São Paulo, quinta, 31 de dezembro de 1998

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COMO FICOU - COMPRA DO VOTO
Todos os envolvidos na denúncia de compra de voto são inocentados
Governo e Congresso evitam investigar

FERNANDO RODRIGUES
da Sucursal de Brasília

O caso da compra de votos a favor da emenda da reeleição terminou sem que ninguém fosse punido. Hoje, não há investigação em curso. As autoridades que poderiam descobrir alguma coisa deram o assunto por encerrado.
O caso se refere à aprovação da emenda constitucional que permitiu ao presidente da República, a governadores de Estado e a prefeitos disputar mais um mandato permanecendo no cargo.
A emenda foi votada em 28 de janeiro do ano passado pela Câmara. O governo venceu a votação. Cerca de cem deputados que se diziam indecisos acabaram tomando posição a favor da reeleição apenas no dia da votação.
Em 13 de maio de 97, a Folha começou a publicar a série de reportagens "Mercado do Voto". Dois deputados federais do PFL do Acre, Ronivon Santiago e João Maia, contavam em conversas gravadas que tinham recebido R$ 200 mil, em dinheiro, para votar a favor da emenda da reeleição.
Os diálogos de Ronivon e Maia foram gravados por uma pessoa que conversou com eles, mas não quis se identificar. A Folha respeitou esse desejo da fonte, que foi citada na reportagem apenas como "Senhor X".
Ronivon e Maia citavam como mandantes da operação dois governadores de Estado, ambos do PFL: Orleir Cameli (AC) e Amazonino Mendes (AM). Além disso, diziam que o dinheiro seria proveniente de uma "cota federal", que teria ligação com o então ministro das Comunicações, Sérgio Motta, morto em abril deste ano.
Segundo os diálogos gravados de Ronivon e Maia, pelo menos outros três deputados federais teriam recebido R$ 200 mil para votar a favor da emenda da reeleição: Chicão Brígido (PMDB-AC), Osmir Lima (PFL-AC) e Zila Bezerra (PFL-AC). Os três negam o envolvimento.
Em maio de 97, a Folha enviou cópia das fitas com as falas do "Senhor X" suprimidas. A pedido da Comissão de Sindicância, peritos da Unicamp (Universidade de Campinas) analisaram as fitas cedidas pela Folha e confirmam a autenticidade das gravações.
A Folha não divulgou as fitas na íntegra para preservar o sigilo da fonte, um direito constitucional assegurado aos jornalistas.
A única consequência prática das reportagens sobre a compra de votos foi a renúncia dos deputados Ronivon e Maia. Tomaram essa decisão sem explicar a motivação do ato, pois ambos se diziam inocentes. Desde então, se recusam a esclarecer o caso.
Com a renúncia aos seus mandatos, Ronivon e Maia escaparam de uma punição formal da Câmara. Se fossem cassados, perderiam os direitos políticos e poderiam ser processados como qualquer outro cidadão.

Sem investigação
Os outros envolvidos não foram investigados. Sob o comando do Palácio do Planalto, deputados governistas brecaram a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. A discussão do assunto ficou circunscrita apenas à CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara.
A CCJ não tem poderes de polícia. Não pode exigir que pessoas compareçam para depor. Quando alguém aceita depor, não o faz sob juramento. A CCJ também não pode quebrar o sigilo bancário e telefônico das pessoas acusadas.
Todos os envolvidos acabaram depondo na CCJ. Mas todos negaram culpa. Os governadores do Acre e do Amazonas e o ministro das Comunicações não foram nem sequer acusados formalmente. Os três deputados citados por Ronivon e Maia foram absolvidos por falta de provas.
Mais de um ano depois de o caso ter se tornado público, o plenário da Câmara ratificou a decisão da CCJ. Em 2 de junho passado, Chicão, Osmir e Zila foram definitivamente absolvidos. O processo foi encerrado.
Outra possibilidade de investigação teria sido por meio da Polícia Federal ou da Procuradoria Geral da República, pois o possível crime tinha implicações federais.
A PF nunca entrou no caso. A Procuradoria Geral da República recebeu, pelo menos, cinco pedidos de investigação. Entre os requerentes estavam parlamentares e OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Nada prosperou.



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