São Paulo, sexta, 1 de maio de 1998

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Por justiça, essa final era nossa

AMÍLCAR CASADO
especial para a Folha Durante alguns segundos, quando acordei na manhã de segunda, pensei que tudo não havia passado de um pesadelo. Pensei que não havíamos sido esbulhados no Morumbi, que não tinha havido pênalti e que a Lusa, com toda justiça e merecimento, estava nas finais do Campeonato Paulista.
Mas logo fui despertado por uma terrível dor de cabeça, consequência da noite maldormida. E veio aquela sensação de vazio -a mesma que nos acomete quando perdemos um ente querido. Não estamos mais no campeonato. Neste campeonato, nunca mais.
Aí, lembrei-me do choro explícito e/ou contido. Explícito nos soluços do zagueiro César, abraçado ao volante Alex; contido nas caretas que Evair fazia para não chorar. O experiente Evair! No olhar incrédulo dos companheiros que, ainda no vestiário, andavam para lá e para cá, perdidos.
Havia revolta, havia sim. Mas, mais do que revolta, havia estupefação. Como pôde aquele juizinho de queixo erguido, como são todos os petulantes, ter nos tirado da final? Um simples apito, o queixo apontado para cima, o olhar distante de quem não está nem aí. Acabando com um sonho.
Não foi à toa que a Lusa chegou às semifinais. Há quatro anos, nós estamos chegando. É o resultado de um trabalho meticuloso, sério, que envolve pessoas sérias.
Não morremos na praia, como dizem. Morreram aqueles que ficaram para trás da Lusa. Nós morremos por obra e graça de um juiz ou incompetente ou mal-intencionado.
Acionamos nosso departamento jurídico e corremos atrás de nossos direitos.
Mas quais são os nossos direitos? A lei do futebol é dura e concede ao juiz o poder supremo, colocando-o acima do bem e do mal.
Ficou a lição de garra, de determinação, de amor à camisa que nossos atletas mostraram. Isso nos enche de orgulho -diretores e torcedores. Poucas vezes se viu tamanha demonstração de amor, já que muitos atletas acham que, para ser profissionais, precisam ser frios, distantes.
E todos nós reconhecemos isso. Nosso patrocinador -a distribuidora de combustível Salemco- prometera 12 carros aos atletas caso conseguissem o título. Ela entregou os carros porque entendeu que só não chegamos ao título por causa daquele juiz. A diretoria também entendeu assim e premiou os jogadores como se tivessem se classificados à final.
O Brasil inteiro entendeu assim, pois os telefonemas e faxes da Lusa não pararam de tocar. Foi uma comoção nacional.
Com toda certeza, crescemos mais nessa tragédia. Pode estar certo o nosso associado, o nosso torcedor: a Lusa cresceu.
Seremos respeitados e tratados como grandes de agora para a frente. Afinal, nunca na história do futebol brasileiro houve um evento que unisse todos os torcedores dos clubes, como neste episódio.
Todos os torcedores, independentes do time de preferência, se solidarizaram conosco. Crescemos, sim, e falo sem medo de errar: a Lusa é grande, muito grande.
Quanto à final do Paulista, entre São Paulo e Corinthians, eu poderia dizer: que vença o melhor. Mas não vou dizer, não. O melhor não estará lá.


Amílcar Casado é presidente da Lusa


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