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FUTEBOL
A hora das cinzas
JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA
Jovem leitor, jovial leitora,
eu lhe pergunto: "Você estará
vivo(a) daqui a cem anos?". E eu
lhe respondo: "Não".
Nem eu. Mas talvez daqui a
cem anos alguém ainda se lembre
de nós. Ou talvez não. E neste caso experimentaremos uma segunda morte, pois morre-se duas vezes: a primeira, quando deixamos
de respirar; a segunda, quando
deixamos de ser lembrados.
Sendo assim, talvez alguns jogadores morram antes do segundo
modo que do primeiro.
E acho que pensei nisso principalmente por conta de Jorge Mendonça, que morreu há cerca de
duas semanas. Ele foi um craque.
Com 384 gols, é o 30º maior artilheiro da história do nosso futebol, à frente de jogadores como
Sócrates, Mazzola, Tostão, Heleno de Freitas, Garrincha, Rivellino, Zizinho, Reinaldo, Jairzinho
etc...
Ele poderia ter sido o herdeiro
de Ademir da Guia no Palmeiras.
Tinha elegância, cobrava faltas
como poucos, era bom no cabeceio e driblava com facilidade.
Mas ficou apenas quatro anos e
meio no Parque Antarctica, o suficiente para fazer mais de cem
gols, mas não o bastante para ter
seu nome ligado ao clube como
um Dudu ou um Leão.
Jorge Mendonça teve glórias em
outras equipes. Num jogo em que
o Náutico venceu o Santo Amaro
por 8 a 0, ele fez todos os gols. Em
1981, pelo Guarani, foi artilheiro
do país com 58 gols. Fez 11 jogos
pela seleção (e nunca perdeu), foi
campeão pernambucano, paulista e brasileiro (no Guarani, pela
Série B).
Mesmo assim, creio que poucos
se lembravam de Jorge Mendonça
quando ele morreu. Como seu nome não está ligado a nenhuma
grande conquista da seleção e ele
não é identificado com um único
clube, acabou não entrando para
o panteão dos imortais, dos inesquecíveis.
O pior é que mesmo o panteão
dos inesquecíveis tem suas rachaduras.
Em meu blog tenho feito uma
pesquisa sobre jogadores inesquecíveis, e muitos imortais quase
nem são lembrados. É claro que a
maioria dos leitores é jovem...,
mas o fato é que os jogadores da
era pré-TV vão para o limbo com
muita facilidade.
Gênios inegáveis como Gilmar
dos Santos Neves, Djalma Santos,
Mauro Ramos de Oliveira e Bellini receberam poucos votos. Pouquíssimos. E a culpa não é dos
eleitores, que não podem lembrar
do que não viram. Aliás, nem há
um culpado. As coisas são assim.
Poucos sobrevivem ao tempo.
A vida profissional de um jogador de futebol dura mais ou menos dos seus 20 aos 35, 40 anos.
Depois ele passa a habitar a memória da torcida. Ou não. E este
"não" deve lhes doer muito. Ter a
segunda morte antes da primeira
é comum entre os jogadores de futebol. Comum e cruel.
Essa profissão abençoada e
maldita de jogador de futebol tem
esta perversidade: dá-lhe tudo na
juventude: saúde, sonhos e glórias, e vai retirando-as aos poucos.
Mas o pior é que talvez a própria vida seja assim.
Mea-culpa
Relendo o texto acima, achei-o
um tanto pessimista. Isso é que
dá escrever numa manhã de
Quarta-Feira de Cinzas.
Um teste frio
Acho que o teste da seleção acabou não servindo para grande
coisa. Nada tão importante
aconteceu para mudar a posição de Parreira. O destaque positivo talvez tenha sido Rogério
Ceni, porém, se não houver nenhuma contusão de seus concorrentes até lá, deve ficar mesmo de fora. Creio que quem
saiu mesmo ganhando com o
amistoso foi a Nike. Estreou seu
novo uniforme e, de quebra,
mostrou dois novos apetrechos: as luvas e uma espécie de
cachecol. Mas provavelmente
não veremos os garotos brasileiros usando estes acessórios
pelas praias brasileiras.
E-mail - torero@uol.com.br
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