São Paulo, quinta-feira, 30 de setembro de 2010

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Campanha em 5 momentos

Em meio a uma rota eleitoral turbulenta, tucano anota ideias em "bíblia" de 230 págs.

CATIA SEABRA
BRENO COSTA
DE SÃO PAULO

Ele descreve o presidente Lula como o "teflon da República". E foi sob essa ótica que o candidato do PSDB, José Serra, traçou sua rota para a corrida presidencial.
Certo de que "nada cola em Lula", poupou o presidente de ataques, reservando-os para a candidata petista, Dilma Rousseff (PT).
Esse exercício de equilíbrio rendeu abalos no mundo tucano, hoje minimizados pela expectativa de que ocorra segundo turno.
Leia aqui os principais momentos da campanha.

1
SE CONSELHO FOSSE BOM
Candidato de um partido marcado por disputas internas, Serra resistiu à convocação de um conselho político para a coordenação da campanha. "É pauta negativa".
Serra insinuou essa contrariedade ao senador Tasso Jereissati (CE), durante visita ao Ceará. "Não me avisaram sobre esse conselho. Vai ver que eu não faço parte."
Seu desconforto político vem de eleições passadas, como a de 2002, quando fatia do tucanato abandonou sua candidatura ao Planalto.
Já nesta campanha, Serra foi surpreendido ao saber, no dia seguinte, que a cúpula do partido tinha se reunido em São Paulo para avaliação crítica da disputa.
Outra surpresa para Serra foi a decisão do ex-governador de Minas Aécio Neves de anunciar, três meses antes do combinado, que desistira da disputa pela Presidência.
Serra e Aécio tiveram uma delicada relação. "Por favor, não me venha falar em prévias", chegou a apelar a Aécio, num encontro partidário ainda na pré-campanha.
A fissura pode ser expressa pela dispersão geográfica da campanha. Só em São Paulo, são seis escritórios.

2
SAÚDE É O QUE INTERESSA
"Olha uma farmácia. Não posso deixar de entrar...Os genéricos", justificou Serra durante uma caminhada.
Ex-ministro da Saúde, ele transformou obsessão em peça de marketing.
Tema recorrente do programa eleitoral, a saúde é destaque nos discursos. Serra abusa da fama de hipocondríaco até para descontrair.
"Alckmin tem várias vantagens sobre mim. Uma delas é que ele entende de medicina", brincou, num discurso.
A saúde também invade a rotina do candidato. Sofrendo de problemas gástricos, Serra nunca dispensa anti-ácidos e evita extravagâncias à mesa. Nada de álcool, queijo derretido e frituras.
Só toma refrigerante após mexer com uma colher até que fique sem gás. A dieta foi flexibilizada na campanha, quando, admite, seu peso "oscilou um quilo e meio".

3
PROGRAMA DE INDIO
"Vou dormir. Não tenho mais idade para isso", resmungou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Eram 23h45m do dia 29 de junho, véspera do prazo final para registro de candidaturas, e persistia o impasse em torno da escolha do vice.
Feito após uma maratona de reuniões -uma delas madrugada adentro- o comentário de FHC ilustra um dos momentos mais tensos da campanha de Serra.
Disposto a enfrentar o DEM e bancar a escolha do tucano Alvaro Dias, Serra foi obrigado a recuar quando Osmar Dias (PDT-PR), irmão do senador, decidiu concorrer ao governo do Paraná aliado a Dilma.
A negociação exigiu nova rodada de reuniões ao longo da madrugada. Passava das 2h, e diante do computador, Serra leu a ficha do deputado Indio da Costa (DEM-RJ).
"O Gonzalez acha o Indio da Costa uma boa opção", comentou Serra, segundo um dos participantes.
Enfim escolhido, Indio causou controvérsia ao acusar o PT de envolvimento com narcotráfico num programa do PSDB na internet.

4
AMADO GURU
Mesmo sob ataques de aliados, o jornalista Luiz Gonzalez, centralizou a estrutura de comunicação, controlando orçamento superior a R$ 50 milhões.
Antes de assumir a coordenação de comunicação, rejeitou a ideia de parceria de um grande publicitário, como defendia o presidente do PSDB, Sérgio Guerra.
Também avisou que deixaria a campanha se tivesse que explorar a atuação de Dilma durante a ditadura.
Gonzalez manteve o controle da comunicação até quando a criação de uma favela cenográfica e a opção pelo "Zé", no lugar de Serra, foram focos de críticas.
Sobreviveu ao bombardeio após levar ao ar cenas de Lula ao lado de Serra.
Longe de seus domínios, a internet teve orçamento enxuto, o que não impediu uma experiência exótica ao mundo tucano: a contratação dos serviços de consultoria do "guru" americano de ascendência indiana Ravi Singh.
Homem de confiança de Serra, Gonzalez deve ganhar fôlego extra caso o candidato chegue ao segundo turno.

5
ENERGÉTICO E ALONGAMENTO
Trilhando trajetória de queda nas pesquisas até a semana passada, Serra chegou a esmorecer. Em conversas, lamentou que o eleitor pudesse eleger o PT em primeiro turno, algo hoje incerto.
O medo de uma derrota acachapante serviu de combustível para o ritmo da agenda."Farei o que estiver ao meu alcance", repetia.
O candidato, que leva nas viagens o professor de alongamento, não dispensa grandes doses de energético e sessões de massagens.
Desde 1º de setembro, tem em mãos um calhamaço de 230 páginas, alvo de rabiscos e anotações durante seus voos pelo país. Ali está, em detalhes, o que Serra pretende fazer se eleito.
Foi fruto de trabalho de Xico Graziano, seu secretário de Meio Ambiente no governo paulista, e de uma equipe responsável por filtrar as sugestões de internautas.
Apesar da promessa de um programa participativo, o produto final é de conhecimento apenas de Serra e seus mais íntimos colaboradores. Três delas, por exemplo, foram içadas da "bíblia" só nos últimos momentos da campanha eleitoral: o salário mínimo de R$ 600, o reajuste de 10% para os aposentados e os pensionistas, e a criação de um 13º salário para o Bolsa Família.


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