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Foco
Corrida em Paraisópolis espanta moradores com atletas, tempo e desmaios
ADALBERTO LEISTER FILHO
DA REPORTAGEM LOCAL
As ruas já estavam interditadas. Faltavam duas horas
para a primeira prova do Circuito Popular de Corridas,
mas o som ainda bombava na
boate Batucão, em Paraisópolis (zona sul de São Paulo).
Os primeiros corredores
chegavam e se misturavam
aos últimos baladeiros. Muitos tomavam a saideira e estranhavam a aglomeração.
O campo do Palmeirinha,
local da largada, era tomado
pela geração saúde. Bem, nem
tão saúde. "Ontem tomei
umas garrafas de vinho na
minha namorada", dizia um.
O evento atraiu uma multidão de crianças ao redor da
largada, todas com coletes
das Casas Bahia, aberta há
duas semanas na favela.
A chegada de forasteiros,
porém, tirou dos anfitriões a
esperança de vitória. "O da
perna fina corre muito."
"E aquele lá atrás, de boné
vermelho? Parece queniano."
Inédita na favela, a prova
pegou o povo desprevenido.
As 500 vagas não foram
preenchidas e, minutos antes
da largada, era possível conseguir número de peito menor que 200 para participar.
"Foram ao colégio e puseram a gente na hora", contou
um aluno, que nem precisou
doar 1 kg de alimento não-perecível, valor da inscrição.
Juracy Almeida, que montou uma equipe de garotos, lamentava a deserção de seus
pupilos. "Não veio ninguém."
Sem o costume de correr,
cada um usava o que tinha em
casa: bermudas e camisas de
algodão, tênis pesadões.
A vantagem dos autóctones
era conhecer o percurso. Não
é fácil dosar o esforço diante
do sobe e desce da favela.
A segunda descida, porém,
foi a mais íngreme que já peguei em provas de rua. Era
preciso frear, para não perder
o equilíbrio e rolar ladeira
abaixo. Um dos cuidados necessários é com as lombadas,
que não são pintadas e se confundem com o asfalto. Na terceira descida, tropecei, caí e
meus óculos voaram uns cinco metros para baixo.
Na primeira das duas voltas, alguns já caminhavam.
Felizmente, haviam retirado
um trecho esburacado que
desembocava em uma subida
de terra cheia de pedras, um
perigo para os corredores.
A melhoria não evitou contratempos. Dois atletas passaram mal no caminho. Uma
mulher desmaiou ao chegar.
No final, todos se surpreendiam com o tempo de Leandro de Oliveira, vencedor
após 12min34s. No pódio,
ninguém da comunidade.
"Fiz em 16 minutos. Fui
mal. Acontece", consolava-se
o vigilante Josivaldo da Silva,
um dos favoritos da favela.
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