São Paulo, sábado, 02 de maio de 2009

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MOTOR

Os engomadinhos


Quinze anos após a morte de Senna, F-1 pode ser mais chata e pasteurizada, mas é também à prova de falhas


FÁBIO SEIXAS
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE

UM CLIQUE . A morte de Senna, que ontem completou 15 anos, foi um clique na F-1. Uma virada, um marco. História com agá maiúsculo, de verdade, não aquela que banalizamos no dia a dia quando um piloto vence pela primeira vez ou um time goleia o outro.
Há uma década e meia, em choque, o automobilismo parou para pensar no que estava errado. E iniciou uma Revolução, com erre maiúsculo, que ainda ocorre, que é visível, que mudou a cara do esporte. Literalmente.
Caiu nas mãos da coluna, parou no blog na Folha Online e está ainda no www.tinyurl.com/fotode94 a fotografia oficial dos 28 pilotos que largaram para a temporada de 1994, em Interlagos, e que começaram os treinos livres daquele fim de semana em Imola. Comparada à imagem que a F-1 tem hoje, é um exército de Brancaleone, um retrato dos últimos resquícios de amadorismo e aventura na categoria. Quinze anos atrás, e havia muito tempo, a F-1 já era considerada um ambiente superprofissional. O olhar em retrospectiva é cruel?
Talvez. Mas é também elucidativo. A estranheza começa pelo cenário tosco, uma parede de blocos ao fundo, e pelo quórum, alguns com trajes exageradamente coloridos, outros vergonhosamente brancos. Passa pela postura dos dito-cujos: Berger e Gachot de macacões abertos, Barrichello, Brundle, Katayama e Martini usando tênis. Resvala nos dois terços sem bonés de equipes ou patrocinadores, nos companheiros de time distantes uns dos outros, perto dos amigos. E termina com sorrisos deslumbrados. Não é questão de eleger melhor ou pior, de ridicularizar o passado ou celebrar o progresso. Mas de notar que a Revolução que se iniciou no dia seguinte, um 2 de maio, atingiu até a postura dos pilotos.
Num clique, eco do estrondo do Williams no muro da Tamburello, a F-1 percebeu que teria de se reinventar. E que, para se tornar à prova de falhas, nem mesmo aquela camaradagem e aquele espírito relaxado poderiam continuar. No "check list" de Ecclestone e Mosley para salvar a categoria após os abalos do seu fim de semana mais trágico, estiveram até a higienização do grid, a pasteurização das atitudes, a "encaretização" do esporte. A foto de 2009, assim como suas irmãs dos últimos anos, estampa um cenário bonito, a reta de Melbourne, e uma placa politicamente correta da FIA, pedindo "carros mais verdes". Mostra os colegas de equipe lado a lado, de macacões brilhantes e bonés -a exceção é Webber, que deve ter levado bronca. São uns engomadinhos, todos. Engomadinhos como as pistas da grife Tilke e os regulamentos super-restritivos. Ou "eficientes", se preferir. A marca de Senna. Seu legado para o esporte que amou.
fabio.seixas@grupofolha.com.br


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