São Paulo, quinta-feira, 30 de setembro de 2010

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Campanha em 5 momentos

Após começo "sofrível", petista embalou ao emplacar tática de colar imagem à de Lula

VALDO CRUZ
DE BRASÍLIA
ANA FLOR
DE SÃO PAULO

Depois de um pontapé inicial considerado por aliados "sofrível e temerário", Dilma Rousseff (PT) tornou-se favorita ao seguir a risca os conselhos do comando de sua campanha. Mas chega à reta final correndo o risco de enfrentar um segundo turno por conta do escândalo envolvendo sua ex-braço direito, Erenice Guerra.
Sua principal virtude, dizem assessores, foi aceitar ser comandada e aprender os segredos de algo que nunca tinha feito antes: disputar uma eleição. Deu seus tropeços, enfrentou dois escândalos, mas não foi o fracasso previsto pela oposição.
Disposta a se moldar à figura de candidata criada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não quis deixar escapar a oportunidade que caiu no seu colo depois que as crises do primeiro mandato lulista derrubaram José Dirceu e Antonio Palocci.
A seguir, a trajetória da campanha da candidata:

1
QUANDO TUDO DAVA ERRADO
O pontapé inicial, em abril, foi desastroso. É praticamente uma unanimidade no comando de campanha que o pior momento de Dilma foi logo após deixar o governo. Foram semanas de erros contínuos da pré-candidata, pela primeira vez sem a proteção do cargo de ministra e da agenda oficial.
Logo na primeira viagem, a Minas Gerais, virou alvo dos tucanos por visitar o túmulo do presidente Tancredo Neves. Pior ainda, ficou em maus lençóis com o PMDB local ao admitir o voto que ficou conhecido como "Dilmasia" (dobradinha com Antonio Anastasia, do PSDB, para governador).
Nas palavras de um auxiliar da candidata, naquela fase "tudo dava errado para nós, ficamos presos à agenda criada pelo Serra, que acertava tudo". Hoje, a equipe da petista diz que, se aquele ritmo fosse mantido, a eleição estava perdida.
Até Lula deixou escapar comentários negativos sobre as roupas cheias de babados. O criador chegou a confidenciar a aliados que Dilma se vestia como uma "tia-avó".
Reflexo dos erros, não subiu nas pesquisas. Serra liderava com 40%, contra 29% de Dilma, em abril.

2
NO "JN", O DIA DA VIRADA
Em 10 de agosto, um dia depois de sua entrevista concedida ao "Jornal Nacional", a equipe de coordenação se reuniu em Brasília.
A avaliação foi unânime: se não cometessem nenhum erro grave, dificilmente perderiam a eleição. Um dos coordenadores, otimista, chegou a vaticinar: "Ganhamos a eleição ontem".
O otimismo vinha do desempenho da candidata diante de Fátima Bernardes e William Bonner. Ali, ela se expunha pela primeira vez, sem a proteção do marqueteiro João Santana, a uma entrevista dura, num telejornal de grande audiência.
Na avaliação de sua equipe, a entrevista foi o "símbolo da virada". Era o sinal de que, nos debates que estavam por vir, Dilma não teria dificuldades graves.
Logo depois, o Datafolha divulgou pesquisa em que ela aparecia pela primeira vez à frente do tucano José Serra, 41% contra 33%.

3
A EX-BRAÇO DIREITO VIRA "EX-ASSESSORA"
A pouco mais de duas semanas da eleição e subindo nas pesquisas, a campanha sofreu um revés. As acusações de tráfico de influência na Casa Civil derrubaram, em 17 de setembro, Erenice Guerra, a figura do governo mais identificada com Dilma.
Em reunião naquela manhã no Planalto, informado de que as pesquisas indicavam que o caso continha alto risco de contágio e poderia prejudicar Dilma, Lula decidiu demitir Erenice.
Antes mesmo da queda da ministra, Dilma revelou toda a tensão que o caso provocava. Chegou a evitar, em debate, dizer que punha a "mão no fogo" por Erenice e afirmou que não podia ser julgada por conta de "um filho de uma ex-assessora".
Assim como Lula rifou aliados próximos, Dilma abandonava Erenice para se manter viva na disputa.
Depois da queda de Erenice, o Datafolha apontou que a diferença entre Dilma e a soma dos adversários caiu de 12 para 7 pontos.

4
O FOGO AMIGO PETISTA
Antes do caso Erenice, outro escândalo gerou tensão na campanha. Fruto de uma disputa entre os grupos petistas de São Paulo e Minas, foi revelado que um grupo de inteligência havia sido criado no bunker petista, ainda antes da campanha oficial.
Uma das missões seria montar dossiês contra Serra e investigar petistas de SP.
A crise, em junho, fez a primeira baixa na campanha. Amigo de Dilma, Fernando Pimentel perdeu espaço e deixou a coordenação.
A saída abriu espaço para o crescimento da influência de Antonio Palocci, colocado por Lula na campanha.
Em seguida, a Folha revelou que papéis que circularam na pré-campanha de Dilma continham dados fiscais sigilosos do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge.
Mais tarde, descobriu-se que parentes de Serra também tiveram seu sigilo fiscal violado, entre eles Veronica Serra, filha do tucano.
Mas o escândalo não se refletiu nas pesquisas.

5
O ÍCONE E O CABELEIREIRO
A equipe do marqueteiro João Santana, a mesma da reeleição de Lula, conseguiu estabelecer a bem-sucedida estratégia de colar a imagem de Dilma à do presidente.
A estratégia mostrou sua força em maio, com o programa do PT em que Lula dizia que Dilma iria dar continuidade a seu governo.
A peça -em que Lula chega a comparar Dilma ao sul-africano Nelson Mandela- impulsionou a candidatura e a vantagem foi amalgamada no início do horário eleitoral.
O marketing foi além da TV. Dilma repaginou roupas e maquiagem, trazendo para sua órbita famosos como Alexandre Herchcovitch e Celso Kamura, e teve cada evento e fala planejados.
No auge da crise envolvendo Erenice, por exemplo, a campanha optou por coletivas em cidades menores, longe do que considerava a imprensa "mais dura" de Brasília e São Paulo.


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