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Campanha em 5 momentos
Senadora hesitou muito antes de deixar o PT, mas agora espera pela "onda verde"
BERNARDO MELLO FRANCO
DE SÃO PAULO
Ela nunca imaginou que
seria fácil.
Quando deixou o PT de Lula para disputar sua sucessão
pelo minúsculo PV, em agosto de 2009, Marina Silva sabia estar diante do maior desafio da carreira política.
A decisão significava trocar a reeleição certa ao Senado por uma aventura com
pouquíssima chance de vitória, a bordo de um partido
frágil e em oposição aos companheiros da vida toda.
Candidata, ela enfrentaria
dificuldades em série. Algumas previstas, como o tempo
curto na TV e a falta de palanques estaduais. Outras inesperadas, como o corpo mole
de aliados -um caso emblemático foi o do deputado Sarney Filho, no Maranhão.
Diante de cada revés, Marina se esforçou para manter
o discurso otimista, mesmo
que as palavras soassem estranhas à realidade.
Estagnada nas pesquisas,
passou meses repetindo que
havia "furado o plebiscito"
entre PT e PSDB. Questionada sobre a falta de apoio político, dobrou a aposta nos
"núcleos vivos da sociedade", que não foram capazes
de encher um único comício.
A persistência da candidata, que chegou a se comparar
ao sonhador Quixote, agora
ameaça ser recompensada às
vésperas da eleição.
1
CONSULTA AO
PASTOR
No fundo, nem os verdes
acreditavam.
Fundador do partido, o vereador carioca Alfredo Sirkis
duvidava que Marina topasse o convite para se filiar ao
PV e concorrer ao Planalto.
Marina hesitou muito antes do "sim". Incentivada por
ambientalistas, via uma
oportunidade de recuperar o
prestígio perdido no PT e elevar a causa ecológica a um
novo patamar no país.
Ao mesmo tempo, temia
ser esmagada no confronto
com adversários mais fortes.
Antes de definir seu futuro, ela pediu orações e consultou um grupo de pastores
da Assembleia de Deus, à
qual converteu-se em 1997.
Saiu dos encontros amparada numa metáfora bíblica,
depois transformada em mote da campanha: a luta de
Davi contra Golias, em que o
pequeno hebreu surpreende
e derrota o gigante.
2
DORES, ALERGIAS E
RESTRIÇÕES
No início, ela não podia
nem ouvir falar na ideia.
Após muita insistência,
aceitou testar um pouquinho, começando pelas mãos.
Foi assim, lentamente,
que o cabeleireiro Marcos Padilha conseguiu quebrar a resistência de Marina a um
item básico das campanhas
políticas: a maquiagem.
Acostumado a lidar com
artistas de cinema e TV, ele
teve que se desdobrar até
acertar o make-up da candidata, que é alérgica às substâncias mais usadas pela indústria de cosméticos.
Só no fim de julho, faltando dois meses para a eleição,
ela começou a aparecer maquiada em atos públicos,
graças à importação de produtos antialérgicos.
As saúde de Marina, que
teve contaminação por mercúrio e sobreviveu a malárias
e hepatites, provocou saias-justas. Por causa das alergias, ela recusou quase tudo
o que lhe ofereceram nas
ruas, de flores a guloseimas.
Saiu invicta de compromissos como uma visita ao
Mercado Municipal de São
Paulo, na hora do almoço.
Enquanto aliados salivavam
com as bancas de frutas, ela
repetia pacientemente, a cada feirante, que só podia comer "no horário". Muitos não
disfarçaram a decepção.
Em Porto Alegre, Marina
bateu recorde numa festa
gaúcha. Recusou um passeio
de charrete, por causa da labirintinte; o chimarrão, pela
cafeína; e um espeto de carne, por ser vegetariana.
Ela ainda enfrentou sucessivas gripes e dores insistentes na coluna e no ciático.
3
FLASHMOBS E
PIQUENIQUES
Parecia qualquer coisa,
menos um ato de campanha
à Presidência da República.
Numa manhã de sábado,
cerca de 30 jovens vestiram
máscaras coloridas e se espalharam pelo vão livre do
Masp, na avenida Paulista.
No horário combinado,
ocuparam uma das pistas e
desenharam no asfalto palavras como desmatamento e
violência. Em seguida, apagaram as inscrições, com
vassouras e baldes d'água.
O objetivo era simbolizar a
limpeza que Marina, se eleita, promoveria no país.
Foi uma das primeiras
flashmobs promovidas pelo
Movimento Marina Silva,
que ainda faria piqueniques
ecologicamente corretos,
"banners humanos" e outras
manifestações inusitadas de
apoio à candidata.
Os "marineiros" também
colaboraram com o retrato
pop inspirado nos cartazes
de Barack Obama.
A campanha oficial procurou investir na mesma roupagem moderna, com menos
eficiência. A aposta nas mídias sociais, que compensariam o pouco tempo de TV, ficou longe do esperado.
4
EMOÇÕES À
FLOR DA PELE
Ela abandonou o figurino
de candidata e chorou.
Em visita à favela do Coque, no Recife, Marina não
conteve a emoção ao conhecer um projeto social que ensina as crianças a recitar direitos negados pela pobreza.
A senadora ficou tocada
com a apresentação de um
menino de 4 anos, que fez
um número de capoeira em
sua homenagem. No voo de
volta, escreveu um poema
sobre o garoto, que recitaria
no fim do debate da Band.
Além disso, passou a citar
a favela em diversas ocasiões
como exemplo de descaso do
Estado com os pobres.
Recentemente, em nova
ida ao Recife, Marina teve novo motivo para chorar.
Ficou sabendo que outro
menino de 12 anos, filho de
um a moradora que conheceu na primeira viagem,
morreu ao cair de um ônibus.
5
À ESPERA DA
ONDA VERDE
Os aliados já estavam jogando a toalha.
Marina passou a campanha à espera da onda verde
que teimava em não vir.
Quando parecia relegada
aos 10%, os escândalos na
Receita e na Casa Civil incendiaram a briga entre os favoritos e abriram espaço para o
avanço de sua terceira via.
Em alta, a senadora agora
torce por um sprint ainda improvável rumo ao segundo
turno. Na segunda-feira, ela
já parecia satisfeita em se
sentir temida pelos adversários: "Tentaram me ignorar,
mas agora não dá mais".
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