|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Copa 2006
Minoria oposicionista de Weggis censura seleção
Hoteleiro aposentado dirige campanha para derrubar "prefeitos"
Franz Erni diz que saldo da passagem do Brasil será aumento de impostos para os cidadãos, contra quase nada de ganho para a cidade
FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A WEGGIS
Nos subterrâneos de Weggis,
desprezada por autoridades,
mídia e maioria da população,
há uma minoria barulhenta
que contesta a presença brasileira na vila suíça. O problema
não é com a seleção em si, mas
com o comportamento dos políticos e empresários da região,
para esses críticos na contramão do interesse público.
O senso (quase) comum
aponta a temporada da seleção
na estância aos pés dos Alpes
como uma oportunidade única
para a cidadezinha, e os empresários que viabilizaram a empreitada como benfeitores. Já
na visão da oposição, a comuna
(espécie de prefeitura) encantou-se com o dinheiro fácil e ignorou o bem-estar dos seus
4.000 moradores.
O mais briguento de todos, o
calo no pé das autoridades, é
Franz Erni. Hoteleiro aposentado, é um sujeito falante, que
usa um lencinho no pescoço e
mora com a mulher ao pé do
monte Rigi, o maior da região.
Há dois meses, ele publicou
um petardo no Wochen-Zeitung, o semanário local, pedindo a renúncia do colegiado que
administra a comuna, formado
por cinco "prefeitos".
Erni reclama que o saldo da
festa será aumento de impostos
para os cidadãos, já que a comuna entra com uma parte dos investimentos, contra quase nenhum retorno para a cidade.
Pelos seus cálculos, 500 mil
francos suíços (cerca de R$ 900
mil) saíram do erário municipal -o chefe dos prefeitos diz
que é bem menos.
O mais grave é que, sob a
atual administração, as finanças do município minguam.
Desde 1999, a arrecadação só
aumentou (23,1 milhões de
francos em 2005), mas o superávit só diminuiu (165 mil francos em 2005, também o menor
dos últimos sete anos).
O que as autoridades alegam
ser o principal ganho, a herança
de um novo campo para Weggis, é questionável. A agência de
marketing Ataro/Kentaro e a
empresa Thermoplan, fiadoras
do projeto, fizeram um contrato com a comuna para explorar
por dez anos a área onde está o
campo, que é pública. Como já é
sabido, esperam que a seleção
seja a primeira de uma série de
equipes a procurar a cidade para fazer pré-temporadas.
"Por mais de quatro anos a
população pedia novas áreas de
lazer e um campo novo, mas
eles nunca ligaram. Agora que
há um, virou praticamente propriedade privada", queixa-se.
Sua mulher, Heide, completa: "Este é um lugar de velhos.
Quando passa o verão, não há
nada para fazer, não há espaços
de diversão para os jovens, porque a comuna não constrói".
Por sua postura crítica, o casal Erni é visto com rabo de
olho por muitos moradores,
que fogem do assunto.
"Ninguém tem coragem de
me criticar diretamente, mas
estou certo de que pelas costas
muitos falam mal de mim",
afirma ele. "O duro é saber que
há outros que concordam comigo, mas têm medo. Vários
comerciantes vêm até mim se
queixar da comuna, mas não
enfrentam ninguém, temendo
perder suas licenças."
Há 12 anos na Suíça, a mexicana Laura Eirich, outra rara
alma a criticar o establishment
local, também ressalta a falta
de coragem dos moradores, a
quem chama de "hipócritas".
"Vou a um café e lá vejo muitos
criticando a forma como tudo
isso [a chegada da seleção] foi
armado. São os mesmos que,
em cerimônias públicas, bajulam os poderosos."
A senhora Erni conta que,
por isso, isolou-se na montanha e evita ir à vila. "Quero distância dessa comunidade."
O dono de Weggis
Os Erni pagam de certa forma o preço da rebeldia, mas nada se compara ao ocorrido com
a família Oetiker, que comprou
briga com o maior magnata local, Martin Denz, dono do Park
Hotel, onde está a seleção, e até
hoje sofre as conseqüências.
Denz tem planos de ampliar
a área do resort, o que em tese
dependia da aprovação dos vizinhos. Elizabeth e Alexander
Oetiker não aprovaram, e a disputa foi parar nos tribunais. O
casal perdeu, e no meio do processo afirma que enfrentou o
desprezo de toda Weggis.
A ponto de Elizabeth ter tido
depressão, da qual ainda não se
recuperou de todo. Fanáticos
pelo Brasil, onde moraram nos
anos 80, vivem um sentimento
ambíguo em relação à presença
da seleção na cidade.
"Isso aqui virou um grande
circo, mas não tem nada a ver
com os brasileiros em si. Eles
são somente utensílios para
que as empresas ganhem dinheiro", critica Alexander.
Pedagogo que nos últimos
meses ensinou história do Brasil às crianças de Weggis, ele
lembra que, na final da Copa de
98, toda Weggis torceu pela
França contra a seleção. E é ácido ao avaliar a onda de paixão
da cidade pelo time pentacampeão. "Mesmo gente que não
sabe que a bola é redonda virou
admiradora dos brasileiros."
Texto Anterior: Online: Escute as opiniões de Parreira sobre a preparação do Brasil para a Copa Próximo Texto: Entrevista: Cidade ganha com o campo, diz prefeito Índice
|