São Paulo, sexta-feira, 02 de abril de 2010

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XICO SÁ

Quando toda sexta é da paixão


Se o futebol é uma caixinha de surpresas, a mulher é um baú de elipses e mistérios e muito mais surpreendente


AMIGO TORCEDOR , amigo secador, na sexta consagrada à Paixão, duas ou três coisas que eu sei sobre ela, aqui juntando o que interessa: futebol e mulheres.
Não existe mulher feia, mas que me desculpem os brucutus e o gremista Eduardo Bueno, futebol bonito é fundamental. Gracias a la vida e ao Vinícius de Moraes, claro. Se com a fêmea o amor pode ser à primeira vista (no dia em que ela está mais coisa linda do que nunca), com o time o amor pode começar em uma tragédia, quando ele, buá, apanha feio, no sagrado dia em que seu pai o leva ao estádio pela primeira vez. Conheço muita gente que se apaixonou pelo Flamengo, pelo Corinthians e pelo Galo nesta hora. Na passionalidade ludopédica, o vira-casaca é o pior dos canalhas.
Nem se compara aos volúveis tão comuns nestes tempos de amores líquidos. O vira-casaca talvez seja equivalente, quem sabe, apenas ao vagabundo que bate em mulheres.
O que dói mais: um chifre ou uma traição do seu clube, entregando o jogo aos 45 do segundo? Este cronista, que já sofreu as duas maldições em um mesmo domingo, crava o empate. A vida é bola nas costas. A sorte é que no amor, a fila anda; no futebol o jejum de títulos pode durar anos e mais anos, vade retro.
Exaltar o time do peito no botequim é uma prática, mas nunca fazemos o elogio da cria das nossas costelas merecidamente. Há o temor de que o samba-exaltação à "patroa" desperte o interesse do próximo. E desperta mesmo. Não nos garantimos. No máximo tratamos das qualidades espirituais, dizemos que ela é, por exemplo, hahaha, uma santa.
Na paixão clubística queremos o coletivo, a turma reunida, as espumas flutuantes da cerveja. Na paixão pela fêmea a luta é pelo selo da exclusividade. A não ser um galinha ludopédico qual este que vos escreve -cigano Zelig que tem quase um time por Estado-, homem que é homem se devota só a um escudo. Sim, isso mesmo, amigo freudiano, obrigado pelo pitaco: secar é gozar com o pênis alheio, mesmo que seja um time pequeno. Aí é que está a graça do exercício.
Na mais passional das sextas, nosso dia de encontro, vos digo: a lua de mel com uma mulher tem tempo de duração, com o seu time pode durar uma década, caso do Santos de Pelé, o Botafogo de Garrincha etc. etc.
E a brochada, amigo urso, seria o gol contra do amor? Sim, desde que a moça seja uma fã piedosa e nos diga que isso acontece até com os melhores torcedores do Chelsea. Aí, vale o chavão do boleiro diante da derrota: é levantar a cabeça, dizer que o time está unido e pedir mais uma chance para mostrar o seu verdadeiro futebol, como me ensinou o Moa, lá na Barão de Limeira, palmeirense da família Chic Show.
Sim, meu caro, se o jogo de bola é uma caixinha de surpresas, a mulher é um baú de elipses e mistérios.
Muito mais surpreendente. Nem o Indiana Jones encontra o segredo. Uma pequena mulher, nobre secador, vence muito mais uma mulher grande do que se imagina. Uma grande mulher, todavia, costuma ser imbatível na vida de um homem.
Amigos de todas as preferências e credos, pianinho, relaxem na companhia dos seus. Até a próxima. Todo dia é sexta da paixão em casa. Cronicamente inviável, me despeço.

xico.folha@uol.com.br


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