São Paulo, sexta-feira, 02 de junho de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Copa 2006

Minoria oposicionista de Weggis censura seleção

Hoteleiro aposentado dirige campanha para derrubar "prefeitos"

Franz Erni diz que saldo da passagem do Brasil será aumento de impostos para os cidadãos, contra quase nada de ganho para a cidade


FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A WEGGIS

Nos subterrâneos de Weggis, desprezada por autoridades, mídia e maioria da população, há uma minoria barulhenta que contesta a presença brasileira na vila suíça. O problema não é com a seleção em si, mas com o comportamento dos políticos e empresários da região, para esses críticos na contramão do interesse público.
O senso (quase) comum aponta a temporada da seleção na estância aos pés dos Alpes como uma oportunidade única para a cidadezinha, e os empresários que viabilizaram a empreitada como benfeitores. Já na visão da oposição, a comuna (espécie de prefeitura) encantou-se com o dinheiro fácil e ignorou o bem-estar dos seus 4.000 moradores.
O mais briguento de todos, o calo no pé das autoridades, é Franz Erni. Hoteleiro aposentado, é um sujeito falante, que usa um lencinho no pescoço e mora com a mulher ao pé do monte Rigi, o maior da região.
Há dois meses, ele publicou um petardo no Wochen-Zeitung, o semanário local, pedindo a renúncia do colegiado que administra a comuna, formado por cinco "prefeitos".
Erni reclama que o saldo da festa será aumento de impostos para os cidadãos, já que a comuna entra com uma parte dos investimentos, contra quase nenhum retorno para a cidade. Pelos seus cálculos, 500 mil francos suíços (cerca de R$ 900 mil) saíram do erário municipal -o chefe dos prefeitos diz que é bem menos.
O mais grave é que, sob a atual administração, as finanças do município minguam. Desde 1999, a arrecadação só aumentou (23,1 milhões de francos em 2005), mas o superávit só diminuiu (165 mil francos em 2005, também o menor dos últimos sete anos).
O que as autoridades alegam ser o principal ganho, a herança de um novo campo para Weggis, é questionável. A agência de marketing Ataro/Kentaro e a empresa Thermoplan, fiadoras do projeto, fizeram um contrato com a comuna para explorar por dez anos a área onde está o campo, que é pública. Como já é sabido, esperam que a seleção seja a primeira de uma série de equipes a procurar a cidade para fazer pré-temporadas.
"Por mais de quatro anos a população pedia novas áreas de lazer e um campo novo, mas eles nunca ligaram. Agora que há um, virou praticamente propriedade privada", queixa-se.
Sua mulher, Heide, completa: "Este é um lugar de velhos. Quando passa o verão, não há nada para fazer, não há espaços de diversão para os jovens, porque a comuna não constrói".
Por sua postura crítica, o casal Erni é visto com rabo de olho por muitos moradores, que fogem do assunto.
"Ninguém tem coragem de me criticar diretamente, mas estou certo de que pelas costas muitos falam mal de mim", afirma ele. "O duro é saber que há outros que concordam comigo, mas têm medo. Vários comerciantes vêm até mim se queixar da comuna, mas não enfrentam ninguém, temendo perder suas licenças."
Há 12 anos na Suíça, a mexicana Laura Eirich, outra rara alma a criticar o establishment local, também ressalta a falta de coragem dos moradores, a quem chama de "hipócritas". "Vou a um café e lá vejo muitos criticando a forma como tudo isso [a chegada da seleção] foi armado. São os mesmos que, em cerimônias públicas, bajulam os poderosos."
A senhora Erni conta que, por isso, isolou-se na montanha e evita ir à vila. "Quero distância dessa comunidade."

O dono de Weggis
Os Erni pagam de certa forma o preço da rebeldia, mas nada se compara ao ocorrido com a família Oetiker, que comprou briga com o maior magnata local, Martin Denz, dono do Park Hotel, onde está a seleção, e até hoje sofre as conseqüências.
Denz tem planos de ampliar a área do resort, o que em tese dependia da aprovação dos vizinhos. Elizabeth e Alexander Oetiker não aprovaram, e a disputa foi parar nos tribunais. O casal perdeu, e no meio do processo afirma que enfrentou o desprezo de toda Weggis.
A ponto de Elizabeth ter tido depressão, da qual ainda não se recuperou de todo. Fanáticos pelo Brasil, onde moraram nos anos 80, vivem um sentimento ambíguo em relação à presença da seleção na cidade.
"Isso aqui virou um grande circo, mas não tem nada a ver com os brasileiros em si. Eles são somente utensílios para que as empresas ganhem dinheiro", critica Alexander.
Pedagogo que nos últimos meses ensinou história do Brasil às crianças de Weggis, ele lembra que, na final da Copa de 98, toda Weggis torceu pela França contra a seleção. E é ácido ao avaliar a onda de paixão da cidade pelo time pentacampeão. "Mesmo gente que não sabe que a bola é redonda virou admiradora dos brasileiros."


Texto Anterior: Online: Escute as opiniões de Parreira sobre a preparação do Brasil para a Copa
Próximo Texto: Entrevista: Cidade ganha com o campo, diz prefeito
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.