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Antonio Prata

estranhos no ninho

Fogo na capela

No fim, a fratura na vértebra do nosso craque parece uma imagem sob medida para essa seleção

Por uns dias, acreditamos que seria possível vencer sem Neymar, sem Thiago Silva, sem meio de campo, sem time: só no grito, no peito, na raça, no hino, mas a seleção a capela não pegou na banguela e morremos na praia --ainda que em Minas, tão perto do ouro, tão longe do mar.

Um poeta português que muito cantou o mar já disse que "Tudo vale a pena/Se a alma não é pequena", mas, com 5 a 0 antes dos 30 do primeiro tempo, comecei a duvidar da validade desses versos. Sabia tudo sobre o mar, o poeta, mas, desconfio, nada de futebol.

Desculpa, leitor, se eu fico aqui me escorando em versos, mas algum consolo este devastado cronista precisa buscar --e pega mal tomar cerveja na tribuna de imprensa.

Tá duro assistir ao Mineirão lotado e perplexo. Depois de quatro gols em seis minutos, engolimos a seco o "Eu acredito!" e passamos a desejar secretamente, ardorosamente, que nos fechássemos numa pusilânime retranca para não perder de dez, de 20. Foram sete. Sete! E poderia ter sido mais.

Se para algo servir o massacre, que seja para passarmos a acreditar menos na mágica e mais no trabalho, no treino, no planejamento, enfim, nessa coisa chata chamada realidade. Botar para enfrentar a Alemanha um time que nunca havia jogado, que nunca havia treinado, na fé de que a mística da camisa amarela daria conta do recado?!

Falou-se muito, antes da Copa, sobre o complexo de vira-lata, cunhado por Nelson Rodrigues. Por um momento, pareceu que o havíamos superado. Não, só invertemos o sinal. Crer que sem futebol é possível vencer no futebol apenas porque queremos mais do que os outros é um delírio de grandeza que só pode surgir de nosso imorredouro sentimento de inferioridade. Aliás, crer que nós queremos vencer mais do que os outros já é sinal de que algo não vai bem. Será que só conseguimos oscilar entre o cocô do cavalo do bandido ou super-heróis? Não podemos ser normais?

O futebol é um negócio engraçado. Como escreveu aqui o mestre Tostão, no início da Copa, ele serve para provar todas as teses. Nessa tenebrosa semifinal, queríamos provar que a garra era mais forte que a tática. Que o brado "a capela" batia uma orquestra afinada. Provou-se o contrário, o óbvio mais ululante com que mesmo o burro videoteipe vai concordar e repetir, "per saecula saeculorum": que, às vezes, o melhor time ganha do pior. E que, quando o melhor time é muito melhor do que o pior, pode fazer sete gols. Sete! E poderia ter sido mais.

No fim, a fratura na vértebra do nosso maior craque parece uma imagem sob medida para essa seleção, uma seleção à qual faltava uma coluna vertebral e que, mesmo assim, acreditamos que seria capaz de levantar e andar, movida pelo exoesqueleto do delírio nacional.


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