São Paulo, terça-feira, 02 de setembro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JOSÉ ROBERTO TORERO

A camisa de Camargo, o amargo


No Bar da Preta, ele dispara contra o terceiro uniforme dos times, da verde-kryponita até a preta, a roxa e a azul

O BAR DA PRETA é uma espécie de zoológico de homens. Ou melhor, zooilógico, porque os tipos que lá se juntam não têm lógica nenhuma.
Um dos mais curiosos é Camargo, o amargo. Ele toma café sem açúcar, seu tira-gosto favorito é um jilozinho à milanesa e só toma porres de bitter. Camargo vê defeito em tudo: "Gisele Bündchen? Magriça".
Nesta semana, lendo o jornal ao meu lado, ele olhou uma foto do jogo da Portuguesa e exclamou: "Era só o que faltava: a Portuguesa de preto!".
"É a nova terceira camisa deles", expliquei. "Até que é bonita."
"Mas é preta! O que tem de preto na bandeira da Lusa? Nada! Só se for por conta da situação, que o negócio lá tá preto mesmo."
"As terceiras camisas são mais questão de marketing", argumentei.
"E desde quando marketing é coisa que presta? Se tem que fazer marketing, é porque tem algum defeito.
Para mim, marketing é invenção de político e mulher feia."
"Você não gosta de nenhuma terceira camisa?", perguntei.
"Nenhuma!"
"E a do Corinthians?"
"Aquela roxa? Roxa por quê? Deve ser de raiva porque está na segunda divisão. Tem roxo no símbolo do clube? Não tem? Então não pode."
"E a do Palmeiras?"
"A verde-kryptonita? Essa pelo menos serve para evitar atropelamento, que de noite você vê de longe. É tão escandalosa que o cara que esquece a porta do armário aberta não consegue dormir."
"Os palmeirenses a aprovaram."
"Também elegeram o Mustafá um monte de vezes."
"E a do Santos?"
"Aquela azul? Não tem o menor sentido. O símbolo do Santos é azul?
Não, é preto-e-branco. O mar de Santos é azul? Não, é cinza. As contas do Santos estão no azul? Não, estão no vermelho. Então não tem que ter azul! Sem falar que, depois que os jogadores suam, ela fica preta, e aí o time parece o Corinthians."
"Também não exagera, Camargo."
"Não é exagero, essas terceiras camisas são coisa de quinta categoria.
O São Paulo é que foi esperto. Tem tanta vergonha daquela terceira camisa preta que nem usa nos jogos. É só para butique mesmo. Se bem que aquelas do Rogério Ceni compensam. Nunca vi goleiro mais espalhafatoso. Devia jogar no Havaí, onde o pessoal gosta de camisa florida."
"E aquela que o Cruzeiro usava, com cada lado num tom de azul."
"Ah, é, aquela que já vinha manchada. Para mim, isso foi coisa de alguma lavadeira preguiçosa que só lavou um lado."
"E a do Fluminense, a grená?" "Imitação da do Juventus. Deviam ser processados por plágio."
"Mas ter terceira camisa diferente é normal. Não vê o Barcelona?" "Aquela laranja que parecia cone de trânsito? Lixo..."
"As empresas de material esportivo ganham milhões com essas camisas. Você está sendo muito amargo, Camargo."
"Que nada! Camisa de futebol tem que ter história. Não pode ser coisa para ganhar uns trocados. É manto sagrado. Já imaginou Cristo vestindo um modelo listrado? Não, é aquela camisona branca e só. Camisa é coisa séria."
E, dizendo isso, ajeitou a camisa, cheia de manchas de café, e se foi.

torero@uol.com.br



Texto Anterior: Vôlei: Bola pra frente
Próximo Texto: Palmeiras já prepara emboscada ao líder
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.