Rio-2016 Meu momento olímpico
Guerra na pista
Robson Caetano se recorda da prova em Seul-1988 que opôs Carl Lewis e Ben Johnson
Durante os Jogos Olímpicos de Seul, em 1988, havia certa tensão no ar, algo muito parecido com o que aconteceu na final dos 100 m do Mundial de Pequim, em que Usain Bolt superou o favorito Justin Gatlin.
Era o canadense Ben Johnson contra o norte-americano Carl Lewis. Toda a história começou a ser desenhada quatro anos antes, quando Ben e seu técnico, Charlie Francis, descobriram o que os americanos usavam para melhorar a performance, e daí então uma guerra se instalou dentro e fora das pistas.
O meu momento olímpico foi a final dos 100 m de Seul.
Antes disso, mais de 80% dos atletas tinham traços ou apresentaram algum problema [de doping] durante as seletivas americanas. Um atleta foi pego, mas como isso foi possível, se eles tinham total controle de tudo que faziam?
Uma das dúvidas que pairavam era de que Ben tinha sido vitima de uma armação, e isso é a mais pura verdade.
Só que esse complô não foi provocado por Carl ou outro atleta, e sim por alguém bem mais próximo de Ben.
O que aconteceu antes da prova foi algo indescritível. Parecia que estávamos diante de uma bomba atômica prestes a explodir, afinal, ainda vivíamos a Guerra Fria.
A coisa se polarizou: de um lado, Ben, que havia chamado Carl de "bicha"; por sua vez, o norte-americano, que perdera o pai naquele ano, chamara Ben de "estúpido drogado".
Foi algo que nenhum jornal noticiou. Como os caras não se bicavam, os horários de treino eram fiscalizados.
O time americano ia para a pista e nenhuma outra delegação podia entrar. Quando Ben e seus companheiros de equipe iam treinar, os americanos observavam de longe.
No dia da prova, na pista de aquecimento, o time americano estava de um lado, com Carl, Dennis Mitchell e Calvin Smith. Do outro lado, Ben e Desai Williams com Lindford Christie. Completando, eu e Raymond Stewart, da Jamaica. Fomos à sala de aquecimento e, em seguida, para o espaço de espera. Foi então que percebi o ar pesado.
Quando entramos na pista, eu pensava: "Meu Deus, será que dá pra ganhar?". Foi aí, talvez, que eu tenha jogado fora a chance de grande resultado [terminou em 5º].
Ben chegou em primeiro com um fenomenal 9s79. Carl ficou com cara de incredulidade. Eu ainda me lembro do murmúrio do público.
Agora, como e por que Ben foi pego [no doping, o que deixou o ouro com Carl], eu conto um outro dia.