UOL
       
 
Capital


Ltda.

Outro Lado


Tecnologia


Grade


O direito de emburrecer


Memória


Palanque


Perfil

 
Lltda.

Globo saltou de 17 para 32 emissoras em seis anos; Universal já tem 21; Bandeirantes e SBT também ampliaram participações

Concessões crescem em família

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO


Evelson de Freitas - 29.jan/Folha Imagem
O presidente FHC discursa na inauguração da nova sede da Rede Globo em São Paulo
Levantamento exclusivo da Folha, feito com base no cadastro oficial das emissoras de rádio e televisão de todo o país, revela que a Rede Globo praticamente dobrou o número de suas concessões de TV nos últimos anos, comprando parte do capital de grupos independentes em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Paraná. A família Marinho tem participação societária em 32 emissoras de televisão, sendo dez exclusivas e o restante em sociedade com empresários locais.

São 11 emissoras no Estado de São Paulo, oito no Paraná, sete em Minas Gerais, quatro no Rio de Janeiro, uma em Brasília e outra em Recife.

É uma proporção alta, considerando o total de TVs em cada Estado. Em São Paulo, onde há 40 emissoras, a família Marinho tem 28% das concessões. No Paraná, a proporção é de 33%; em Minas, de 35%; e no Rio, de 29%. Como a participação é concentrada nesses Estados, o número diminui para 12% em âmbito nacional.

Em 94, quando a Folha fez levantamento semelhante, os Marinho tinham participação em 17 emissoras de TV em todo o país.

Os dados de 94 e os deste ano foram tirados do cadastro do Ministério das Comunicações, cujo acesso não é liberado ao público.

A Rede Bandeirantes e o SBT também cresceram, mas em menor escala. A família Saad, da Rede Bandeirantes, aparece no cadastro como acionista de 12 emissoras de TV, três a mais do que possuía em 94.

A família Abravanel (sobrenome do empresário Silvio Santos, do SBT) aparece ligada a dez emissoras de televisão: uma a mais do que há seis anos.

Esse período também coincide com a expansão do império televisivo da Igreja Universal do Reino de Deus, que já possui pelo menos 21 emissoras de TV, distribuídas em três redes: Record, Rede Mulher e Rede Família.

A identificação das emissoras sob o comando da Universal é difícil porque as concessões estão registradas em nome de pastores, bispos, executivos e parlamentares da igreja.

No nome do bispo Edir Macedo, fundador da Universal, existem apenas duas emissoras de TV (a Record de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, e a Record de São Paulo) e cinco de rádio.


Lei inócua
Das 40 emissoras do Estado de São Paulo, apenas 14 não estão ligadas societariamente às famílias Marinho, Saad ou Abravanel ou à Universal. Em âmbito nacional, esses grupos têm 29% do total de concessões de TV (262, incluindo as educativas).

O decreto-lei 236, editado há 37 anos para impedir a concentração dos meios de comunicação nas mãos de poucos grupos, estabelece que nenhuma entidade ou pessoa física pode possuir mais do que dez emissoras de televisão no país, sendo, no máximo, cinco em VHF e cinco em UHF.

Os canais VHF são identificados pelos números de 1 a 13 e os UHF, pelos números a partir de 14. A punição para quem infringe o artigo é a perda da concessão.

A legislação se mostrou inócua porque as emissoras e o próprio governo interpretam que o limite é por pessoa física _considerando cada acionista individualmente_ e por empresa, sem levar em conta o parentesco entre os titulares das companhias.

Os oligopólios da radiodifusão se formaram a partir dessa brecha na lei. As concessões são registradas em nome de pessoas diferentes de uma mesma família. Avós, pais, filhos, irmãos e cônjuges se tornam sócios de empresas distintas e cada um pode controlar até dez emissoras de TV.

Três gerações da família Marinho aparecem como acionistas de TVs no cadastro do governo: o patriarca Roberto Marinho, os filhos José Roberto, João Roberto e Roberto Irineu e cinco netos.

Paula Marinho Azevedo e Rodrigo Mesquita Marinho (filhos de João Roberto), Paulo e Flávia Daudt Marinho (filhos de José Roberto) e Maria Antônia (filha de Roberto Irineu Marinho) são acionistas de mais de 20 emissoras afiliadas da Rede Globo em Minas, Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro.

A última aquisição da família, registrada há cerca de três meses e identificada no levantamento da Folha, foi a compra de metade da TV Mogi, da cidade paulista de Mogi das Cruzes.

O mesmo sistema é adotado pelas demais famílias que controlam os grandes grupos nacionais de radiodifusão e se repete nos grupos regionais, como a RBS, afiliada da Rede Globo no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, e a Organização Câmara, afiliada da Globo em Goiás e Tocantins.

A família Sirotsky (do grupo RBS) tem dez emissoras no Rio Grande do Sul, todas em VHF. O decreto-lei diz que nenhuma entidade ou pessoa física pode ter mais do que duas concessões de VHF por Estado, mas elas estão registradas em nome de diferentes membros da família.

O mesmo se passa com a família Câmara (da Organização Câmara), com seis emissoras de VHF em Goiás e duas em Tocantins.

A lei também não permite que uma empresa ou pessoa tenha duas concessões na mesma cidade, mas, usando a brecha de registrar emissoras em nomes de parentes, a família Saad conseguiu ter duas concessões de TV em São Paulo (TV Bandeirantes e o Canal 21).


Governo
A consultoria jurídica do Ministério das Comunicações tem interpretação igual à das empresas privadas em relação aos limites fixados pelo decreto-lei 236.
Segundo a consultoria, a lei estabelece limites sem levar em conta a existência de parentesco.

O vice-presidente de Rede da Bandeirantes, Antônio Teles de Carvalho, diz que, se o legislador quisesse limitar a posse de emissoras por famílias, a redação deveria ter sido explícita. “Pode ter havido um descuido do legislador. Mas como saber se foi proposital ou não?”, indaga Teles, para quem a limitação por parentesco poderia ser discriminação.


Limite por audiência
O projeto da Lei de Comunicação Eletrônica de Massa, preparado há dois anos pelo Ministério das Comunicações, propôs limitar o número de concessões próprias de cada grupo a 30% da audiência potencial do mercado, medida pelo número de residências com aparelhos de TV.

A proposta é inspirada no modelo norte-americano. Nos Estados Unidos, cada grupo pode cobrir no máximo 35% do total de domicílios do país.

Se o limite de 30% fosse aplicado no Brasil, a Rede Globo teria de reduzir drasticamente sua participação em empresas. Sua rede própria atual cobre 54,09% dos domicílios com TV. Só as cinco emissoras principais, conhecidas como cabeças-de-rede _TVs Globo de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Recife e Belo Horizonte_, cobrem 27,7%.

Não há estudo disponível sobre as outras redes nacionais, mas todas teriam de diminuir de tamanho caso fosse aprovado o limite de 30% da audiência potencial.

O Ministério das Comunicações não reconhece como sua a proposta do projeto da Lei de Comunicação Eletrônica de Massa, embora o texto tenha sido preparado por funcionários do ministério.

“É um projeto fantasma, um filho sem pai. O Ministério das Comunicações não reconhece a autoria da proposta. Eu tenho uma cópia que tirei da Internet’’, afirma Antônio Teles, da Rede Bandeirantes. Para ele, o assunto merece um debate amplo e aberto.

O Ministério das Comunicações informou, por intermédio de sua assessoria de imprensa, que vai aguardar a definição da TV digital para apresentar o anteprojeto oficial da nova lei.


Leia mais: Globo diz que cumpre a lei