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Juca Kfouri

Neymar e os fominhas

Quando a fome de bola se junta a outras ganâncias soa o sinal de alarme para o jogador

O PRIMEIRO FOMINHA é o próprio Neymar. Sem pai nem mãe nem patrão nem chefe que imponha limites.

E aí ele comete o despautério de jogar numa noite na Suécia e na noite seguinte no Brasil. Jogar mesmo, jogar bem, com afinco, fazendo golaço, dando passe para gol.

Jogar como não jogou na Olimpíada porque seu caso com o Santos ainda não se reproduz na seleção, coisa que o tempo deverá fazer.

Mas será preciso que ele tenha este tempo, que sua carreira não seja abreviada por vontades mal administradas -por mais que cercadas da estupenda mordomia de um jatinho repleto de conforto.

Mais cedo ou mais tarde, o corpo cobra mesmo de quem é tão jovem e parece de borracha e, portanto, inquebrável como Neymar.

Em Florianópolis, no primeiro tempo, ele perdeu um gol que poderia ser atribuído à síndrome física de Estocolmo, não à psicológica, manifestada claramente no segundo tempo, quando barbarizou como se para mostrar-se apaixonado pela aventura que vivia do mesmo modo que o sequestrado se vincula ao sequestrador.

Tudo isso num gramado encharcado, incomparavelmente pior que os pisados na Grã-Bretanha recentemente e contra adversário mais qualificado do que os da Olimpíada, exceção feita ao México.

Então, com o bom humor que o caracteriza, Muricy Ramalho, que vive, com razão, pedindo um calendário racional e descanso para os atletas poderem render, justifica, como Zagallo em 1998 em relação a Ronaldo, que não poderia frustrar a vontade de seu craque. Pois poderia e deveria até para prosseguir em suas críticas. Ou não foi no Santos que se disse que a CBF entregou Neymar esfalfado depois da excursão passada da seleção?

Nem o intervalo de 48 horas foi respeitado, num jogo que não tinha importância que justificasse exceções ou sacrifícios dessa ordem. Certamente se o episódio fosse com um cavalo que tivesse disputado o GP Suécia numa noite e viesse disputar o GP Brasil noutra, a Sociedade Protetora dos Animais protestaria.

Claro que sempre aparecerão os peladeiros para dizer que não há problema algum porque eles jogam diariamente e não se cansam, e os defensores da classe trabalhadora para dizer que absurdo é ganhar salário mínimo e trabalhar de sol a sol, além do quão mal ganham os professores etc e tal. Como se a comparação fosse possível e não estivéssemos tratando de alguém cujo trabalho é visto por bilhões de pessoas e que, além de profissão, é arte.

Arte que pode ser truncada prematuramente pela ganância, seja por resultados, para tirar o time de má situação, seja a da exposição, do rendimento financeiro, como um dia foi feito com Mané Garrincha e seus joelhos infiltrados, sob a cumplicidade também de médicos e massagistas. Só não tinha jatinhos.

blogdojuca@uol.com.br

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