilma, ocorre o oposto. Não há como
mensurar a volúpia da agremiação por cargos, mas certamente será maior do que
nos dois mandatos de Lula.
Para tornar ainda mais
complexa essa engenharia
política, há do lado de fora da
coalizão dilmista alguns partidos médios como o PP e o
PTB. Estão dispostos a aderir. Em troca de cargos.
CONGRESSO
A fórmula matemática
usada para compor os ministérios terá de ser acoplada à
disputa dentro do Congresso. Os principais preteridos
nas eleições para presidir a
Câmara e o Senado podem
ser recompensados com cargos ministeriais.
O problema é a dessincronia entre a posse presidencial (1º de janeiro) e a dos
congressistas (1º de fevereiro). Há uma espécie de limbo
político de 30 dias entre uma
coisa e outra. Nesse período,
o novo presidente convive
com um "valle de los caídos"
do outro lado da Praça dos
Três Poderes -cerca de metade dos deputados e mais de
um terço dos senadores não
renovarão os mandatos.
VENTO FAVORÁVEL
O Brasil potência na cabeça de Dilma é o que colocaria
o país como a quarta maior
economia do planeta, atrás
apenas de Estados Unidos,
China e Japão. Quando está
com seus assessores mais
próximos, a petista fala do
vento favorável no exterior
para, a partir do ano que
vem, promover mais multinacionais brasileiras, incentivo a obras de infraestrutura
internas como metrôs em
grandes metrópoles e o trem-bala entre Rio e São Paulo.
Pela ênfase que dá a esses
projetos, a petista deixa
transparecer um desejo de ficar oito anos na cadeira. A
frase mais comum ouvida no
comitê de campanha é: "A
Dilma vai mandar muito".
Não está claro como será o
seu relacionamento com Lula a partir de 1º de janeiro.
Mas quem financiará todos esses projetos de desenvolvimento? O Estado, em
sua maior parte. Embora
existam análises sobre problemas estruturais no atual
modelo de crescimento a médio prazo (com crescentes
déficits externos e desindustrialização de alguns setores), Dilma recusa a tese de
fazer algum ajuste fiscal de
relevância na economia.
A petista repete um mantra. A inflação está controlada e a relação geral entre dívida e PIB está caindo. "Ajuste fiscal para quê?", pergunta. Por essa razão, acha possível mimetizar no Brasil o
momento de grande efervescência pelo qual passaram os
Estados Unidos na década de
50, pós-Segunda Guerra.
EXPLOSÕES
Objetiva no comando, Dilma é uma cobradora implacável. Distribui tarefas e demanda resultados. No Ministério das Minas e Energia e na
Casa Civil, pastas que chefiou sob Lula, suas planilhas
com anotações serviam de
guias em reuniões.
Quando o subordinado
não apresenta o que foi combinado, é comum haver explosões. Na época em que era
ministra das Minas e Energia, no primeiro mandato de
Lula, comandava uma reunião com cerca de 20 pessoas. A petista então cobrou
de um funcionário de baixo
escalão a informação sobre o
valor de uma inserção comercial de 30 segundos no
horário nobre da TV Globo.
O dado não estava disponível. Ela explodiu: "Assim
não dá. É um idiota. Eu pedi
isso há três dias". O constrangimento foi geral.
Durante a campanha, havia um temor no PT de que
Dilma pudesse demonstrar
de maneira muito explícita
esse seu lado mais duro. "A
imagem de que é pouco afável no trato pode dar trabalho. Não pode virar um Ciro
Gomes de saia. Até porque
ela é uma pessoa educada",
dizia no início do ano Fernando Pimentel, ex-prefeito
de Belo Horizonte e talvez
um dos mais influentes políticos no círculo de relacionamentos da petista.
Dilma rebate essas críticas. Usa como escudo o sexismo latente na sociedade.
"Sou uma mulher dura em
meio a homens meigos" é
sua frase irônica, com algumas variações, ao ser cobrada pelo comportamento às
vezes ríspido.
Pela campanha, a petista
passou incólume. Não houve
destempero registrado. Mas
na cadeira de presidente a
pressão é de outra natureza.
Texto Anterior: Em 2011, Lula terá que se reinventar pela quinta vez Próximo Texto: Campanha em 5 momentos Índice | Comunicar Erros
|