São Paulo, domingo, 01 de agosto de 2004

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FUTEBOL

Gostoso é ver gol de craque

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

É triste, lamentável, assistir à saída de tantos jogadores brasileiros. Durante um tempo, lá pelas décadas de 60 e 70, era proibida a importação de jogadores pela Europa. Já pensou ver uma partida entre Santos e Botafogo? De um lado, Pelé, Zito, Carlos Alberto, Coutinho, Pepe. Do outro, Nilton Santos, Didi, Garrincha e outros craques. Eu vi.
Imagine hoje um jogo pelo Brasileiro com as presenças de Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho, Roberto Carlos, Cafu, Kaká, Alex, Juninho Pernambucano e outros.
A razão principal dessa situação é econômica. O Brasil é um país rico, com o povo e os clubes pobres. Qualquer time de fora leva o atleta brasileiro, e alguns ainda lucram na transferência para um grande time da Europa.
Muitos clubes brasileiros foram aniquilados pela incompetência e falta de seriedade de dirigentes. Mesmo com boas administrações, será necessário um longo tempo para se recuperarem.
O problema não é só financeiro. Como mostrou a Folha, as 24 equipes do Brasileiro utilizaram 707 jogadores em 18 rodadas, com um média de 29,5 por time. Dezessete equipes trocaram de técnico. Além da má qualidade individual, não formam bom conjunto.
Os clubes planejam e contratam mal e depois dispensam jogadores, com prejuízo. Nesse momento de penúria, é fundamental descobrir jovens talentosos ainda não valorizados. Parece que os clubes de menor tradição sabem fazer isso melhor do que os ditos grandes.
Os clubes precisam também contratar profissionais com mais qualidade para as comissões técnicas dos times principais e das categorias de base. No futebol, como em quase toda a sociedade brasileira, as pessoas são escolhidas e elogiadas muito mais pela amizade, sociabilidade e interesses comuns do que pela competência. "É dando que se recebe", uma praga nacional.
Vivemos ainda a época da propaganda, do espetáculo, da imagem, do que parece e não do que é. O importante é vender bem, não fazer bem. Algumas vezes vende-se também a alma, percebendo ou não. O interesse de outros países já chegou a alguns técnicos brasileiros e até à imprensa. Fui convidado para escrever numa revista da Ucrânia. Se aceitasse, como eles iriam traduzir cabeça-de-bagre, brucutu, pontapé e outros termos e palavras?
Os atletas só vão para o exterior se quiserem. Assim como eles adoram repetir gestos bobos e agressivos de companheiros, que mandam os torcedores do seu time e do adversário calarem a boca na comemoração de um gol, muitos jogadores querem ir para fora, para qualquer país, porque outros vão.
No final de suas carreiras, muitos lamentarão os momentos infelizes que passaram em lugares estranhos, a diminuição de prestígio e de chances de jogarem na seleção brasileira e a perda de dinheiro em outros contratos.
É preciso fazer alguma coisa para melhorar o futebol brasileiro. Ricardo Teixeira anunciou que, a partir do próximo ano, será a proibida a saída de jogadores durante o Brasileiro.
Mesmo quem não entende nada de futebol, desconfia que isso será derrubado na Justiça, pois obstrui a liberdade do cidadão de trabalhar onde quiser.
Em vez disso, seria melhor adaptar o calendário brasileiro ao europeu. Como os clubes da Europa só podem contratar antes do campeonato e no final ou início de ano, os times brasileiros perderiam poucos jogadores durante a competição.
Outras maneiras de amenizar a grave situação dos clubes são eles elaborarem melhor as multas rescisórias e o tempo dos contratos dos atletas e aumentarem a arrecadação com a venda de seus produtos e marcas.
É preciso ainda diminuir o número de times e a duração do Brasileiro, construir e reformar estádios, melhorar o conforto e a segurança dos torcedores e mudar o horário de 21h45.
O governo deveria financiar os clubes, como faz com qualquer empresa particular, ou o futebol, por ser um esporte de interesse público, deveria ser tratado de uma maneira especial? É um assunto polêmico. Uma coisa é certa: o governo não pode ajudar clubes que dão calotes e não pagam corretamente os impostos.
Futebol sem craques não dá. Em alguns instantes, me dá vontade de aprender os detalhes técnicos do basquete e do vôlei e me transformar num comentarista de um desses esportes. Poderia combinar umas aulas com o Wlamir Marques ou com o Mauricio Jahu. São apenas momentos de fantasias. O gostoso é ver um gol de craque.



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